Entrevista | “O tempo está acabando”, diz o diretor Andrew Thomas Huang

15/10/2020

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Ariel Fagundes

Por: Ariel Fagundes

Fotos: Divulgação

15/10/2020

Entre o Yin e o Yang das matrizes culturais do Ocidente e do Oriente, Andrew Thomas Huang construiu um fantástico universo sensorial. Suas criações já foram exibidas no Museum of Modern Art (NY), The Sydney Opera House, Museum of Contemporary Art (LA) e seu portfólio acumula prêmios e inclui uma indicação ao Grammy. Seja através da sua filmografia pessoal ou em colaboração com artistas do porte de Björk, FKA Twigs e Thom Yorke, Huang mostra que é muito mais do que um diretor e roteirista – ele é um pensador, um inquieto cuja própria agitação emocional o leva a criar obras que expandem constantemente fronteiras narrativas.

Devido ao cancelamento da visitação presencial à exposição itinerante Björk Digital, que aconteceria nos Centros de Cultura Banco do Brasil, foi lançada uma programação online trazendo ao público uma troca com colaboradores da artista islandesa (saiba mais). Huang é um dos convidados da série de lives desse projeto chamado #CCBBEMCASA: Imersão, Arte e Música, que acontece entre os dias 17 e 18 outubro, das 18h às 22h, no canal oficial da Cinnamon Comunicação na Twitch. Parceiro de Björk desde 2012, Huang já trabalhou em várias obras com ela, incluindo a exposição Björk Digital, e, no dia 18, irá conversar com o jornalista Zeca Camargo ao vivo.

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Conversamos com o artista e, na entrevista que você lê abaixo, Huang comenta a sua relação com a Björk, suas inspirações estéticas e também a sua herança chinesa. Ainda que nascido nos Estados Unidos e residente em Los Angeles, ele é descendente de imigrantes da China e explica que essa dualidade de culturas é um desafio urgente que o acompanha e o empodera em toda sua vida e sua obra. Leia abaixo.

Andrew Thomas Huang (Foto: Divulgação)

Sua parceria com a Björk começou no clipe de “Mutual Core” (2012). Como o relacionamento artístico de vocês evoluiu de lá pra cá? Como é trabalhar com ela?

“Mutual Core” foi o começo e um local de encontro perfeito para nós, onde nossas sensibilidades se uniram de forma realmente natural. Nosso relacionamento tem se aprofundado muito desde então, especialmente com a jornada que fizemos juntos através do Vulnicura. Aquele processo tornou-se um canal aberto contínuo – um fio de comunicação ao vivo entre nós através do qual poderíamos resolver problemas juntos e estar em uma conversa mais profundas com os temas e ideias a serem explorados. Aquele processo de enfrentar desafios juntos repetidamente me deu uma percepção muito mais rica sobre como a Björk pensa e trabalha. Ela é com certeza uma das melhores colaboradoras que existem.

Como foi a criação do projeto Björk Digital? Como você vê esse projeto hoje?

Björk Digital foi basicamente um processo evolutivo de tentativa e erro, começando com “Black Lake”, que foi um filme originalmente projetado para ser uma experiência 360º. Depois, “Stonemilker”, que foi nosso primeiro vídeo VR em 360º, e então “Family”, que foi um projeto para HTC Vive construído com a [empresa] Unity. Então, cada iteração foi concebida a partir dos desafios dos projetos anteriores e gradualmente se tornou a exposição itinerante que é hoje.

As experiências com as realidades virtual e aumentada (VR e AR) estão cada vez mais próximas das pessoas hoje. O que você sente sobre isso? Que potenciais artístico vê nesse campo?

Eu acho que VR e AR são ferramentas poderosas, mas eu acho que ainda há muito trabalho a se fazer em termos de dar ao público acesso a essas tecnologias. Mundos virtuais são poderosas arenas para se experimentar, mas apenas se nós estivermos trazendo para esses mundos a riqueza e a profundidade da narrativa humana autêntica. Sem isso, essas tecnologias podem ser apenas truques.

Vários dos seus trabalhos (“Black Lake”, “Cellophane”, “Before Your Very Eyes”, “Flesh Nest”…) mostram universos fantásticos, onde elementos humanos e digitais se fundem com forças da Natureza. Como o mundo real inspira você a criar esses outros mundos surreais?

Às vezes, imagens, texturas, ideias e relacionamentos ficam presos em mim e não saem da minha psique. Portanto, eu não tenho escolha a não ser meio que exorcizar essas coisas, implementando elas no meu trabalho, e descobrir o que elas estão tentando dizer ou por que eu estou fascinado por alguma dessas coisas. Eu sinto como se eu estivesse apenas refletindo a vida que eu estou vivendo dentro da minha cabeça o tempo todo, eu acho.

Como as culturas ocidentais e orientais se articulam na sua vida e no trabalho?

Como um descendente de imigrantes chineses nos Estados Unidos, essa hibridez tem sido sempre parte da minha vida e do meu trabalho. É inescapável, mas empoderador estar entre as duas o tempo inteiro.

Enquanto artista sino-americano, você sente algum tipo de responsabilidade para criar obras que falem sobre as pessoas chinesas na América, ou algo assim?

Responsabilidade é uma palavra complicada porque não sinto que posso responsavelmente reivindicar minha experiência pessoal como sino-americano como universal. A diáspora chinesa é vasta e complexa. Eu sinto mais urgência, no entanto, de compartilhar narrativas que são exclusivas da minha história e identidade, porque isso me enche de significado e abre rachaduras em minha própria investigação contínua sobre minha herança. Nossos ancestrais têm muitas respostas para nós – eles estão esperando que nós os alcancemos. E acredito que o papel dos artistas hoje é duplo: refletir nossa realidade como ela é, mas também abrir uma porta para o mundo imaginar algo melhor. Nós precisamos de novas ferramentas, novas invenções e novas imaginações agora mesmo mais do que nunca. O tempo está acabando.

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15/10/2020

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Ariel Fagundes

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