Música, afeto e resistência aquecem a noite do MorroPOAA

18/06/2018

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Brenda Vidal

Por: Brenda Vidal

Fotos: Vitória Proença

18/06/2018

Com temperaturas abaixo de 10°C em um outono com clima de inverno, somente bons motivos convenceriam alguém de que sair de casa no último sábado à noite era uma boa ideia. O MorroPOAA era um deles.

Reunindo artistas e bandas dos mais variados gêneros, o evento trouxe sua proposta de forma mais enxuta do que o festival Morrostock costuma ser. Mesmo sem sol e natureza, o espírito livre, artístico e resistente do Morro invadiu a cidade e ocupou o Pepsi On Stage, em Porto Alegre.

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O som começou a rolar no fim da tarde no palco Pacal. Com uma programação que foi de sintetizadores e vaporwave à música celta, não faltaram novidades da cena independente do Rio Grande do Sul. Passaram por lá Flor Et, Madame Bogardan, Louis&Anas, SUPERVÃO, Quarto Sensorial, Kiai Grupo, Paola Kirst, Bando Celta e Zahira Razi Grupo e Três Marias – um dos shows mais prestigiados do Pacal.

Kiai Grupo (Foto: Vitória Proença)

Paola Kirst (Foto: Vitória Proença)

Três Marias (Foto: Vitória Proença)

Entre as principais atrações do MorroPOAA, o Bloco da Laje, foi o primeiro a abrir os caminhos do palco Pachamama. Às 22h11, os defensores dos corpos brincantes deram início ao seu ritual. No nada carnavalesco mês de junho, com um frio que se alastrava pelo Pepsi On Stage, não se viam tantos rostos pintados e brilhantes, muito menos tantas roupas nas cores típicas do bloco (azul, vermelho e amarelo) no público. Entretanto, foi só o super coletivo entrar em cena, colorindo o Pachamama com balões gigantes e confetes, que o público se aqueceu e provou que ser lajuda ou lajudo é uma questão de estado de espírito.

Quando o assunto é o Bloco, sabemos que festejar e resistir andam de mãos dadas. Entre as canções clássicas do grupo, como “Terremoto Coletivo”, “Cordão da Idade Média” e “O Sol é o Rei”, além da performance de uma nova composição, os integrantes pediram a liberdade de Rafael Braga e fizeram questão de relembrar a figura de Marielle Franco. Com a apresentação sempre pulsante, o resultado no final do show foi de público com respiração ofegante e vestindo menos camadas de roupas.

Com o DJ Manoel Canepa assumindo o Pachamama, era hora de aguardar por Liniker e os Caramelows. Às 00h07, todos estavam prontos para caramelizar o público já com a requebrativa “Louise du Brésil”. Com uma setlist baseada na tour do Remonta (2016) – lançado em vinil no NOIZE Record Club -, Liniker completava sua quarta apresentação em Porto Alegre. Vestindo um casacão amarelo e sempre cheia de graça, a cantora ganhava o público com uma simpatia capaz de aquecer o ambiente.

“BoxOkê” veio na sequência, com Liniker dançando e (re)quebrando tudo. Entretanto, alguns problemas técnicos de som e, até mesmo, a amplitude do Pepsi On Stage foram desafios para o show da Liniker. Entre as canções, a cantora falou sobre o sentimento de retornar à cidade e sobre o entusiasmo em estar processo de criação do seu segundo disco, ainda sem data ou nome revelados. Logo em seguida, apresentou a faixa “Lava”, primeiro registro da nova fase.

Com seu universo lírico recheado de afeto e uma sonoridade groovada, o show da Liniker tem momentos ora dançantes, ora intimistas. O que predomina em qualquer uma das situações é o clima de afeto – com incontáveis casais se beijando, se declarando e se embalando agarradinhos – e também de luta. Entre os vários casais lgbts presentes no público, um se tornou o retrato disso: na performance da hipnotizante “Zero”, presenciamos uma emocionante homenagem entre um casal, que terminou com direito à pedido de casamento escrito na bandeira do arco-íris. Na sequência do show, as esperadas “Caeu”, “Tua” e “Prendedor de Varal” também foram destaque.

Os termômetros já marcavam 3°C e o relógio também avançava a madrugada. Às 2h20, foi a vez da Mulamba subir ao palco. Sem dúvida, esse era um dos momentos mais delicados do evento, após o cancelamento do show de BaianaSystem, por questões de saúde do vocalista Russo Passapusso, que está se tratando de um abcesso na garganta.

O grande acerto de Mulamba foi iniciar a sua apresentação não com o intuito de preencher uma lacuna vazia, muito menos de substituir a proposta do Baiana, mas sim de quebrar tudo do jeito que só a Mulamba sabe fazer. A abertura foi política, dura e direta, com os nomes de “Dandara”, “Marielle” e “Matheusa” sendo evocados em um texto que emocionou e mobilizou a plateia. Com a já tradicional primeira fila ocupada praticamente só por mulheres, a banda iniciou a explosiva faixa homônima.

É praticamente impossível sair de um show da Mulamba sem ser arrebatado. A experiência é sempre intensa, com uma dedicação completa de cada uma das integrantes. Caro Pisco na bateria, Fer Koppe no cello, Naíra Debértolis no baixo, Érica Silva na guitarra, e as performances de Cacau de Sá e Amanda Pacífico nos vocais são sempre em alto nível de execução e de entrega. Cada melodia e cada letra tomam novas formas, novos sentidos e significados ainda mais potentes.

“Provável Canção de Amor para Estimada Natália” e “Desses Nadas” deixou o clima com um toque afetuoso, com uma plateia que permanecia cantando as letras do início ao fim desde o começo do show. Com o público envolvido e a mulherada cada vez mais embucetada (como a banda canta), Mulamba foi com tudo para tocar a impetuosa “P.U.T.A”, emendando com mais uma versão de “Mulamba” para um público esbaforido, quente e de alma lavada. Seja por acaso ou destino, a certeza é de que Mulamba foi mais do que a atração final da noite, foi um dos destaques do MorroPOAA.

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18/06/2018

Brenda Vidal

Brenda Vidal