De Olho Nelas | O ciclo dos outros sons de Juçara Marçal

08/03/2022

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Gabriela Amorim

Por: Gabriela Amorim

Fotos: Pablo Saborido/Divulgação

08/03/2022

Na procura de romper fronteiras, Juçara Marçal segue trilhando sua carreira que completa três décadas. Abrindo o mês das mulheres, a cantora é a primeira entrevistada da série de bate-papos que vai rolar, durante o mês de março, no site da NOIZE. Com a temática “Mulheres da cena independente para ficar de olho em 2022″, Marçal fala sobre a construção do disco Delta Estácio Blues (2021), chegada aos 60 anos, as novas possibilidades de som e mais.

Sucessor do disco Encarnado (2014), o álbum é mais um projeto independente e tem como produtor musical o amigo de longa data Kiko Dinucci, cantor, compositor e guitarrista, com quem compartilha o trio Metá Metá e Grupo Encruza. Delta Estácio Blues da mesma forma traz participações calorosas nas letras com Negro Leo, Siba, Tulipa Ruiz, Rodrigo Ogi, Maria Beraldo, Fernando Catatau e mais.

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(Foto: Pablo Saborido/Divulgação)

Lançado em setembro passado, o disco possuiu apresentações em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina. Prestes a realizar show na quinta-feira (10), na Casa Natura Musical, em São Paulo, a cantora e compositora se encontra enérgica para o evento. “Eu acho que o Delta Estácio Blues tem essa pegada, de ser dançante, propensa ao movimento, então as expectativas para o show na Casa Natura Musical, que é também uma pista, é que seja esse movimento massa de encontro com o disco, é muita adrenalina de fazer acontecer”, conta a cantora. Os bilhetes para a apresentação, que tem inicio previsto para às 21 horas, estão no terceiro lote sendo vendidos a partir de R$ 44,80 reais pelo site da Sympla.

Com a terceira dose da vacina, tomada no final de dezembro, Marçal teve um carnaval atípico, onde sua folia foi em meio aos projetos que estavam sendo realizados.

Durante o feriado, a cantora vocalizou o samba choroso “Retalhos de Cetim”, de 1973, do cantor Benito di Paula, em homenagem de álbum coletivo, celebrando as obras do artista. A fluminense alega que se adornou para entrar no clima de carnaval: “Eu lembro que para ir para a gravação, me paramentei de coisas carnavalescas, coloquei a camiseta da Charanga do França, que é um carnaval muito característico de São Paulo. Eu percebi que o feeling de carnaval precisava estar presente no momento de gravar o disco, então eu me preparei imaginando o carnaval imaginário”, conta gargalhando.

(Foto: Pablo Saborido/Divulgação)

Em meio a blocos clandestinos e carnaval com festas privatizadas, a cantora, sem julgamentos, declara que é um momento incomum, onde cada escolha deve ser considerada. “É muito estranho. A gente está no momento de avaliar o contexto em que se está vivendo e entender como é que você se coloca nele. Então é muito particular cada decisão, vai muito por aí. Eu trabalhei.”

| A trilha solar dos 60

Recém completados 60 anos, no fim de janeiro, a artista segue na contramão do que acontece no país, dado que o Brasil é top 1 mundial em número de cirurgias plásticas, conforme informações da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS) e Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP).

Marçal declara que não é resistente ao processo natural do envelhecimento, e que neste momento encontra-se mais forte para seguir sua carreira e vida pessoal: “Só para olhar para mim, já dá para saber que não sou de rechaçar tudo que se refere ao envelhecimento, eu não faço plástica, não tenho essa loucura de permanecer jovem, mas ao mesmo tempo o corpo vai te dando sinais de que você não tem mais a mesma energia de quando tinha 20 ou 30 anos. Então é aprender a lidar com as fraquezas do corpo, mas ao mesmo tempo com a energia de continuar muito forte nas coisas que você acredita”, relata sem hesitação.

Juçara Marçal em show na Casa Natura Musical, em São Paulo. (Foto: Divulgação)

| Pesquisa para nova perspectiva de som

Na atmosfera do eletrônico, Juçara Marçal, ao lado de Dinucci, se debruçou sobre o projeto do álbum no ano de 2017. Com curiosidade constante por uma nova estética, a cantora decidiu experimentar outras sonoridades através de equipamentos que já usava. “Este último álbum tem sim a linguagem eletrônica mas muito misturado com o meu jeito de colocar a voz, com o jeito do Kiko de tocar guitarra, e o baixo que ele também colocou, porque pensar sobre o baixo é o que prezamos muito, inspirados por Itamar Assumpção“, pontua a cantora.

