Entrevista | Dom La Nena e suas lições sobre a fluidez da vida

10/05/2016

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Por: Rayla Carvalho

Fotos: Ariel Fagundes

10/05/2016

Dom La Nena foi descrita por Marcelo Camelo, produtor do seu segundo disco, como sendo dona de uma vertente cheia de contradições. Doce, delicada, fera e poderosa. A impressão que fica, depois de um show ou uma audição dos seus dois álbuns (Ela, de 2013, e Soyo, do ano passado), é a de que Dominique domina as palavras e seus instrumentos de maneira sublime. Orquestra todos eles com única motivação: encantar o ouvinte.

De voz feminina e aveludada, ela percorre caminhos mais perenes sem se enveredar em fantasias irreais. Trata de assuntos muito universais, aborda temas comuns a todos. Isso talvez se deva à sua criação meio nômade. É gaúcha, mas viveu grande parte da vida em Paris e Buenos Aires. E é bem possível que Dom tenha aprendido um idioma a mais nessas andanças geográficas. O idioma da emoção que pertence a todos. No fim das contas, ela se transforma em poliglota de sentimentos. E a gente, que não se dá com tantas línguas, consegue entender cada sílaba com naturalidade.

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A seguir, ela nos dá algumas lições sobre a fluidez da vida e sobre o quanto os problemas cotidianos, pessoais e do mundo, afetam (ou não) suas composições.

Ela e Soyo são seus dois álbuns de estúdio. O primeiro, Ela, parece fazer uma referência distante, em terceira pessoa, a você. Já o segundo, Soyo, soa como resposta. Como se você estivesse se reafirmando como a pessoa referida no primeiro. Essa distância e depois proximidade se refletem também nas composições dos álbuns?
Sim, definitivamente. Amadureci muito como compositora e cantora ao longo dos anos que separam os discos, então me pareceu muito adequado retomar esse papel de fala. Não acho que atingi o clímax do meu desenvolvimento, então continuo indo, evoluindo ao longo do processo.

Você compõe em português, inglês, francês e espanhol. Existe um processo de decisão consciente por trás da escolha dos idiomas?
Na verdade não muito. Cada idioma tem sua própria musicalidade, seu próprio ritmo, então a escolha é muito natural… Às vezes o espanhol combina melhor com um arranjo, noutras é o francês que parece mais adequado… É um processo que varia bastante, mas na maior parte das vezes as musicas já surgem espontaneamente em suas devidas línguas.

O mundo passa atualmente por um período de conflitos sociopolíticos. Situações que reverberam na Europa, nas Américas, na Ásia… E muitas delas ameaçam a liberdade de expressão de artistas, como foi o caso dos ataques ao Charlie Hebdo. Qual é o resultado desse tumulto em você? Sente que isso impactou ou pode impactar seus trabalhos futuros?
Ainda não tive muito tempo pra pensar a respeito… Perdi muitos amigos nos ataques de Novembro e ainda é muito complicado digerir tudo o que aconteceu. No meu trabalho, ainda não deu tempo porque não criei nada desde então. Mas é possível que isso acabe reverberando, sim, só não consigo prever como.

Por outro lado, a gente também vive um momento em que os debates sobre feminismo estão super ricos. E isso graças à Internet, que dá voz às mulheres e repassa o discurso às muitas outras que ainda não tinham contato com o feminismo. Como você se posiciona em relação a isso? Já sentiu algum tipo de preconceito de gênero?
Nossa, sim! Eu tenho um grupo de amigas e a gente costuma viajar juntas pela França fazendo alguns shows e, nessas ocasiões, a gente sente muito a falta de crença das pessoas num trabalho exclusivamente feminino. Eu sei que, se nós fôssemos todas homens, seríamos levadas bem mais a sério. Às vezes as pessoas não entendem ou não querem entender. No meio erudito existe muita competição, mas eu não senti que isso era estritamente por eu ser mulher… Porque a competição é sobre tudo. Idade, tempo de carreira e afins.

O remix de Batuque Brasileiro, presente no álbum só de remixes Ela por Eles, tem tocado muito em festas de música eletrônica aqui em Porto Alegre. E, a gente imagina, esse não era um público que você esperava atingir. Como você encara essa pluralidade da música?
Nossa! Sério? Não fazia ideia disso… Que ótimo. Tô muito surpresa, de verdade. Bom, eu não sei, o álbum de remixes surgiu lá na minha gravadora, que é americana. Eles costumam fazer e eu topei. Os artistas enviavam suas releituras e a gente acabou montando o álbum. É muito incrível lidar com isso, com esses desdobramentos inesperados da música. Fico muito comovida. E preciso ir pra uma balada ouvir isso!

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10/05/2016

Rayla Carvalho