Balaclava Fest Porto Alegre: o indie ainda vive

10/11/2016

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Leonardo Baldessarelli

Por: Leonardo Baldessarelli

Fotos: Ariel Fagundes

10/11/2016

Logo no anúncio da sua edição de 2016 em São Paulo, o Balaclava Fest parecia um evento que não ganharia versões em outras cidades ou mesmo sideshows – era aquele clima de show indie/alternativo que fica só na capital paulista ou, no máximo, vai também para o Rio de Janeiro. E exemplos disso não faltam nos últimos tempos: Ibeyi, Julia Holter, Wilco, Unknown Mortal Orchestra; artistas até maiores do que os anunciados para o festival – no caso, os americanos do Mild High Club, os britânicos do Yuck e os brasileiros do Ventre e do Bilhão, todos com seus discos distribuídos nacionalmente pela Balaclava Records. No entanto, algumas pessoas de Porto Alegre (com o apoio do selo) conseguiram trazer o festival para a cidade e manter a tradição do Balaclava Fest na capital gaúcha. Mais especificamente, Carlos Viegas e Afonso de Lima, que formam a Mais Shows, e o produtor Thiago Piccoli, do Tomate Maravilha.

A edição de Porto Alegre só foi possível por causa de um evento de Facebook criado pelo Mais Shows – evento que, mais tarde, se tornou o oficial do festival. O próprio conceito do Mais Shows está em organizar pesquisas para avaliar se certas apresentações alternativas e independentes seriam possíveis pelo Rio Grande do Sul, e as confirmações num evento chamado Yuck em Porto Alegre surgiram como o melhor meio de analisar essa exata proposta – afinal, a ideia central era trazer o quarteto britânico de indie/power pop/shoegaze. Os mais de 100 confirmados em 24 horas de divulgação deram certeza aos organizadores, e poucos dias depois o desejo havia virado realidade: Yuck tocaria na cidade, junto com os canadenses do TOPS e os paulistas do Ombu, formando a edição gaúcha do festival. Menos de um mês depois de tudo isso, no Bar Opinião, por volta das 20h45 do dia 9 de novembro, o Balaclava Fest começava.

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A casa estava meio vazia quando os quatro integrantes do Ombu subiram ao palco para o show de abertura. Tocando praticamente todas as faixas dos dois EPs que já lançaram (Mulher, de 2015, e Pedro, de 2016) em cerca de 40 minutos, os caras mostraram seu som melancólico e de levada lenta para pessoas ainda distantes do palco, mas que foram se aproximando aos poucos para ouvir o rock triste saindo da voz do baixista e frontman João Viegas e de todos os instrumentos. Além dos timbres sujos, o que mais une o som do Ombu ao do Yuck são os conceitos; as incertezas da juventude, as bads, o existencialismo. Essa comparação é um tanto injusta, sejamos sinceros, mas é praticamente inevitável dentro do contexto do show. Enquanto os brasileiros trabalham com o silêncio e as longas atmosferas, os gringos apostam mais no barulho, no volume lá em cima e num clima quase power pop, principalmente nos seus shows (e como vimos mais tarde, no próprio Opinião).

No fim das contas, o Ombu foi um grande aperitivo. Antes da faixa “Sem Mais”, uma das últimas da apresentação, a banda pediu para que o público se aproximasse mais do palco e todo mundo obedeceu. A ideia para o clima ficar mais caloroso deu certo e o show acabou com a plateia, já em maior número, interagindo com os integrantes. Se o clima do Ombu era soturno e atmosférico, o que viria na sequência era praticamente uma balada indie – e pense isso no melhor sentido possível.

Com um som leve e inspirado pelo pop rock e pela psicodelia dos anos 70 e 80 (pense The Cars e Pretenders, só pra começar, e depois cole em revivalistas como Connan Mockasin e Mac DeMarco), o TOPS conquistou todo mundo com arranjos redondos e a presença de palco da vocalista Jane Penny e do guitarrista David Carriere. Além da voz, aliás, Jane flutuou entre os teclados e uma segunda guitarra para apoiar os médios e agudos, adicionando muito à atmosfera ao vivo. Os timbres limpos e o groove soul da cozinha destoavam bastante do clima vindo do Ombu, abrindo as portas para um estágio mais chapado e contemplativo, que incitava à dança em todo momento.