Se enveredando em novos projetos e com agenda cheia, a artista descobriu possibilidades sonoras com aparelhos que já trabalhava: “Lidamos de uma maneira muito lúdica com o aparato todo que a gente vai descobrindo, então eu tinha um pedal de efeito de voz, e aquilo me inspirava muitas possibilidades de som. É sempre essa postura de investigar como que aquela ferramenta pode te possibilitar sonoridade, então foi esse vetor que levou a gente a criar o último álbum”.

Residindo no mesmo prédio que o amigo, Marçal adentrou a intensidade da produção durante o início incerto do que era a pandemia, e ao lado do vizinho Dinucci, seguiu na elaboração do disco. “O disco teve um momento de se consolidar durante a pandemia, é louco dizer isso, mas foi isso que aconteceu. Era possível trabalhar junto, porque sabíamos que a gente não saia para lugar nenhum, então de máscara eu ia para o apartamento do Kiko. A gente ficou esse tempo todo trabalhando minuciosamente para entender o que era esse som que estávamos buscando. E aí vai o tempo de entender, espalhar para os amigos a ajudar na compreensão, e isso foi justamente no período de confinamento da pandemia. Eu acho que isso de alguma forma influenciou no que é o som do disco, porque a gente pôde se aprofundar de uma maneira muito mais dedicada do que é o som”.

| Repercussão da mídia e passos futuros

“Eu não faço plástica, não tenho essa loucura de permanecer jovem”. (Foto: Pablo Saborido/Divulgação)

Enaltecido nos veículos nacionais e internacionais, como no jornal britânico The Guardian e no francês Libération, o disco Delta Estácio Blues conjuntamente ganhou prêmios pelo país. Em fevereiro triunfou na categoria “Disco do Ano”, pela APCA – Associação Paulista de Críticos de Arte, enquanto meses antes recebeu vitória em duas categorias do Superjúri no Prêmio Multishow 2021, com o título de “Álbum do Ano” e “Canção do Ano” com a faixa “Crash”.

“É muito legal, porque quando a gente começa um projeto, a gente não sabe onde vai dar, ainda mais quando você envereda por linguagens que não são usuais e padrão, que não as linguagens que você usava em projetos anteriores. Então quando isso tem reconhecimentos de prêmios, feedbacks de fãs, pessoas amigas, de quando entendem onde você estava querendo chegar é muito legal. A gente fica muito feliz assim. 

O reflexo imediato que a cantora recorda foi o aumento no número de seguidores do Instagram, Marçal diz: “Foi algo muito impressionante como nas redes sociais isso reverberou de um jeito que eu nunca esperaria, mas ao mesmo tempo, o fato de você ter prêmios, matérias rolando em veículos pelo mundo, isso não muda seu trabalho efetivamente, de alguma maneira isso auxilia a continuar o seu trabalho, mas não sei se isso muda o seu jeito de trabalhar”.

Questionada se faria performances também na rede social Tik Tok, a fluminense afirma que não tem o feeling para auxiliar na produção de conteúdo da rede. “Sabe que eu até abri uma conta no Tik Tok, mas eu fico lá só assistindo, [risos]. Eu não sei fazer vídeo de danças, eu não sei”, conta com sorrisos no rosto.

Juçara Marçal na capa do disco lançado em setembro. (Foto: Divulgação)

Repercutindo por veículos nacionais e internacionais, Marçal garante que esse trabalho não nasceu de um dia para o outro, e acredita que o destaque para tais acontecimentos é devido ao trio Metá Metá. Com apresentações no festival Primavera Sound, no ano de 2018 em Barcelona e 2015 no Roskilde, maior festival de música e artes do norte da Europa. A artista simpatiza com o formato de eventos internacionais que visam músicos que não são de massa. “Desde 2012 o Metá Metá faz shows na Europa, a gente tem uma relação desde o início muito bacana com um agenciamento lá da Europa, que construiu essa carreira de festivais e shows. Então acho que é por conta disso, desde 2012 o Metá Metá fez todo ano algum festival da Europa, então foi uma construção de formiguinha.  Eu acho que tem uma coisa muito legal do cenário musical e produção musical europeia, que é a possibilidade de você não necessariamente ser um som mainstream, se você tem um som mais alternativo tem espaço, os festivais acolhem esses sons, o que acontecem na mídia mais comercial”, relata.

Com planos que ocupam a agenda de 2022, a artista irá participar do festival Roskilde, ao lado do amigo Dinucci apresentando o aclamado disco Rastilho (2020), de Kiko, e igualmente conta com tour prevista para final do ano: “Eu e Kiko voltamos para Europa, eu falo isso e já lembro da guerra, mas a princípio está marcado o festival Roskilde, no final de junho, e a tour do Delta Estácio Blues no outono europeu, final de 2022″, expondo continuamente a energia que segue a acompanhando dentro e fora dos palcos.

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08/03/2022

Gabriela Amorim

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