Dingo Bells lança “Maravilhas da Vida Moderna” | Entrevista + Faixa a faixa

08/04/2015

Powered by WP Bannerize

Ariel Fagundes

Por: Ariel Fagundes

Fotos: Ariel Fagundes

08/04/2015

Depois de lançarmos com exclusividade o single de “Mistério dos 30”, apresentamos Maravilhas da Vida Moderna, o primeiro disco inteiro da Dingo Bells, produzido por Marcelo Fruet. Nele, você terá certeza de que a banda de hoje não é mesma de outrora: o som do seu EP, Dingo Bells (2010), realmente ficou para trás, talvez apenas incorporado como mais uma das referências presentes no álbum. Enquanto isso, um horizonte de timbres contemporâneos se abriu sobre os pés do grupo, que fará o show de lançamento do disco no próximo dia 22, no Teatro Renascença, em Porto Alegre.

O vocalista e baterista Rodrigo Fischmann conversou com a NOIZE em uma noite de audição do disco e, além de suas revelações sobre a história da Dingo Bells, você encontra abaixo um faixa a faixa elaborado pela própria banda que servirá como uma boa bússola para os ouvintes náufragos. Para começar seu mergulho, basta dar play:

*

NOIZE: Há uma diferença grande entre as gravações antigas e o disco que saiu agora. Que mudanças aconteceram no grupo nesse meio tempo?
Rodrigo Fischmann: A Dingo Bells surgiu na época do colégio, a gente era colega e tocava sem nenhuma pretensão. E, depois de cada um passar um ano morando fora, nos juntamos e pensamos: “Tá, vamos levar a sério? Vamos tentar fazer shows?”. Fazendo shows, tu vai montando repertório, começa a criar músicas… Aí, quando gravamos o EP, em 2010, ele foi um recorte do que era aquilo. Bem mais adolescente, cheio de energia! O EP é de 2010, mas traz músicas compostas em 2006. A maioria das composições eram minhas e a gente fazia os arranjos só no final, quando a canção já tava elaborada. Criamos enquanto fazíamos shows, era uma banda muito voltada pra tocar ao vivo. Depois, em 2013, lançamos o single de “Lobo do Mar” e ali já se nota que buscamos uma certa maturidade. Não é nem isso, foi uma coisa natural, a gente tava amadurecendo. Mas o que tá saindo agora é o nosso primeiro disco, e é muito legal que seja assim. Porque tivemos o privilégio de ter feito um laboratório com aquele EP e com o single. Tanto que as canções hoje são mais maduras até nas composições, não são músicas de um ou de outro músico, são retratos da Dingo Bells mesmo. Ele tá muito mais pensado. Tudo ali é muito mais proposital e não um recorte de momento e acaso, como era o EP. Ele tem uma intenção clara que a gente quer passar. Acho que esse nosso disco tá bem mais digerível que o EP, mas gostaria de salientar que temos muito carinho pelo EP. É muito legal, é juvenil, é jovem. Tem um sangue fresco, as guitarras ficam lá em cima! Acho do caralho! Mas com certeza gosto muito mais do novo trabalho. Arte é isso, é muito o teu momento. Tu tem que, de certa forma, negar um pouco o que fez antes pra conseguir digerir muita informação e vomitar algo novo.

No disco novo, salta muito aos ouvidos referências mais contemporâneas, principalmente se comparado com as gravações antigas. Isso foi fruto de novos sons que vocês foram ouvindo?
Com certeza. Uma banda “nova” que nós três tivemos um momento de ficar viciadinho foi o Fleet Foxes. Mas a gente ouviu muita coisa, muito Caetano Veloso dos anos 80. Steely Dan também é uma banda que a gente cita.

