Di Melo | Todos os adjetivos do mundo

15/06/2015

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Leonardo Baldessarelli

Por: Leonardo Baldessarelli

Fotos: Ariel Fagundes

15/06/2015

Já eram 2h da madrugada de domingo, 14 de junho, quando Di Melo desceu de uma das escadarias da quadra da Bambas da Orgia, em Porto Alegre. O lendário cantor, reconhecido mundialmente pelo seu disco autointitulado de 1975, estava prestes a subir ao palco da festa Voodoo encontra Tereza, união das maiores noites de black music e som Brasil da capital gaúcha. Nos minutos anteriores, ele observava a multidão presente do alto e atendia cordialmente a todos que o procuravam. Di Melo via um pavilhão lotado de pessoas, levadas tanto pelo encontro de sonoridades diferentes propostos no evento quanto pela promessa de um show genial do artista. O que aconteceu em seguida foi um verdadeiro espetáculo, cumprindo com tudo o que se pode imaginar sobre uma apresentação do músico.

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Para quem não o conhece, o pernambucano Roberto de Melo, o “imorrível” Di Melo, ganhou proeminência com o disco Di Melo (1975), lançado pela gravadora EMI-Odeon. O trabalho teve a participação de nomes como Hermeto Pascoal, Heraldo do Monte e Cláudio Beltrame, e apesar de ter sido esquecido durante a década de 70, ressurgiu com o tempo, pela mão dos DJs que procuravam raridades nos sebos. O apelido “imorrível” surgiu depois que Di Melo, sabendo do interesse de músicos europeus pela obra, obrigou-se a negar um boato sobre sua suposta morte, em um acidente de moto. Hoje, o álbum é reconhecido como uma síntese da música brasileira setentista, com base no soul, mas flertando com samba, funk, tango e rock.

E foi justamente com a primeira faixa de Di Melo que o cantor abriu o show em Porto Alegre, “Kilariô”, algo como um hit tardio, que todo mundo reconheceu nos primeiros acordes e logo começou a dançar e cantar. O artista estava acompanhado de uma banda formada por músicos locais, os quais Di Melo não cansou de elogiar. “Parece que tocamos juntos há anos, mas mal ensaiamos”, comentou várias vezes, pedindo para a plateia gritar em homenagem ao trombonista, que estava de aniversário. O cantor interagiu com o público sem parar, pedindo palmas para seguranças e assistentes, além de afirmar que as pessoas do local “ultrapassavam a barreira da beleza”. As hipérboles e adjetivos, verbos e advérbios inventados na hora são outra marca do artista. “Porto Alegre, eu amo vocês alegremente”, falou logo no início do show, complementando: “Vocês engravidaram o meu coração.”

Foram pouco mais de uma hora e meia de música, passando por quase metade do clássico disco Di Melo, incluindo “A vida em seus métodos diz calma”, “Pernalonga” e “Minha Estrela”, além de várias novidades, ainda não lançadas oficialmente. Fugindo desse padrão, teve apenas “Barulho de Fafá”, samba-soul gravado por Di Melo no disco independente Multicheiro (o artista tem nove álbuns independentes, além do autointitulado de 75). Perto do fim de cada música, o cantor sempre gritava para a banda: “Escancara, escancara!” A ordem resultava em jams, que aumentavam a duração das faixas e alimentavam o clima festeiro.

Logo na terceira faixa, o músico engatou uma composição nova, a balada romântica “Engano ou Castigo”. Di Melo encerrou a canção em um dos momentos mais marcantes da apresentação, afirmando, sem medo: “Essa seria uma música que Tim Maia gravaria nos dias atuais”. Outra faixa nova que chamou muita atenção foi “Milagre”, composição sexy, com uma levada tensa e hipnótica, que fez Di Melo dançar e rebolar durante o refrão. Se você não estava lá, dá para ter uma noção do que são as duas músicas na sessão feita pela Soul Art Videos com o cantor, em que ele interpreta “Engano ou Castigo” e “Milagre” no voz e violão.

Seguindo o show, o cantor engatou “Dioturno”, outra faixa tensa, com um clima bem roqueiro. Durante a canção, Di Melo anunciou que ela fará parte de um disco novo, a ser lançado em outubro. Ele não chegou a comentar no show, mas “Dioturno” é uma parceria de composição com o Valdir Dafonseca. Outra inédita tocada em Porto Alegre foi “Kiprokô de Patrono”, anunciada pelo cantor como uma homenagem a Chico Buarque.

O resto do show foi pura diversão e celebração aos sons clássicos de Di Melo, que conquistou o público com seu carisma. Além de tudo já citado, o artista engatava poesias entre as faixas e brincava muito com a banda e as pessoas. Durante “Barulho de Fafá”, o rapper porto-alegrense Lucas Melo, conhecido como “Carro Chefe”, invadiu o palco, pediu o microfone para o cantor e engatou alguns versos para, depois, Di Melo brincar: “Está contratado”. Já no fim do show, o artista convidou nosso fotógrafo, Ariel Fagundes, para fazer seus registros em cima do palco, e você pode ver algumas das imagens produzidas navegando na galeria mais abaixo.

“A vida em seus métodos diz calma” e, mais uma vez, “Kilariô” enceraram a apresentação, com um Di Melo visivelmente eufórico deixando o palco e encontrando o público que pedia autógrafos ou fotos. É só olhar para o sorriso constante no rosto do artista para perceber que sua grande celebração é algo como um bálsamo para a longa carreira, e que Di Melo planeja fazer ainda mais coisas incríveis.

Se você ainda tem dúvidas sobre ver Di Melo ao vivo, seja onde for que possa vê-lo, recomendo que não desperdice a oportunidade. Em São Paulo, o músico se apresenta no Vale do Anhangabaú, às 4 da matina do dia 21 de junho, durante a Virada Cultural.

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15/06/2015

Redator de social media, jornalista, músico, emo, jogador de bocha, astrólogo e benzedeiro nas horas vagas. Um colono que se encontrou na cidade grande e agora pensa que sabe escrever sobre qualquer coisa.
Leonardo Baldessarelli

Leonardo Baldessarelli