O quinto Beatle, por Vivek Tiwary

30/06/2014

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Revista NOIZE

Por: Revista NOIZE

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30/06/2014

O quarteto de Liverpool não conquistou o mundo sozinho. Eles vieram com a música, e Brian Epstein veio com o conceito: The Beatles, uma banda que espalharia o amor pelo mundo.

A história do empresário que deu vida aos Beatles nunca tinha sido antes contada como o escrito Vivek J. Tiwary fez nos quadrinhos de “O Quinto Beatle: a história de Brian Epstein”. Premiado produtor de cinema, TV e espetáculos da Broadway, Vivek conta através das belas ilustrações de Andrew Robinson e Kyle Baker a trajetória ambiciosa de Epstein, da descoberta do quarteto no The Cavern Club à sua morte.

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Publicado em novembro do ano passado nos Estados Unidos, o quadrinho acaba de ganhar tradução para o português e está à venda nas livrarias por cerca de R$ 60. “O Quinto Beatle: a história de Brian Epstein” ainda vai ganhar uma versão para o cinema, com roteiro do próprio Vivek e com Bruce Cohen, premiado produtor de “Beleza Americana” (1999).

Nas páginas do livro, você vai encontrar não só o Brian Epstein empresário, mas também o homem que vivia à sombra do seu medo por ser judeu e gay em tempos de antissemitismo e perseguição ao homossexualismo. A mensagem de amor dos Beatles ao mundo todo jamais seria possível sem ele. A trajetória de Epstein é tão incrível que conversamos com Vivek Tiwary sobre essa grande história que ele dedicou mais de 20 anos de sua vida pesquisando.

the cavern brian epstein

O que Brian Epstein viu no The Cavern que os outros não viram?

É uma coisa muito difícil de dizer, ele não viu nada de diferente lá. Eu acho que o senhor Brian viu uma banda que tinha uma linda mensagem de amor para compartilhar com o mundo. Eu sei que isso parece um pouco meloso, mas eu acho que os The Beatles eram sobre o amor, e acho que ele viu no grupo uma banda que tinha essa mensagem para compartilhar e ele acreditava que seu papel era apresentá-los apropriadamente, porque era uma mensagem que o mundo todo poderia abraçar. Ele acreditava que ele seria o cara que faria isso, com aquela coisa toda dos ternos e dos cortes de cabelo. Ele viu na banda uma missão, ele viu um propósito na vida.

O que a tourada significava para Epstein?

Brian era um grande fã de touradas. Essa parte é baseada na história. Mas muito do que tem sobre as touradas no livro é criação minha como escritor. Mas, – a gente acabou de falar que os Beatles eram sobre amor – enquanto eu estava fazendo minha pesquisa, eu achava difícil entender como uma pessoa que era amorosa se interessava tanto assim pelas touradas. Para mim, que cresci em Nova Iorque, as touradas não são familiares, eu não as entendia como um esporte, não faz parte da nossa cultura. Elas parecem ser muito cruéis e brutais, e não tem nada a ver com amor. Então eu dediquei boa parte da minha pesquisa conversando com amigos de Brian para tentar entender a sua relação com as touradas, que eram tão importante pra ele. A cena na praia em que Brian fala com John Lennon, ele fala sobre isso.

touradas vivek entrevista

Para ele, a tourada, em primeiro lugar, é muito teatral e muito bonita com suas cores e fantasias. E ele era um cara bem teatral. Em adição a isso, ele via a tourada como uma coisa relacionada à esperança. A maioria dos toureiros tem uma origem humilde, e acho que nesse processo de se tornarem domadores eles trazem a ideia de esperança e de possibilidade. Acho que isso é muito similar ao que Brian viu nos Beatles. E também porque Brian era gay em um tempo em que no Reino Unido era proibido ser gay. Ele escolheu uma profissão para si que era muito perigosa, porque na medida em que os Beatles ficavam mais famosos como figuras públicas, ele ficava cada vez mais nos holofotes. E esse perigo que a profissão dele carregava ele via muito nas touradas também.

O que na vida de Brian Epstein te inspira tanto?

