Emicida acaba de lançar sua nova mixtape, “Emicidio”, em parceria com a rede Fora Do Eixo. As participações contam com um time de respeito: Kamau, Zegon, Nave, Fioti, Laudz, Renam Samam, DJ Will, DJ Nyack, Curumin, Dario, Skeeter, Casp e Tomaz e Daniel da banda Mão de Oito. E o preço continua módicos R$ 5,00, desta vez com a distribuição da Fora do Eixo, atingindo 20 estados em mais de 50 postos de venda (para comprar mande email para vendas@emicida.com).
Neste vídeo, Emicida bate um papo com o pessoal do Fora do Eixo sobre o lançamento e a parceria com o Laboratório Fantasma:
Conversamos com o MC no começo de setembro sobre esse momento em sua carreira, sobre o novo disco, a oportunidade de ter um estúdio, música independente no Brasil e tudo que corre a mente de Emicida. Se você ainda não leu, segura:
Ano passado, você e o N.A.S.A. saíram na Noize e você disse na entrevista que o Zegon tinha sido muito importante pra você como rapper. Recentemente vocês ficaram próximos e até tocram juntos. O que mudou e rolou na tua carreira daquela Noize pra cá? Como foi (ou tem sido) trabalhar com Zegon e qual importância disso pra você?
Zegon, assim como o Daniel Ganjaman, Marcelo D2, Racionais MC’s, DMN, MV Bill e Rappin Hood influenciaram fortemente minha música e até minha personalidade. Não tive pai, aprendi a ser homem com o que esses caras disseram em suas músicas. Quando rolou o lance da Vice, do Creators Project e Intel eu fiquei feliz por ser lembrado, mas desconhecia a dimensão do projeto. Tinha esbarrado no Zegon em alguns momentos já, pelos ensaios e shows da vida, mas nunca tinha conversado muito. Parteum, outro idolo pra mim, me disse outro dia que o que nos separa é somente o ar e a oportunidade e eu creio nisso. Surgiu a oportunidade e nos falamos, nos encontramos, ouvimos uns sons. Eu quase não falo perto desses caras, tenho um bagulho meio Daniel San mesmo, não vou estragar o aprendizado próximo destes mestres com palavras, realmente os vejo assim, aprendi pra caralho nessa convivência rápida que tive. Uns dias depois ele veio aqui no meu estúdio e trouxe uns instrumentais pra que eu ouvisse e se curtisse era tudo nosso, coisas dele antigas, coisas do N.A.S.A., eu ouvi, curti e uma delas já vem na mixtape Emicidio, agora em setembro. Sou suspeito pra falar, mas ficou foda! Enquanto eu puder compartilhar de momentos junto com estes caras estarei aprendendo o máximo possível, são as mentes mais preciosas da nossa música neste momento, atuais e trabalhando pelo que temos de mais criativo hoje na música brasileira: o rap.
Vocês seguem em contato ou pretendem fazer mais colaborações?
Se esses caras me ligam eu atravesso o pais nem que seja pra fazer uma foto.
O que esperar dessa mixtape? A produção ainda vai ser caseira? Vi que o preço aumentou um pouco, o que isso reflete do material?
Tem que tomar cuidado com o que as pessoas entendem por caseira, já não gostava de ficar pagando de não tenho estúdio pra fazer as coisas, agora que tenho é que num vô fazer isso mesmo! Ela vem com um trabalho maior, em cima de alguns quesitos que na anterior não foram tão bem trampados devido ao corre extremo e a falta de grana. Gravei as vozes na Maria Fumaça com meu mano Tixaman, me sinto muito a vontade trabalhando lá, só é longe, mas o resultado está muito legal. É uma mixtape novamente, uma reunião entre as minhas rimas e o trabalho de varios beat makers do pais que me chamaram a atenção. Um lance bem variado em termos de equipe criativa mas centrado na ideia, acho que ela vai ter cara de CD que era pra ter saído há uns 10 anos atras, bumbo e caixa, poucos efeitos ou nenhum efeito na voz, batida e rima e ideia. É o que sei fazer, contar histórias, quero me apofundar nisso cada vez mais, fazer filmes com esse grupos de palavras que junto. A principio faríamos à mão como a anterior, mas devido ao número de cópias que pretendemos vender nos primeiros dias não será possível trabalhar artesanalmente. E sair pra vender cds também é difícil, pois minha equipe ainda é pequena, meu time de vendas é o time dos shows, o time do marketing e o time que ouve também (risos). Vamos fechar uma parceria e pegar as capas prontas do CD (gravação e impressão ainda seremos nós) mas é uma questão de pouco tempo até termos as prensas de CD’s e impressoras para fazermos tudo aqui mesmo. O preço segue popularíssimo, vendemos muito, gostamos da ideia de as mixtapes serem mais baratas e embora ninguém reconheça, demos uma chacoalhada no mercado com essa iniciativa. Como achamos que foi apenas um primeiro passo, vamos ver onde erramos, onde acertamos e fazer o dobro na metade do tempo. Marrento né? (risos).
E esse lance do Laboratório Fantasma, qual a ideia de vocês com esse estúdio? Que projetos sairão de lá?
