Abra bem sua janela: a brisa tropical do novo álbum da Academia da Berlinda, Descompondo o Silêncio, vai arejar o seu ambiente. Quatro anos após o antecessor Nada Sem Ela (2016), o lançamento tem seu eixo equilibrado entre a serenidade e a agitação. Composições sobre o cotidiano navegam nas percussões marcantes e a trama de sons híbridos, influenciados pelos ritmos afro-caribenhos e nordestinos.
O hepteto pernambucano dá as mãos a Kassin, produtor musical do novo disco, e ao Coala.Lab, projeto musical do Coala Festival. Tiné, vocalista da Academia, trocou uma ideia com a NOIZE sobre no que o registro inédito se centra, sobre o protagonismo da música regional e sobre lançar um disco em meio à pandemia de coronavírus. Ouça e leia tudo que vem a seguir.
O disco promove um grande passeio por sonoridades e temáticas. Qual é o núcleo de Descompondo o Silêncio? O que une tudo isso?
Descompondo o Silêncio é o momento que a gente tá vivendo, que a Academia da Berlinda tá vivendo. A gente demorou quatro anos de um disco pro outro, para fechar essa nova obra. A gente passa quatro anos trabalhando no disco e observando as coisas, traduzindo da nossa forma o que a gente ta vivendo e está ao nosso redor. E o disco é isso, é esse momento que a gente tava vivendo. Antes da chegada dessa quarentena, a gente tava vendo um país com muito radicalismo, falta de respeito ao ser humano e a várias coisas. Isso trazia uma angústia pra gente, muita gente trancada em casa sentindo essa coisa. E a gente traduziu isso dessa forma, meio que uma conversa com nosso público, nosso povo, nosso país. A sonoridade também é o trabalho desses quatro anos, de amadurecimento, de observação da banda.
Além das percussões e tambores, Descompondo o Silêncio é influenciado pela tradição da ciranda pernambucana, algo que acompanha vocês ao longo da carreira. A reverência aos pioneiros e às tradições populares é importante para vocês? Como essa conexão com as raízes contribui para o desenvolvimento do som de vocês sem que ele não deixe de soar como algo contemporâneo?
Assim como as percussões, os vocais, essa coisa toda da tradição da música nordestina, da música pernambucana, sempre foi uma base muito grande na nossa música. Todo mundo da banda tem vivência em música popular, a galera veio do maracatu; maracatu de Olinda, maracatu de baque virado, a gente sempre viveu em sambada de maractu nos interiores, de cavalo-marinho. Eu sou de Arcoverde, que tem o Samba de Coco Raízes de Arcoverde, então a gente tem uma vivência muito grande na música regional. Tem tudo a ver com nosso som aliada às influências gerais que cada um traz daquilo que gosta. E ao mesmo tempo essa influência afro-caribenha que a gente sempre gostou muito. Então, a Academia da Berlinda é uma grande mistura, uma grande salada de coisas que a gente curte e desse fundamento da música nordestina, então tem tudo a ver, é a base da nossa música, sim.
A data de lançamento do presente álbum coincide com a crise da pandemia pelo novo coronavírus aqui no Brasil, que nos obriga a tomar algumas medidas, como o isolamento social e a quarentena em casa, e que desestimula eventos com aglomerações, como shows. Vocês chegaram a discutir a possibilidade de adiar o disco? Como vocês estão lidando com essa impossibilidade de realizar shows de divulgação do álbum nesse momento?
O lançamento do disco era pra ser um pouco antes, mas a gente terminou, esperou o final do carnaval, esperamos as coisas se ajustarem e escolhemos lançar agora. Tem seus pontos positivos, seus pontos negativos. O ponto positivo é que todo mundo tá em casa, esperando, ansioso por algum coisa legal, e já tão curtindo demais que a gente tá lançando disco, a repercussão tá sendo boa. O momento tem coisas interessantes. Uma delas é o nome do disco, Descompondo o Silêncio, que tem muito a ver com esse momento que a gente tá vivendo, esse momento da pandemia. E a gente criou o título antes, no final do ano passado e tratava daquele momento que a gente tava observando falta de respeito com o ser humano, momento de radicalismo e todo mundo se sentindo angustiado. A gente tentou traduzir o que a gente tava sentindo pra fazer essa conversa com nosso público, uma conversa com todo mundo sobre o que estávamos sentindo. Várias pessoas sentindo essa angústia, esse silêncio tenebroso que é estar passando por tanta coisa difícil. E, pra gente, já era um prenúncio desse caos que tava pra acontecer agora. Quando chega agora esse período de quarentena, todo mundo trancado em casa, sem poder botar o pé pra fora de casa, isso tem muito a ver com o título do disco. Todo mundo em casa esperando receber alguma coisa, e a gente tá chegando com essa bagagem de melodias, de alegria, de serenidade. É um momento peculiar, porque tem esse ponto de ser um momento de tristeza. Sobre a questão de shows, de não estarmos podendo fazer, todo trabalhador tá passando por isso. Então é a gente se adaptar, saber entender o momento e aguardar a possibilidade da gente fazer os shows. Acredito que todo mundo já vai estar cantando as músicas, vai ser uma coisa positiva também.