Acho que Brian Epstein foi de várias maneiras um grande lutador. Por ser gay em uma época que isso era contra a lei, por ser judeu em uma época de antissemitismo e por ser de Liverpool, porque antes dos Beatles eles pareciam não ter nenhuma influência na cultura do país. Você poderia dizer que ele seria o último homem a fazer sucesso. Um judeu gay correndo pelas ruas de Liverpool dizendo: “os Beatles serão maiores que Elvis!”, “eles vão elevar a música pop a uma forma de arte!”. Era muita loucura! Mas ele perseguiu esse sonho com paixão e persistência. Ele realmente era uma pessoa desajeitada, um deslocado! E isso é uma coisa que eu me relaciono muito, porque nasci em Nova Iorque, mas minha família tem origem vietnamita. E as pessoas de lá, se você não entrar em qualquer que seja a empresa que sua família tenha, você será engenheiro, tecnólogo, médico ou advogado. Mas eu queria fazer quadrinhos e ser produtor teatro! E isso me fez incomum. Eu não quero dizer que tive que passar pelos mesmos obstáculos que Brian teve, mas eu me relaciono muito com essa ideia de se sentir deslocado. Sabe, por ser uma criança indiana tentando fazer o seu caminho no entretenimento. Então é isso que me conecta com Brian. A mensagem dele, no final das contas, é que vale a pena perseguir o sonho impossível, não importando o quanto improvável ele possa ser. Eu acho isso muito inspirador.

Sua pesquisa sobre Epstein durou cerca de 20 anos. Não tinha nada sobre ele publicado? Você teve que falar diretamente com amigos e parentes dele?

Tem um outro livro que se chama “The Man Who Made The Beatles”. Você pode achar ele na Amazon [1989], mas quando eu comecei minha pesquisa não existia Wikipédia, não existia Google. Então eu não tinha outra escolha senão ligar para as pessoas o conheciam. O que eu fiz foi ler tudo o que eu encontrei sobre ele relacionado aos The Bealtes. Eu lia trezentas páginas sobre o The Beatles e umas cinco sobre Brian Epstein. Mas aos poucos eu fui vendo quais eram as pessoas que o conheciam melhor. E eu apenas peguei o telefone e liguei pra elas! Algumas delas ficaram receosas no início, mas no final todas elas se abriram para mim e nenhuma delas me virou as costas. Com o decorrer dos anos, algumas delas se tornaram minhas amigas e foram me contando cada vez mais sobre Brian Epstein. Por isso que essa pesquisa demorou tanto tempo. Acho que o coração da pesquisa está nas histórias pessoais, em como era ser gay lutando nos anos 60. Essas não eram as histórias que os amigos dele imediatamente queriam me contar, eu tive que ganhar a confiança deles antes e isso me tomou tempo.

marketing brian epstein

Tem uma cena no livro em que Epstein revela ter perdido dinheiro dos Beatles. Como isso aconteceu?

Ele, na verdade, não perdeu dinheiro. Ele só não fez tanto dinheiro quanto poderia. Isso é muito importante: ele não perdeu dinheiro dos Beatles. Não é algo como se eles tivessem dinheiro e ele tenha feito uma coisa horrível e perdeu o dinheiro. O que acontece é que ele fez um acordo de merchandising e ele poderia ter feito um acordo melhor. No entanto, colocando em outra perspectiva, ninguém tinha feito isso antes de Brian Epstein, ele foi o primeiro a fazer isso. Nenhuma banda fez bonecos e merchandising e esse tipo de coisa antes de Brian. Nem mesmo Elvis Presley fez. Hoje tem muito merchandising de Elvis, mas nos anos 60 Brian e os Beatles foram os primeiros. Ninguém pensou que ele poderia ganhar dinheiro com isso. Então quando ele fez acordos com essas companhias de 10%, 20%, ele pensou que estava fazendo um bom acordo. Em retrospectiva, visto que tinha rendido tanto dinheiro, ele percebeu que talvez tivesse o poder de falar: “você pode ficar com 20%, eu quero 80%!”. Mas quando ele fez o acordo, ele fez o melhor que pôde.