E como foi o trabalho do Marcelo Fruet na produção do disco?
Ele nos ajudou dizendo o que funcionava ou não, apresentando arranjos. Era o que a gente sempre buscou, alguém que nos dissesse “isso não” ou “isso sim”. Se deixasse, a gente ficaria viajando pra sempre. Pra ter uma noção, passamos um ano criando músicas e tendo ideias de arranjos. Queríamos fazer um disco de 10 músicas e apresentamos 10 músicas pra ele. A resposta foi: “Querem fazer um disco com dez faixas? Me apresentem no mínimo 20”. No final, o disco ficou com 11 músicas, mas, basicamente, ele fez a gente criar todo o disco em dois, três meses. Ele nos botou aquela pulga atrás da orelha: “Acha que isso tá bom? Tenta te superar”. Foi muito legal, mas foi um balde de água fria! A gente tava na pilha de gravar e ele: “Não, com isso não vamos. Vamos fazer mais músicas”. Até na pré-produção no sítio [boa parte do disco foi criado em um sítio em Viamão, RS], nós sentávamos e discutíamos as letras. Uma das recompensas do crowdfunding que financiou o disco é um documentário da gravação e, nele, tem cenas que mostram bem o Fruet dando opinião de como tem que ser a linha do baixo, criando junto o groove da bateria. Ele virou um elemento muito importante do disco, tem linhas de guitarra que ele gravou… Tem músicas que até são de co-autoria dele, de tanto que ele trabalhou junto. Ele botou muito a mão na massa, desde a composição até o final na mixagem. E foi exatamente o que a gente queria. Claro que demos umas belas discutidas, às vezes ele tinha uma ideia, nós tínhamos outra. Foi um arranca rabo, mas isso é muito rico.

E sobre a voz da Dingo Bells… Nas gravações anteriores, o Diogo Brochmann cantava mais. Como vocês chegaram no formato atual?
Cantava. Na verdade, a gente dividia. No EP, fizemos um negócio muito estranho: às vezes eu cantava uma oitava abaixo e ele cantava uma oitava acima, às vezes a gente fazia até a mesma linha, com os dois cantando a mesma nota. Mas tinha bem mais a voz dele mesmo. Acho que foi uma questão de se sentir confortável no que se está fazendo. Me sinto muito confortável cantando. E os guris acabaram se dedicando ao trabalho de harmonizar tudo junto e de explorar mais seus instrumentos. Mas eu não tenho uma explicação, foi acontecendo assim. É curioso que a única música do disco que o Diogo canta no disco é a única composição que praticamente inteira minha, “Dinossauros”. Foi feita antes do processo de composição das novas músicas e eu acho muito legal porque ele conseguiu dar a personalidade que precisava na música, tem uma sinceridade na voz. E foi assim que rolou, não existe uma briga de ego, “ah, essa eu que canto”. É como fica melhor pra todo mundo. E acabou sendo melhor eu cantar a maioria das músicas.

Então não é algo que está fechado.
Não… Cara, a princípio eu sou o vocalista da banda, mas a gente sempre credita os três como vocalistas. Se tiver uma música pro Felipe cantar, beleza, não tem nenhum galho. Sempre respeitamos muito a canção, vemos o que ela tá pedindo. Se ela pedir que eu toque teclado e cante, é isso que vai acontecer. Tentamos respeitar mais o que a música pede do que a identidade da banda. Porque isso é muito vago também, é uma construção e público vai enxergar o que tiver a fim. Se um cara acha que é uma banda onde é o batera quem canta, ou se acha que os três cantam, não somos nós que vamos dizer.

No próximo dia 22, tem o show de lançamento do disco em Porto Alegre. Vocês têm algum plano de turnê?
A gente não tem nada fechado ainda, mas a ideia é dar o pontapé inicial em Porto Alegre, no dia 22, e já no início de maio fazer um lançamento em São Paulo. E, a partir daí, fazer no Rio, talvez no interior de São Paulo também… No segundo semestre, talvez mais pro final do ano, o plano é lançar o disco em vinil. Vamos tentar viabilizar. É caro fazer o vinil, então a banda acaba tendo que cobrar um valor alto pelo disco. Mas é um sonho! A gente é aficionado por vinil!

E sobre novos clipes? Vocês estão pensando nisso?
Sim, já temos ideias de roteiro pros dois singles que a gente lançou antes do disco, “Eu Vim Passear” e “Mistério dos 30”. “Eu Vim Passear” vai ser com o Roberto Burd, que fez o clipe de “A Janta, A Colher e O Banho”. E “Mistério dos 30” vai ser com o Martino Piccinini, um amigão nosso que fez um material gráfico muito massa no single de “Lobo do Mar”. Já estamos vendo como rodar nesse ano e lançar alguma coisa em 2015. Não temos certeza ainda, tem que ver com produtor e assessoria como vão seguir esses planos. Depende até da situação do país né, vai que daqui a pouco tem uma crise desgraçada e temos que segurar tudo. Mas a princípio é isso: vamos lançar clipes no segundo semestre e, até o final do ano, o vinil. E o que a gente mais quer é fazer o máximo de shows e que muita gente ouça isso aí.

