Para ser amigo de Tom Capone, nem era preciso conhecê-lo. E quem conta isso é Frejat, que contabiliza três episódios envolvendo o produtor, antes mesmo de encontrá-lo pessoalmente.
O primeiro rolou num estúdio, onde o músico foi ensaiar com amigos. “Quando cheguei lá, tinha um equipamento maravilhoso, que era inclusive parecido com o meu. Aí, perguntei: pô, de quem é isso? Me falaram que era do Tom, e eu nunca tinha ouvido falar no nome dele.”
O segundo episódio aconteceu quando Frejat gravou com Cássia Eller, em seu primeiro e homônimo disco (lançado em 1990), uma música de sua autoria, “Barraco”. Tom, recém-chegado ao Rio, fazia parte da banda. “Cássia me chamou para fazer direção musical da faixa, e eu gravei com o pessoal da banda dela. Aí, eu falei: acho que a gente podia colocar uns metais nesse arranjo. O Wanderson Clayton, que era produtor do disco, falou que o Tom ia botar isso com a guitarra sintetizador. Eu falei: tá bom. E a gente tocou numa faixa sem ter se encontrado.”
Ouça a faixa:
Então, veio mais um episódio. “Eu estava na casa do Ricardo Garcia, que é um dos melhores técnicos de masterização do Brasil e grande amigo meu, e ouvi o álbum ‘Tonelada de Amor’ (1999), do Márcio Mello, que era da banda Rabo de Saia. Perguntei: nossa, que disco bom, quem produziu? E ele falou que havia sido o Tom.”
Ouça o disco:
Os dois só foram se conhecer mesmo quando o produtor assumiu a diretoria artística da Warner Music Brasil, gravadora do Barão Vermelho à época. “Quando o Paulo Junqueira saiu e indicou o Tom, minha postura foi de apoiá-lo em primeira circunstância. Pensei: Paulo é um grande amigo meu, e se está sendo indicado por ele, é meu amigo também”, conta Frejat, que teve a companhia do novo parceiro na produção do disco “Balada MTV” (1999), do Barão. “Ele participou ajudando principalmente na parte técnica do trabalho, mas já foi muito bacana, e a gente percebeu que tinha interesses semelhantes.”
“Amor Pra Recomeçar” (2001) só veio depois, quando o músico assinou contrato solo com a gravadora. Tom produziu uma parte do disco e Max de Castro, a outra. “Mas o Tom foi fundamental, mas fundamental mesmo, no meu processo de descoberta da minha cara como artista individual”, afirma Frejat. “Isso foi muito importante. Ali, a gente se afinou ainda mais, porque tinha muitos interesses em comum na parte técnica, de áudio, de estúdio. Foi uma loucura. A gente chegou a comprar microfones em par, aí cada um ficava com um. Então, se precisassse usar, pedia emprestado para o outro. Essa é uma relação de confiança enorme, saber que na hora que precisar, é só ligar para o seu amigo e pedir. É como dividir prancha com outro surfista.”
A faixa-título de “Amor Pra Recomeçar” é, para Frejat, a mais especial do álbum, e o motivo é simples: Tom toca nela. “Foi uma busca muito longa”, lembra. “A gente tinha uma demo que era muito boa, em que apenas eu e Mauricio Barros executávamos a música no violão e no piano. A gente fez muitas versões dessa música e não conseguia chegar em algo melhor do que aquele momento dos dois juntos, tocando quando tínhamos acabado de fazê-la. É a famosa síndrome da demo: você faz a demo e ela fica melhor do que tudo o que você vai fazendo depois. Aí, de repente, Tom falou assim: cara, está faltando um riff nessa música. Fiquei de pensar. Então, ele me ligou de madrugada e disse ‘bicho, fiz o riff’ e tocou para mim. Foi uma coisa muito marcante, pois a música começa com uma guitarra dele, com ele tocando.”
Ouça o disco:
As lembranças da gravação de “Amor Pra Recomeçar” não acabam aí: têm até pizza envolvida no meio. “Apresentei para ele um sabor que ele não conhecia e virou fã. Era a pizza provençal da Guanabara, que sempre foi uma pizzaria que entregava até tarde da madrugada e, para a gente, que vivia em estúdio, era a salvação”, lembra. “Ele ficou louco e toda hora, pedia pizza provençal.”
A parceria de Frejat e Tom foi tão intensa, que os dois voltaram a trabalhar juntos no segundo disco solo do músico, “Sobre Nós Dois e o Resto do Mundo” (2003), e também no homônimo álbum do Barão Vermelho (2004), que estava em andamento quando o produtor viajou para os Estados Unidos, onde viria a sofrer o acidente fatal.
“Eu, o Fernandão (Magalhães) e o Mauricio já tínhamos trabalhado com ele, e fomos fundamentais para convencer toda a banda de que Tom era o produtor certo para produzir o disco”, conta. “Só que a produção foi interrompida justamente para ele viajar para o Grammy, e ele não voltou. Tom teve uma relação muito próxima da gente na feitura do disco e, de repente, a gente ficou orfão dele, no momento em que ele saiu de cena de uma forma brutal. A gente basicamente mixou o disco em homenagem a ele. A gente pensou nele o tempo inteiro, tentava imaginar como ele estaria avaliando aquilo ali.”
E isso foi algo muito presente no processo de trabalho do álbum que marcou a volta do Barão Vermelho, depois de seis anos de hiato.
O baterista Guto Goffi escreveu um texto sobre a perda de Tom, que você pode ler aqui.