Por que o Lollapalooza ainda é importante?

31/03/2015

The specified slider id does not exist.

Powered by WP Bannerize

Nicolas Henriques

Por: Nicolas Henriques

Fotos: I Hate Flash

31/03/2015

Ia começar a escrever esta resenha ontem, mas confesso que, após o bom texto do Barcinski, fiquei um pouco travado sobre o que ia falar. Estava pensando em falar dos shows que vi e me focar única e exclusivamente na apresentação dos artistas, não atentando para o festival em si. Acho que seria um erro.

Em seu texto, o crítico musical mostra como o Lollapalooza foi chato até do sofá, de como as bandas que se apresentaram não eram boas, inclusive como algumas eram horrorosas, com exceção do Jack White, Smashing Pumpkins e Robert Plant. Além disso, solta algumas máximas comportamentais, como “quem gosta de show não vai a festival grande”. Olha, calma lá, será que é isso mesmo? Achei-o um tanto quanto polemista em seu texto, quase uma caricatura de si próprio, querendo atacar demais apenas para mostrar que as bandas ali não o agradavam. Um pouco desnecessário. Por isso resolvi, na minha resenha, abdicar um pouco das apresentações e falar sobre por que um festival como o Lollapalooza é importante.

*

Foto: I Hate Flash/Fernando Schlaepfe

St. Vincent

Em primeiro lugar, por melhor e mais verdadeira que possa parecer a máxima sobre shows e festivais grandes, é sacanagem assumir que as pessoas ali no Lollapalooza não gostam de shows. Se não fosse o festival, qual seria a chance de várias pessoas terem contato ao vivo com a St. Vincent, Jack White, Childish Gambino, Major Lazer e outros artistas que se apresentaram ali? Artistas que muitas pessoas sequer conheciam e passaram a conhecer naquele momento. Lembro de um Tim Festival que fui para ver Gogol Bordello e acabei conhecendo a música do Dan Deacon e achando tudo aquilo uma grande farra interessante. Se não fosse aquele festival, não sei se teria acesso às músicas do DJ americano, que não sou fã, mas admiro. E acredito que esse primeiro ponto, de que um festival traz artistas que outrora seriam difíceis de serem vistos aqui no Brasil, leva a algumas questões subsequentes, sobre as transformações e momentos da música e também sobre a natureza e reconhecimento de artistas locais.

Para o meu gosto pessoal, o line-up deste ano do Lolla foi bem abaixo de anos anteriores, mas, nem por isso, desconsidero as bandas que estão ali tocando, assumindo que elas não fazem nenhuma música de qualidade. Acho meio purista considerar boa música e bons shows do festival apenas aqueles que flertam ou dialogam com o rock mais tradicional, como Smashing Pumpkins, Jack White, St. Vincent e Robert Plant (estes dois últimos, concordo, não são tão tradicionais assim. Mas o simbolismo de Robert Plant e todo apadrinhamento pelo David Byrne, estética e harmonia da St. Vincent são releituras de algo mais puro e relacionado ao rock).

Childish Gambino

Childish Gambino

De certa forma, em outras palavras, acho uma visão um pouco conservadora a de que todas as músicas precisam ser sujas e os pais não gostarem para serem músicas. Talvez o rock tenha isso, talvez até a verdadeira arte seja aquela que impulsione as pessoas levando-as a questionarem o status quo atual e adiantando novos movimentos. Mas tenho minhas dúvidas também se hoje é o rock quem faz isso, pois os pais de muitos que ali frequentaram o Lolla já nasceram ouvindo-o e isso não seria nenhum escândalo para eles. Não é esse o ponto que quero fazer e estou entrando numa digressão, mas, sei lá, nem todas as músicas e artistas precisam ser eternos e fazer algo que fique para a posteridade.