Dando um peso maior às faixas do seu segundo álbum, Picture You Staring (2014), o show teve alguns momentos incríveis. “Anything”, lançada como single no ano passado, funcionou bem com os sintetizadores em playback e um arranjo quieto da banda, muito semelhante à versão de estúdio – grande trunfo da faixa, os vocais de Jane Penny vieram à frente e empurraram a atmosfera pelos refrões e versos. Mais agitada e roqueira, mas sem deixar os teclados de lado, “Diamond Look” foi outro ponto explosivo, que provavelmente conquistou quem ainda não conhecia a banda.

Só pelas referências citadas você já deve ter imaginado que se tem alguma coisa que o TOPS manda bem é nos refrões, e o show foi praticamente uma chuva de melodias incríveis e músicas chegando aos seus ápices. A penúltima faixa do set, “Change of Heart” foi um dos melhores momentos, levada pelo clima oitentista e quase dream pop que conquistou completamente o público, sendo encerrada por um agradecimento/homenagem do guitarrista para a plateia: “you are ‘top’!”.

Depois de ganhar um elogio tão importante, toda a galera viu o show (inevitavelmente curto) do TOPS terminar e se preparou para o que viria em seguida: o Yuck. E a apresentação foi tudo o que você pode imaginar. Logo nos primeiros acordes, já deu para sentir o volume aumentando em relação às bandas anteriores, com a guitarra solo simplesmente explodindo acima de toda a base. O vocalista e guitarrista Max Bloom chegou voando com o clima sujo e pop de “Cannonball” – se, por acaso, alguém no recinto não conhecia o Yuck, já estava tendo uma aula na primeira faixa. Timbres distorcidos e a guitarra de Max soltando riff em cima de riff. Na sequência, o quarteto engatou “Hearts in Motion”, outra do seu mais novo álbum, e depois partiu para a clássica “Holling Out”, mostrando que o disco de estreia também teria vez na apresentação.

A baixista e também vocalista Mariko Doi deu às caras nos vocais pela primeira vez na lenta “Lose My Breath”, praticamente uma abertura para o momento épico que chegaria depois: “Get Away”, o maior sucesso do primeiro álbum e da banda. O riff ultra pegajoso e os vocais largados de Max ditaram o ritmo da faixa, que fez todo mundo que estava na frente do palco pular sem parar. Depois disso, a plateia já estava conquistada e cada som era uma alegria a mais. O quase My Bloody Valentine de “Rebirth” encaixou perfeitamente em “The Wall”, outra clássica do primeiro disco e com uma pegada mais lo-fi vinda desde das guitarras até dos vocais de Mariko Doi.

Basicamente, foi uma comunhão indie e shoegaze. A épica e também pegajosa “Hold Me Closer” fez o trabalho de explodir a galera mais uma vez, e a volta para o bis com a versão de “Natsu Nandesu”, do Happy End, consagrou de vez o quarteto, mostrando toda a habilidade de Mariko Doi numa canção de vocal complexo.

Quando o show terminou, dava para perceber que o Opinião estava longe de estar lotado – mas também dava pra ver a alegria no rosto de cada uma das pessoas que havia pulado sem parar durante a última hora. Como em boa parte dos eventos independentes de Porto Alegre nos últimos tempos, apesar do público não ser enorme (e de muitos rostos serem os mesmos), é explícito que a galera presente é a mais pilhada possível – e, enquanto as coisas seguem acontecendo, isso é o que mais importa. O indie e o rock, apesar de decadentes, ainda vivem.

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10/11/2016

Redator de social media, jornalista, músico, emo, jogador de bocha, astrólogo e benzedeiro nas horas vagas. Um colono que se encontrou na cidade grande e agora pensa que sabe escrever sobre qualquer coisa.
Leonardo Baldessarelli

Leonardo Baldessarelli