#BQVNC | As especiarias orientais da Bombay Groovy

20/10/2015

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Por: Fabiano Post

Fotos: Divulgação

20/10/2015

O ano era 2012, Danniel e Rodrigo, dois entusiastas do sitar, fãs de Brian Jones e Jimmy Page, da cultura oriental, em especial a indiana, entre trocas de ideias pela internet, regados a assuntos místicos e rock & roll, começavam a forjar a parceria que oficializou, no início de 2013, a Bombay Groovy. O atibaiano, multi-instrumentista, especialista em instrumentos exóticos, Rodrigo Bourganos, assumiu o sitar que, o músico baiano, Danniel Costa havia “abandonado” ao eleger o contrabaixo como novo parceiro. A fusão de sonoridades e ritmos era o caminho natural, já que ambos tinham a mesma visão e gosto pela música em especial a oriental. No final de 2013, foi chamado o prodígio dos teclados, o pianista paulistano, Jimmy Pappon, que faz virtuosas e psicodélicas performances a frente do órgão Hammond. Pappon, trouxe harmonias e timbres cabulosos para BG. Com a chegada do batera, também atibaiano, Leo Costa, na segunda metade de 2014, a banda estava completaça. Leo é expert em percussões étnicas e rock progressivo; era o spicy que faltava para “a cozinha”. Munidos de virtuose musical, instrumentos não convencionais e um divino dom para o improviso na hora da execução; estava formado o quarteto roqueiro, meio mágico e místico cuja sonoridade universal de suas experimentações, repletas de psicodelismos e exotismos, são uma ponte que abre canais de percepção sutil e conduz a mansidão e ao gozo do Nirvana.

Por motivos estéticos e práticos, Bourganos rompeu padrões, transgrediu a tradição, ao tocar o sitar de pé, como um “guitarrista herege”, em negação a tradicional postura de lótus. “Fui mais inspirado pela transgressão do que pela tradição”, afirma Rodrigo.

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A Bombay é uma banda de Rock & Roll, que optou pela vocalização através dos instrumentos. Alguns deles pouco convencionais. Ser ou não ser – reticências – a banda não curte a ideia de um enquadramento cartesiano no “instrumental”. O sitar é o elemento gênesis que traz um oriente revisitado e repaginado para a alma do som da Bombay; a manjedoura de toda sua criação. E o rock progressivo do Led Zeppelin é a amálgama inspiradora que unifica ocidente e oriente, passado, presente e quiçá o futuro, ao som da banda. O style dandy flamboyant dos caras os faz parecer saídos de uma cápsula temporal, de algum momento entre os anos 60 e 70. O rock flertador e de múltiplas possibilidades feito entre 1967 a 1973 – e nele o Led reina absoluto – está impresso na identidade sonora e visual da BG. Já o peso do som da Bombay traz em si signos de 1972, de bandas que naquela época apostavam no estilo “heavy”, como Deep Purple, Emerson Lake & Palmer e Focus.

“Os grandes artistas não tem pátria” disse o poeta e dramaturgo francês, Alfred de Mussy. Talvez aí resida o segredo da Bombay. Camadas e mais camadas de sonoridades que se entrepõem alquimicamente, rompendo limites fronteiriços, passando a coexistir harmoniosamente. Adentrando no terreno nem sempre cômodo da música étnica e folclórica; respeitosamente rompe seus padrões e redireciona-os. Além da influência da música clássica indiana, a coisa toda vai muito “além-mar”, mais etnias envolvidas, dos mais diferentes rincões desse planeta; mais uma porrada de estilos musicais que se entrelaçam e se fundem, querendo ser um só. Do jazz ao rock ao hard rock, do psicodélico ao progressivo, do baião ao samba, do flamenco ao gypsy jazz, o afrobeat, etcétera. Tudo empacotado em uma enorme box de groove. Sem rótulos engessadores das possibilidades artísticas. Esses não combinam com a Bombay.

A miscelâneca e bem frequentada ficha corrida de influências dos caras, explicam, em parte, esse amplo universo sonoro de possibilidades. Só monstros da música planetária. De Led a Villa Lobos; Black Sabbath a Miles Davis; Paco de Lucia a Genesis. Coisa fina! Altíssimo gabarito!