O vício de Epstein por remédios ficou pior com o passar dos anos?

Definitivamente. Como você pode ver no livro, começou como uma coisa pequena com ele tomando remédio para dormir, para acordar e contra o estresse, e aos poucos os médicos começaram a prescrever remédios para curar a homossexualidade dele. No final da sua vida, isso tinha se tornado um hábito. Tinha remédio para tudo: para dormir, para acordar, para controlar sua homossexualidade, para passar por momentos difíceis. Foi uma coisa que começou simples, como nós que tomamos um remédio para dor de cabeça, e no final ele tomava remédio para tudo. Foi um vício. E o que foi mais trágico era que essas coisas foram prescritas por médicos e pessoas que supostamente existem para deixar nossas vidas melhores, mas ao contrário disso eles o encheram de remédios e acabaram com sua vida. Foi uma coisa gradual que foi ficando cada vez pior e por fim tirou sua vida.

remedio brian epstein

Você acredita que foi a ambição de Brian Epstein que o matou?

Eu não acho que seja tão simples dizer o que foi que o matou. Se foi sua ambição, se foi por ele ser viciado em remédios… Acho que foi um pouco de tudo. Para ele, ele nunca era bom o suficiente, ele sempre estava buscando ser maior, melhor e mais bem-sucedido. A ambição dele o moldou, de certa forma. Mas acho que a ambição também o levou ao estresse e o fez mais e mais temeroso com a sua vida como homossexual escondendo-se de seu jeito. De muitos jeitos, sua ambição foi o centro de muitas coisas que causaram sua decadência.

Brian Epstein parecia saber que não havia nada de errado em gostar fisicamente de outro homem. Estou certa?

Acho que você está quase completamente certa, mas não é uma coisa que se diga se está correta ou incorreta. Esse era o coração da luta dele como homossexual. Porque fora de seu tribunal, ele sabia que não tinha nada de errado com seus sentimentos. O amor na forma que fosse era algo a ser buscado. Mas de outro lado, ele constantemente temia que sua homossexualidade fosse divulgada para o mundo, o que faria com que ele fosse jogado na cadeia e isso refletiria muito mal em seus clientes, nos Beatles. Então, se por um lado ele não achava que era errado, pelo outro ele estava constantemente escondendo. Acho que uma boa parte dele tinha vergonha disso, ou pelo menos estava preocupada. Mas ele acreditava no poder do amor.

brian epstein homo

Epstein sentia-se atraído por John Lennon?

Não há dúvidas que Brian Epstein sentia-se atraído por todos os Beatles, mas especialmente por John Lennon, porque sua homossexualidade fazia com que ele se atraísse fisicamente por ele. E também fazia parte da visão que ele tinha pra banda: se fossem apresentados apropriadamente, meninas, meninos, pais e avós iriam gostar dos Beatles. Acho que ele se sentia atraído mais por John Lennon do que pelo resto da banda, e você pode perceber isso naquela mesma cena deles na praia na Espanha. No entanto, eu não acho que a atração dele era do tipo para querer ficar junto fisicamente com eles, não acho que ele estava tentando ir para cama com John Lennon e que a missão dele era estar sexualmente com John Lennon. Há muitos jeitos melhores de se fazer isso sem ser um empresário. Brian era mais velho, tinha dinheiro, era bonito. Poderia ter encontrado uma maneira melhor de seduzir John Lennon. E ele era um ser humano. Do mesmo jeito que eu, heterossexual, se nós dois estivéssemos conversando pessoalmente e eu olhasse pra você como uma mulher eu poderia pensar “ela é muito atraente”. Mas isso não significa que eu quero flertar com você e levar você para cama. Eu estou muito feliz com a minha esposa! Mas eu sou um ser humano e quando eu vejo uma mulher bonita eu penso “lá está uma mulher bonita”! Do mesmo jeito que ele como um gay veria um homem atraente e falaria “lá está um homem atraente”. Mas isso não significa que ele queira ir para cama com ele. Acho que a atração dele por John Lennon o levou a empresaria melhor a banda com o tempo.