Banda do Mar é um bom exemplo. A própria natureza do projeto mostra toda a intenção de ser algo mais efêmero, gostoso como um verão bem vivido. Não tem a intenção de ser uma banda que fique eternizada no panteão dos maiores artistas nacionais, mas, só por isso, não quer dizer que seja ruim e sem validade de existir. Ouvir a Banda do Mar é legal quando se está com alguém, quer ouvir uma letra bonitinha e não quer ficar pirando e refletindo sobre todas as harmonias. Quando Barcinski falou sobre a Banda do Mar fiquei pensando sobre o line-up do último Lollapalooza que ele foi, o de 1996, para ver o Ramones.

Banda do Mar

Banda do Mar

O Wikipedia me mostrou um line-up com várias bandas que não se eternizaram, que estavam bombando ali no momento, inclusive um Psychotica como headliner. Psychotica é uma banda de rock industrial, gênero talvez análogo ao som que o Skrillex faça hoje. Além desse headliner, tivemos também Violent Femmes, Cornershop e 311 como bandas que marcaram presença no festival de 96. Nenhuma delas entrou para a posteridade ou tinha um som que levava a novos patamares. Elas simplesmente existiram ali, naquele zeitgeist, por assim dizer. Passaram, assim como muitas das bandas que vieram tocar aqui deverão passar. Música é momento. E os momentos se transformam, por isso acredito que há um caminho para entender as transformações musicais que estão ocorrendo e ouvir com a cabeça mais aberta certas músicas e artistas. Ou pelo menos dar mais chance, que não foi o que pareceu. E essa falta de chance me faz levantar um outro questionamento: os críticos estão realmente abertos a cena local ou é fácil jogar a culpa nos grandes festivais como os responsáveis por fecharem clubes pequenos e não fomentar novos artistas? Novos artistas bons são apenas aqueles do gênero que o crítico gosta?

Vejo hoje a música nacional bem fervilhante, com alguns locais aqui em São Paulo fazendo um trabalho interessante para divulgar novos talentos. Desde o Sesc, com seu projeto Pratas da Casa ou shows normais, mas também o Puxadinho da Praça, na Vila Madalena, Casa do Mancha, e tantos outros espaços que estão aí, lançando uma galera nova. O próprio Lollapalooza colocou alguns artistas nacionais novos para tocar, como o Boogarins, Baleia, Banda do Mar e O Terno. Acho, de fato, terrível o horário que estes artistas tocam. Seria muito bom ver alguns abrindo shows para os headliners (tudo bem que era o Robert Plant, mas O Terno é uma banda que poderia muito bem ter tocado antes de Jack White). Mas os festivais podem ser tanto responsabilizados quanto muitos críticos que consideram bons apenas aquilo que seus ouvidos já estão acostumados. Desculpe se isso soa agressivo, mas acho que não é para demonizar o Lollapalooza. A questão de ser chato ou não é puramente gosto pessoal, e esse julgamento de valor é algo que não sei o quanto deve caber a um crítico ou ao leitor da crítica. Um crítico musical para mim deveria ser mais esponja que os demais, apontando as qualidades de cada artista, o que eles podem melhorar e, em cima disso, ajudar a formar a opinião das pessoas sem impor nada. Mas talvez eu esteja com um discurso excessivamente hipponga, vai saber. Estou apenas começando e posso me contradizer ou enganar-me com o tempo.

Acho que o Lollapalooza deve continuar existindo como está e, embora o line-up tenha sido aquém ao de outros, alguns horários de apresentações não fazerem sentido nenhum (como o Interpol tocar no meio da tarde), ele é necessário para conectar as pessoas a shows que talvez não veriam de outra maneira. Um show particular ainda é melhor, sem dúvida, mas às vezes temos que saber jogar com as cartas que temos. Há vinte anos, ouvir o Pixies, Phish ou bandas alternativas ao vivo era possível só com viagens. Hoje, ter o Jack White no Brasil é algo para ser comemorado, não?

Tags:, , , , , , , , , ,

31/03/2015

Sou pesquisador e escrevo resenhas de shows pagando de crítico musical porque gosto muito de música e minha verdadeira intenção era ser multi-instrumentista ou vocalista de alguma banda. O problema é que falta habilidade para tocar até campainhas mais complexas e meu alcance vocálico lembra uma taquara rachada.
Nicolas Henriques

Nicolas Henriques