Eu sempre quis ter um lugar pra gravar, as vozes eu não fiz lá porque a acústica ainda está sendo trabalhada, mas a produção de diversos beats ja foi ali mesmo no Laboratório Fantasma. Eu mesmo fico mais tempo no escritório que no estúdio, embora eu sempre fuja para lá. Temos muitas coisas em andamento e preciso fechar muita coisa junto com o Fióti. Eu tive que juntar algumas pessoas para trabalhar pelo que acredito e obviamente pelo que elas acreditam também, que é o hip hop. A coisa virou uma empresa de forma involuntária, chegou um momento que precisávamos de escritórios, salas e locais para reuniões e para armar estratégias. Nossas casas ficaram pequenas, alugamos um apartamento e demos esse passo e nasceu a Laboratório Fantasma físico. Pretendo lançar outros artistas que eu me identificar e acreditar no trabalho, mas não agora, uma coisa de cada vez. Neste momento as atenções estão voltadas para o que faz a empresa andar e nos garante lugares próximos do que mais amamos que é a música. Com o tempo vão aparecer novos nomes, tenho alguns aqui, mas no momento certo direi quem são.
Setembro é mês da independência e músicos como você são grandes guerreiros desse cenário. Nesse momento, O que você acha mais urgente pro cenário continuar crescendo?
Na real pros independentes todo dia tem que ser dia da independência (risos). Acho que antes de abrir portas e mercados precisamos expandir a mente e nossos pensamentos, não adianta abrir portas se você não estiver pronto para lidar com oque sairá delas. Ainda vejo muita gente atacando o mainstream como se falar mal do Restart fizesse a música ou o mercado de alguém melhor. Acredito que precisamos apenas trabalhar sério e mais, afinal de contas somos independentes. Pra crescer tem que adquirir cada vez mais maturidade, como um ser humano mesmo, como um organismo comum. Gosto das conquistas que temos neste campo, acho que as iniciativas mais populares e bem sucedidas da música hoje partiram da independência, de Calypso a funk carioca a Emicida. Viemos de um mesmo lugar com um mesmo propósito: fazer música do nosso jeito. Isso planta em mim um otimismo e um entusiasmo para crer que a consolidação da ideia de música independente vai se fortificar cada dia mais na mente das pessoas, mas sem ter que se explicar muito, por que o povo quer que se foda se é Universal ou Fora Do Eixo. Quer música boa pra ouvir, está disposto a ir atrás, mas as bandas tem que saber chegar.
Aquele evento (Creators Project) colocou uma galera do rap simbolizando os criadores brasileiros na noite. Tu enxerga esse momento como um momento foda pra vocês? Vê aquilo com certa desconfiança?
Não precisa ser muito inteligente para ver que os olhos estão voltados para o rap neste momento. Tudo já foi sugado pra caralho, o rock não está na sua fase mais criativa, o brasil gosta de vender samba pra gringo mas não se assume e bate no peito enaltecendo os grandes mestres de verdade na grande mídia, não mandam nem um salve. O resto dos gêneros também funcionam bem em uma determinada época do ano depois somem. O rap ta aí mano, sem cantores milionários, mas com passos sólidos há quase 30 anos. Vivão e vivendo, rindo e chorando, sofremos mas resistimos. Não vou dizer que é o nosso momento agora, mas conseguimos sim coisas importantes e dentro disso é natural que alguns olhos se voltem para nossa cultura. Se você acompanha o prêmio Multishow, todas as trilhas de fundo, ou quase todas, eram rap, batidas pesadas. Mas o rap mesmo cadê? Fica esse negócio meio esquisito, pra mim é tipo o prêmio da música brasileira homenagear dona Ivone Lara, acho do caralho, muito obrigado pela iniciativa, mas poderíamos nos esforçar para fazer com que artistas do porte dela trabalhassem o resto do ano também. Não que fossem citados e esquecidos nos outros 364 dias. Precisamos que isso aconteça também, Oswaldinho da Cuíca fez 70 anos lançou um puta disco e parece que a única coisa que nossa música tem são boy bands com roupas coloridas. Com todo respeito à mulecada mas nossa música tem isso e aquilo também. Acho um bom momento. Pé no chão e mente aberta nos farão tornar isto constante, cada vez mais frequente. A cara dos caras é arriscar no que não foi feito ainda, nossa cara é ter postura e ser coeso para não sermos ridicularizados e desaparecermos como tantos outros artistas que já bateram no peito e disseram “este é o nosso momento”.
Rincon Sapiência entrou pro Midas. Ainda em cima do lance da independência, o que tu achou da contratação?
Achei do caralho. Rincon é nosso artista mais sólido, inteligente, com postura e história para nos representar seja onde for. Músicas boas, mente aberta, brasileiro pra caralho, guerreiro. Num vô ficar elogiando muito porque agora vão chover elogios e terceiras intenções para o lado dele. Mas eu acho uma puta iniciativa da hora do Rick Bonadio assinar com um artista tipo ele, tô ansioso pra ouvir e é uma ansiedade boa, de muleque. Adoro essa sensação, já perguntei pra ele umas 3 vezes quando o disco sai. A independência é um caminho, mas as parcerias também são, os contratos também são. E vamos pensar no produto final, a música. É nela que temos que pensar, falamos muito de mercado e pouco da música. Queremos música boa da nossa gente no rádio, na TV, nos shows, etc. Ficar olhando pro umbigo e dizendo que ninguém te quer porque você é isso ou aquilo é fácil. Achei uma iniciativa corajosa de ambas as partes, pois mesmo o Bonadio sendo quem é, o mercado é engessado pra caralho e houveram barreiras, mesmo o Rincon sendo foda e consistente tem pessoas que vão falar sem ouvir nada. Mas é isso né? Tem quem fala e quem faz, se ninguém fizer nada os faladores vão ter que procurar outra ocupação e nós temos que cuidar até disso hoje em dia.
Fotos: Rafa Rocha