Brian Epstein poderia ter mantido os Beatles juntos?

Os Beatles tinham personalidades muito fortes, John e Paul, particularmente esses dois queriam ser o líder da banda. Mas uma banda não pode ter dois líderes, e George Harrison estava se tornando um grande compositor e estava mais confortável em ser a “terceira roda”. Então eu não sei se Brian Epstein poderia ter mantido os Beatles juntos. Mas há uma coisa que você não pode negar: se olhar no histórico, logo após de Brian Epstein ter morrido foi quando os Beatles tiveram seus maiores fracassos. A turnê “Magical Mistery” foi um desastre, eles falavam que se odiavam, as sessões de gravações começaram a ficar bem tumultuadas. Depois de Brian Epstein ter morrido os Beatles começaram a brigar. Eu acho que Brian teria criado um ambiente em que isso não teria acontecido. Ele teria feito eles terminarem de um jeito melhor. Brian teria criado uma situação em que os Beatles teriam ido um para cada lado graciosamente. Ele sempre disse que os Beatles eram uma família, e você não pode se separar de sua família.

conversa com paul mccartney

E você acha que Paul McCartney foi quem tentou manter a banda unida depois da morte de Brian Epstein?

Eu acho que sim, mais do que qualquer membro da banda, McCartney foi quem deu o seu melhor. Ele realmente tentou manter a banda unida. Por isso que no livro tem uma cena em que Brian Epstein está na cama e ele diz para McCartney: “você tem que tentar! Você precisa ser aquele que…”, sabe? E Paul fala: “eu não sei se eu consigo fazer isso!”. E no final, ele não conseguiu. E eu nem sei se Paul queria isso [manter a banda unida]. Ele queria ficar sozinho, ele não queria os Beatles mais, ele queria ser Paul McCartney.

“O Quinto Beatle” vai virar filme e você que está escrevendo o roteiro também. Como está indo?

Está indo muito bem! Estou muito orgulhoso disso. Será como uma extensão do livro, tem muita coisa no filme que não está no livro. Nós tivemos acesso à música dos Beatles, o que é muito, muito emocionante. É a primeira cinebiografia na história a ter acesso à música deles, então eu estou muito orgulhoso disso. Isso levou três anos e meio, mas os Beatles acabaram concordando. O que significa que Paul McCartney, Ringo Starr, Yoko Ono e Olivia Harrison concordaram em usarmos a música dos Beatles. Paul McCartney, particularmente, tem sido um grande fã do projeto. Ele nos escreveu uma carta muito amorosa dizendo o quanto tinha gostado do livro e como ele tinha amado nosso trabalho. Nós agora estamos escolhendo quem será Brian Epstein. Já temos algumas opções de atores maravilhosos e eu espero que em algum meses possamos dividir com vocês o escolhido.

Tem algo que você acha importante sobre a vida de Brian Epstein que por algum motivo não entrou no livro?

Sim. Se eu tivesse que falar sobre mais uma coisa seria sobre sua relação com seus pais. Com seu pai, particularmente. Eu não diria que não está no livro, definitivamente os pais dele estão no livro, mas não é uma coisa que aparece muito. E para mim era muito importante manter o livro curto, eu não queria que tivesse mais de 120 páginas. Porque eu queria que ele fosse possível de ler em uma sentada. Eu queria que a pessoa pegasse antes de entrar no voo e conseguisse acabar antes de pousar. E eu queria que fosse uma leitura divertida. Para fazer isso, eu tive que deixar algumas coisas de lado e uma delas e a relação dele [Epstein] com seus pais. Ele amava muito os pais. Ele era muito apegado à mãe, principalmente. Ele não era tão próximo ao pai, que o respeitava e amava muito, mas não entendia a homossexualidade do filho. Brian queria deixar a família orgulhosa dele, mas ele tinha medo que com sua homossexualidade e a carreira incomum que escolheu nos anos 60 ele os desapontaria de alguma forma. Ele tinha uma relação bem complicada com os pais. Nós vamos ver isso com mais detalhes no filme.

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30/06/2014

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