Entrevista | Soundlights mergulha nas paisagens sonoras do sítio

01/11/2017

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Carolina Santos

Por: Carolina Santos

Fotos: Divulgação

01/11/2017

Durante o ano de 2012, enquanto assistíamos aos jogos olímpicos ou à reeleição do presidente Barack Obama, o músico e compositor Arthur Valandro estava isolado em uma ilha de 48 habitantes no sul do Alasca. Dessa imersão quase forçada à solidão, nasceu a Soundlights. Foram oito meses acompanhado de uma interface de gravação e de sua conexão com o ambiente. As diversas composições e arranjos criados no período vieram ao mundo apenas em 2015, através do Youtube e Facebook. Mas, muita coisa mudou desde então, inclusive as suas influências musicais de Arthur.

O projeto que possui referências que vão desde Sigur Rós, Unknown Mortal Orchestra até os brazucas Boogarins e Supervão, chega a uma nova fase, com o apoio dos integrantes André Garbini, Bernard Simon, Gabriel Burin e o Juliano Lacerda. Ainda explorando a sinestesia, lançaram o EP Sons Que Vêm Do Sítio, resultado de todo o tempo que Arthur passou viajando e frequentando um sítio do amigo Thiago Engers, localizado entre Canela e Três Coroas/RS, onde supriu e ofereceu o máximo que pode para a natureza, que de acordo com ele, mostrou grande parte das peças que faltavam para compreender algumas inquietudes pessoais.

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Aperte o play para entrar nessa conexão sonora enquanto acompanha e entrevista que fizemos com Arthur, idealizador e compositor da Soundlights:

Conta melhor pra nós, como nasceu o projeto em meio ao isolamento?
O projeto se formou de um modo bem intimista quando eu passei 8 meses numa ilha no sul do Alasca em 2012. Era um local absolutamente isolado de tudo… Não existia comércio ou qualquer forma de entretenimento convencional. 48 pessoas formavam o vilarejo de pescadores e eram movidas pela caça e pesca que colocava comida na mesa de todas as famílias. Me adaptei ao modo como tudo funcionava e, de modo geral, me encontrava muito sozinho e conectado com questões internas e dúvidas/angústias como nunca antes. O lugar era o mais lindo possível… Boa parte da natureza totalmente intocada e uma família de ursos morando atrás da minha casa. Esse contato com a pureza e naturalidade das existências sempre despertou uma vontade muito grande de buscar fazer parte de tudo em mim. No geral, então, precisei colocar isso pra fora e me via muito a vontade de mandar uma mensagem para as pessoas, tipo: “olhem tudo isso aqui, sintam e façam parte de todos os processos que rolam nesse ecossistema”. A música sempre foi o meio pelo qual eu conseguia transmitir a minha consciência e sentimentos. Nesse período no Alasca precisei materializar de outra forma. Um dia, comprei pela internet uma interface de gravação, uma Jazzmaster que me acompanha até hoje em tudo que é lado, e um condensador. Vi tudo chegar num aviãozinho pousando no lago ao lado de casa e corri pro quarto para iniciar o processo de compor todos os sons que ouvia dentro da cabeça.

E o nome, Soundlights, surgiu como?
Comecei todo aquele processo em meio a um ambiente onírico do nascer ao pôr do sol e, no meio de uma noite de vigília, captei pela primeira vez a Aurora Boreal em cima do telhado da minha casa. Saí pra varandinha de trás e fiquei horas olhando aqueles lençóis verdes, brancos e roxos dançando. No plano de fundo tinha um som bem específico emitido pelo fenômeno. Nesse momento eu sabia que o projeto precisava fazer referência ao que eu tava vendo. O som das luzes. O som ilumina. Soundlights. Quis dizer ambas as mensagens simultaneamente.

Você identifica o amadurecimento do projeto em quais aspectos?
Fiz diversas composições nesse período e, em 2015, criei a coragem de colocar pra galera ouvir “Escuramente”, um som antigo que lancei direto no Youtube e criei a página do projeto no Facebook. Um ano depois, sai “Dimensões”, que ainda remete quase que totalmente ao período que tive no Alasca. Nessa transição de anos, toda a minha concepção do que é a música e tudo o que me influenciava até então mudou de um modo bem peculiar. Frequentando com alguns amigos um sítio no interior entre Canela e Três Coroas, nasceu “E o Sopro (Watch out)”, que varre o frio do Alasca pra um ambiente mais rico, diverso, igualmente profundo e ancestral. Meu respeito pelos processos que observava na natureza emergiam cada vez mais. Nesse período uma galera já começou a entrar em contato comigo e comentar sobre as minhas ideias, me dar alguns toques e percepções que foram muito importantes. A galera da Lezma Records me ajudou muito no processo de entender como a música chega nas pessoas e o que é a união que gera toda essa magia, coisa que eu já buscava muito com o meu contato com a natureza.

