Resenha | No compasso de Castello Branco

24/03/2018

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Brenda Vidal

Por: Brenda Vidal

Fotos: Vitória Proença

24/03/2018

Em uma sexta-feira à noite, depois das 19h, Porto Alegre tem alguns cenários clássicos: ônibus lotados de pessoas voltando para a casa, mesas de bar se multiplicando nas calçadas para quem quiser comemorar o happy hour ou uma galera já pedindo seus carros para ir para casa, tomar um banho, e ir para alguma festa. Outras pessoas, porém, tomaram um caminho diferente: às 20h, já lotavam o Teatro da Unisinos no aguardo do show de Castello Branco.

Às 20h35, o AKEEM Music subiu ao palco com a responsabilidade de amaciar o público no show de abertura. A iluminação rosa já deixava o profundo palco bem mais morno e amistoso, o resto foi com Akeem, Ricardo e Gabriel. Em uma apresentação super curta, embalaram a plateia com suas faixas que misturam samples de clássicos brasileiros com distorções, humor com amor e letras em inglês e português. “Cyber Love, pt.2” foi o ponto alto do set do trio.

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Descidas as cortinas, em menos de 30 minutos, o locutor anunciava a entrada de Castello Branco. Cortinas agora sobem e o que se vê é um palco ainda mais profundo. A iluminação azul deixa tudo mais leve e orgânico. No meio do palco, um tapete claro e um microfone no pedestal. Sem Castello, a imagem era vazia, mas contemplativa.

Alguns segundos depois, Castello Branco entra com um violão e os pés descalços, em um perfeito convite à calmaria. Os primeiros versos, que falavam sobre “servir” e “devir”, eram como uma espécie de prece, de permissão para que Castello doasse seu corpo, sua voz e sua alma para aquele momento.

Castello Branco (Foto: Vitória Proença)

“Providência”, do álbum Sintoma (2017), foi a segunda. Mal passados os primeiros minutos da apresentação, todos já estavam vidrados na performance de Castello Branco. A suavidade era o principal elemento, parecia percorrer desde os movimentos dos pés sob o tapete, passar pelos dedos da mão que dedilhava os acordes o violão, até cortar o ar na voz do cantor.

Logo na sequência, foi a vez de um dos principais hits do presente trabalho: “O Peso do Meu Coração”, performada frente a um público silencioso. Foi após o último verso que o cantor disse o seu primeiro e sucinto: “Boa noite”.

Os murmúrios doces de Castello Branco eram o aviso de que “Guerreiros”, do primeiro disco Serviço (2013), e “Coragem” estavam a caminho. A impressão era de que cada música era uma prece conduzida pelo artista, bonito demais para a gente se intrometer a cantar. Tinha fã que cantava muito baixinho, fã que só dublava com a boca e fãs que acompanhavam em um silêncio respeitoso e ainda os que fechavam os olhos para mergulhar nas sensações.

Castello Branco (Foto: Vitória Proença)

Em meio a tanta indecisão, Castello Branco fez silêncio para convidar o público para o coro. Não deu tão certo porque demorou para as pessoas se permitirem a cantar, o que foi levado com bastante bom humor por todo mundo. Ficava nítido que nada disso era má vontade, mas sim muita admiração.

A divertida “Não Me Confunda” e a delicada “Do Interior” deixaram o show ainda mais solto. Castello Branco se tornou maestro do público, regia com todo o corpo, organizando os (ainda tímidos) coros. Depois, foi ainda mais direto: “Vamo aproveitar?”, perguntou antes de tocar a super esperada “Crer-Sendo”.

Castello Branco (Foto: Vitória Proença)

O músico, sempre simpático, arrancava risos da plateia por sua própria espontaneidade, parando as canções no meio em vários momentos para conversar, contar as histórias das canções, como durante “Céu da Boca”, ou até mesmo explicar os refrões, como em “Cara a Cara”.

Castello Branco (Foto: Vitória Proença)

Depois de anunciar que o fim da apresentação estava chegando, Castello ouviu alguns pedidos para finalizar o som e acatou a maioria: “Estou Afim”, “Assuma”, “Kdq” e se encaminhando para o fechamento com “Necessidade”. De todas as boas conversas com o público, a última foi uma das mais tocantes. Castello falou sobre a importância de reconhecer privilégios, de ser grato e fez questão de declarar “Marielle Franco presente”, em alusão ao assassinato da vereadora Marielle Franco.

Castello Branco (Foto: Vitória Proença)

Castello Branco foi orgânico, visceral e delicado. Com um som de primeira qualidade e uma iluminação incrível, que misturou tons de rosa e azul, o que se viu foi um show extremamente intimista, mas não menos envolvente. Cuidadoso, os vazios e silêncios nunca deixaram uma sensação de falta, mas sim um convite para o preenchimento. O músico mostrou que suavidade pode ser sinônimo de força. Não uma força que seja bruta ou que provoque rupturas. Mas, sim, a força de emocionar.

24/03/2018

Brenda Vidal

Brenda Vidal