Faixa a faixa – Maravilhas da Vida Moderna (2015)

“Eu Vim Passear”
A música fala de alguém que vai chegando ao mundo e começa a se deparar com nosso estilo de vida, de preocupações desviadas, de certezas tão frágeis. O refrão “tanta gente buzinando esqueceu de andar, veio ao mundo por engano, eu vim passear” resume o espírito da canção. É o primeiro single de Maravilhas da Vida Moderna.

“Mistério dos 30”
Faixa que carrega na letra o nome do álbum: Maravilhas da Vida Moderna. É uma música que revela bastante sobre nosso momento de vida, sobre nossos medos e anseios. Essa foi a única faixa que gravamos ao vivo, lá no sítio em Viamão (RS). Tem um dos instrumentais mais poderosos do disco.

“Fugiu do Dia”
Uma das músicas mais ousadas do álbum, devido à sua instrumentação, arranjo e jogos rítmicos. A ideia era traduzir um pouco do apuro e da urgência da letra, em que o protagonista está numa jornada pessoal em busca da felicidade. O resumo da canção pode residir no seguinte trecho da letra: “mas sorrindo percebeu que a alegria era a própria estrada”.

“Dinossauros”
O conceito da capa do disco surgiu da letra de “Dinossauros”. A balada, por vezes atmosférica, explora de forma nostálgica a questão das expectativas e frustrações ao longo da vida, através de metáforas sobre a existência e a finitude das coisas. A canção, de clima intimista, é a única cantada pelo nosso guitarrista, Diogo Brochmann.

“Maria Certeza”
Tem uma sonoridade muito particular que explora texturas bastante sutis. A participação de Carina Levitan foi muito importante, adicionando percussões com diversos objetos criados por ela e manipulados em estúdio, na sequência. A letra, pensada como um conto, acaba questionando o quanto devemos apostar em convicções cristalizadas.

“Olhos Fechados Pro Azar”
É uma música bastante solar com diversas mudanças de cenário. Tivemos a participação de Felipe Zancanaro (Apanhador Só) nas guitarras que acrescentou no colorido e na brasilidade da música. Os grooves de baixo e bateria somados ao arranjo de sopros feito pro Fabricio Gambogi deram bastante dinâmica pra essa faixa que fala sobre um tempo vivido que já não se encontra mais.

“Bahia”
Optamos por uma sonoridade lo-fi em “Bahia”, com muita ambiência e ruídos. A ideia era remeter a um lugar e a uma época distantes. Bahia é o refúgio que criamos, nossa Pasárgada; um ambiente onde a brisa é leve e as preocupações deixam de incomodar. No entanto, nessa Bahia, a brisa vem de um grande ar-condicionado.

“Hoje o Céu”
Essa música deu bastante trabalho durante a mixagem por ter vários elementos, mas ficamos muito felizes com o resultado dela. O arranjo é superenérgico e urgente. “Hoje o céu vai desabar, do que você vai lembrar?” resume um pouco dos questionamentos que propusemos com essa letra. Em que direção estamos indo e como estamos investindo nosso tempo são alguns desses pontos. Ou seja, se tudo acabasse hoje, você estaria satisfeito?

“Funcionário do Mês”
Durante a pré-produção, “Funcionário do Mês” foi uma das canções mais trabalhadas. Como é uma música com muitas partes diferentes, precisávamos juntar tudo de forma coerente pra que o discurso fizesse sentido. A música fala sobre as expectativas de um modo de vida enlatado. Um padrão de sucesso e felicidade pouco questionado.

“Anéis de Saturno”
“Ele não sabe, mas vai morrer. Uma estrela vai cair em seu quintal”. Assim começa a faixa mais intimista e melancólica do álbum. Com instrumentação bem reduzida, dando bastante destaque para as harmonias de voz, “Anéis de Saturno” teve violão gravado ao ar livre no sítio, durante a noite, em um gravador de fita cassete. Ao fundo, é possível ouvir os grilos no ambiente, que contribuíram pra aura da canção. “Anéis…” é uma música que fala sobre o tempo compartilhado com aquelas pessoas que amamos.

“Todo Nó”
É a canção que encerra Maravilhas da Vida Moderna. O arranjo feito por Fabricio Gambogi é lúdico e beatleniano. A letra é a garantia de que os questionamentos levantados ao longo do disco não possuem uma moral fatalista. Ao final de tudo, a alegria pode ser algo pequeno, pessoal e íntimo, que nos motiva a seguir em frente e viver. Leve e sorridente, o ouvinte dá adeus ao disco.

Tags:, , ,

08/04/2015

Editor - Revista NOIZE // NOIZE Record Club // noize.com.br
Ariel Fagundes

Ariel Fagundes