Visto que até o desenvolvimento do EP, o projeto era algo mais solitário, quais as funções dos novos integrantes?
O projeto do EP ficou mais comigo, todas as composições foram feitas por mim, com exceção das percussões e baterias, que foram feitas pelo André (“Escuramente” pelo Nychollas Cardozo). Atualmente, todos os guris me ajudam muito no processo, principalmente com o live. São eles o André Garbini (da Nacional Riviera) que é responsável pela bateria e percussões, o Bernard Simon (da Nacional Riviera) que toca guitarra, o Gabriel Burin que fica nos sintetizadores e o Juliano Lacerda (do “De repente”, vivo) também nos sintetizadores. Todos cantam ao vivo!

Foto: Reprodução

A primeira faixa do EP, “Onde que Fica (Rio Azul)” contou mais com a ajuda dos guris que tocam comigo pra outros instrumentos, como guitarras e sintetizadores, que tiverem o auxílio do Bernard, do Gabriel e do André. A última faixa do EP, “Cintilar”, teve a primeira metade composta pelo Gabriel Fetzner (Urso Polar). De resto, os outros instrumentos e as vozes foram todas gravadas por mim. A masterização foi feita pelo Guilherme Ceron.

Como foi esse processo de “captar” os sons do sítio?
Na verdade, nenhuma música foi gravada lá, apenas alguns sons da natureza, como cães, abelhas, vento, chuva, pedras (tem um buraco de 200m feito pra procurar água que produz uns sons com um delay natural sensacional) e alguns violões. De resto, gravei em casa com a minha interfacezinha. Desde 2015 tenho ido bastante pro sítio, certamente todo trimestre passo ao menos uma semana. Dos guris da banda, só o Gabriel chegou a conhecer por enquanto, mas várias outras pessoas que tiveram um papel muito importante como inspirações pras minhas composições tiveram por lá comigo.

Quais as principais referências musicais?
Difícil pensar de modo mais definido. Cito como maior referência mesmo tudo que eu observei nesses períodos na natureza. Vejo muito como arte (risos). Estudei bastante sobre outras culturas, sobre manifestações culturais ancestrais… Muitas referências variadas. De música, desde 2012 muita coisa me passou… Sigur Rós, Youth Lagoon, Unknown Mortal Orchestra, The Antlers, Fleet Foxes, Perfume Genius, WU LYF… Até certamente os brazucas como Boogarins e os amigos mais próximas da Supervão. Muita influência mais atual do Panda Bear e, acima de tudo, Animal Collective explodiu toda a minha percepção sobre a música diversas vezes. Escutem o Feels ou Sung Tongs que entenderão (risos).

De onde surgiu a ideia do EP visual e como foi a produção?
O EP visual surgiu com um convite meu a um cara que conheço desde pequeno e sempre foi uma pessoa muito querida e admirável. Guilherme Becker é ele! Trabalha com vídeos absurdos de surf e skate e manda muito bem em toda a produção do lance. Chamei ele pra esse primeira trabalho totalmente experimental e, ao meu ver, o resultado foi perfeito. Chamei ele pra chegar no sítio com uma camerazinha em um fim de semana desse inverno e tivemos a experiência full de estar lá no sítio. Tudo feito em 2 dias e editado em 2 semanas.

Quais os projetos futuros?
Gostaríamos muito de tocar em todos os lugares possíveis! Queremos fazer uma tour pelo estado pro fim do ano também, se possível. Tenho uma listinha de sonhos, mas já agradeço muito pelo reconhecimento da galera toda que vem me dizer coisas lindas. Mais música também, com certeza. Inspiração vai estar sempre aí porque a vida, o mundo, a natureza e todos esses processos que ocorrem são eternos. Gosto que venham falar comigo! Aceito todos os convites pra conversar e tocar e experienciar.

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01/11/2017

Social Media e frequentadora assídua do Twitter (@caroldeverdade).
Carolina Santos

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