Em 2014 foi lançado o álbum de estreia, homônimo, Bombay Groovy. São dez faixas repletas do que a banda sabe fazer de melhor, transgredir para abrir novas possibilidades, texturizar, experimentar e misturar, não necessariamente nessa ordem. É uma viagem fumeta! Produzido pelo próprio Bourganos e pelo técnico de som Cauê Doktorczyk, que também captou, mixou e masterizou, a criatura. Foi lançado com toda a pompa e lotação esgotada no teatro do Sesc Pompéia, em 2014. A recepção e repercussão do disco, pela mídia e público, ecoaram de maneira positiva. Pedi ajuda ao Rodrigo para anatomizar, “tecnicamente”, e decifrar o êxtase alquímico, ocultista e místico que é a experiência de ouvir Bombay Groovy. Seria interessante um vide bula, no próximo registro da banda, com propósitos iniciáticos. Sem contra indicações a superdosagem pode te fazer ASCENCIONAR. “Confounded Bridge” é a faixa que abre os trabalhos, uma introdução porreta de bateria e percussão dão as boas vindas, um riff marcante, que segundo Rodrigo, faz homenagem a Robert Plant: “É uma homenagem à maldita ponte que o Plant nunca conseguiu encontrar no disco Houses of the Holy e em momentos aleatórios da tour de 1973”.A quarta faixa, “Fonte de Castália”, uma composição de Bourganos inspirada em sua experiência entre as montanhas do Oráculo de Delfos, na Grécia, local onde está Fonte de Castália e seus poderes de oráculo. Tende ao rock progressivo. Nela já é possível notar a “interferência” causa pela entrada do pianista Jimmy, na BG. “Lunar Toth”, faixa que remete a magia egípcia, vem da raga pilu – escalas da música clássica indiana. O riff nervoso no baixo da faixa “Tala Motown” quebra com a áurea mística e mostra o lado ‘groovy’ e fusion da Bombay. A faixa,” Le Bateau d’Orpheu” é o ‘’hit’’ da BG, é também a música que virou o clipe de estreia da banda. Nessa Bourganos se puxou e muito, juntou Crowley, Sabbath e Santana, em sua explanação: “Com seu tema em modos gregos e sua variação com ares de Black Sabbath e versões ao vivo de “Dazed and Confused”, a música termina com um solo de theremin, por cima de um groove misterioso, como seria se Carlos Santana estivesse tocando “Soul Sacrifice” ou “Jin-go-lo-ba” em frente à “Boleskine House” de Crowley, no lago Ness. Que belo salseiro ocultista! Decodificados um bom par de faixas e falando em Aleister Crowley; o motto da Lei de Thelema me ocorre: “Faze o que tu queres, será o todo da Lei”. Nisso os caras da Bombay são mestres.

O que um dia foi três, virou quatro e retornou a ser três, com a repentina e precoce passagem de Danniel, em maio desse ano. Como na natureza, na música nada se perde tudo se transforma. A banda seguirá como um trio. E Danniel será lembrado no dedilhar virtuoso do sitar mágico da Bombay Groovy.

Duas semanas antes do trespasse de Danniel a manufatura do segundo álbum se iniciava, à distância. Rodrigo estava morando em Paris, estudando e fazendo uma imersão no universo do jazz manouche e levando um som com bandas de rock locais. Bourganos e Costa estavam de forma recíproca compondo e elaborando o novo trabalho da banda, via rede social. O “inbox” do FB bombava, literalmente. A vida é movimento, segue adiante, e a música também.

“Será um disco talvez de música étnica hard progressiva experimental. Tem muitas “doideiras” surgindo”, se entusiasma Bourganos ao falar do novo rebento. E será uma merecida homenagem a Danniel. A começar pelo nome Dandy do Dendê, apelido que DC recebeu do precursor do sitar no país, Alberto Marsicano. Estará pronto em dezembro desse ano, e lançado em 2016. Dandy do Dendê. Será o “marco zero evolucionário” na sonoridade da Bombay Groovy. O disco terá mais guitarras. O sitar segue como o arquétipo sonoro que molda a psique da Bombay; dessa feita, promete agir mais como “vocalista” do que guitarra.

A Bombay Groovy segue seus instintos transcendentais em suas experimentações sonoras universalizadas. Sintetiza em si própria a vontade de ser o todo em um só. Vai além, transcende e transgride de forma divinal a música na incessante busca pelo próximo novo som. Ouvi-los é uma experiência unificadora entre o físico e o atma. Lembranças ancestrais se revelam. No Universo, podemos Ser todos Um!

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20/10/2015

Gaúcho, de Porto Alegre, vivendo a 15 anos no Rio de Janeiro. Colaborador da Vice Brasil e autor lusófono do portal de mídia cidadã Global Voices.

Fabiano Post