Entrevista | Glue Trip abraça o Brasil no disco “Nada Tropical”

12/08/2022

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Gabriela Amorim

Por: Gabriela Amorim

Fotos: Bel Gandolfo/Divulgação

12/08/2022

Quando Lucas Moura, 34, líder da banda Glue Trip, respondeu um fã dizendo que escutava Gilberto Gil, Marcos Valle, Azymuth, Cátia França e outros grandes artistas nacionais, o músico e produtor se deparou com uma certa estranheza do ouvinte. “Ele ficou meio ‘como assim?’, o cara jurava que eu ia falar os obscuros do indie”, diz o paraibano fundador do grupo que existe há quase 10 anos.

Este foi um dos momentos em que Moura notou que era hora de tornar o Glue Trip mais abrasileirado, e isso não se deu pelas referências, mas pelo ponto mais simples e potente da comunicação: a língua. O disco mais recente da banda, divulgado no último dia 28, chamado Nada Tropical (2022), vem com uma ironia sutil no nome, junto de composições, feitas em sua maioria, em português. “Com esses tempos caóticos que vivemos no Brasil, era o momento de nos identificar mais com nossas raízes. Ainda tinha estranheza do público quando descobria que nós éramos uma banda brasileira, e eu só queria deixar mais evidente a nossa identidade e semelhança com o público”.

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Lucas Moura, líder da banda Glue Trip. (Foto: Bel Gandolfo/Divulgação)

O músico pessoense idealizou o projeto musical em 2012, quando ainda trabalhava com publicidade, no intuito de ter um hobbie através do qual pudesse promover experimentações por meio da psicodelia. Moura, que estava na emoção por novas descobertas, encontrou assim uma futura profissão. “Fiquei na publicidade, até 2015, e, desse ano para cá, comecei a me dedicar 100% à música e à Glue Trip”.

Hoje, formada por quatro integrantes, a Glue Trip reconhece que algumas etapas em sua história contaram, sim, com a sorte do destino. Dividindo inicialmente a banda em dupla com Felipe Augusto, presente na formação até o segundo álbum, Moura conta que, depois, teve um feliz encontro com o artista João Boaventura, integrante da banda gaúcha Catavento, em um show na cidade de João Pessoa (PB). “Quando encontrei com o João, foi uma conexão direta, porque ele gostava muito de música brasileira, de vinil. É um cara que eu consegui trocar muita ideia”, assume.

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A chegada dos outros dois integrantes trilhou um caminho mais natural, quando Moura se deparou com Pedro Lacerda tocando em um show: “Quando ele começou a tocar eu fiquei meio besta assim, fiquei meio chocado”. O convite para fazer parte da banda não demorou para chegar para o paulistano, que logo se estendeu com um aceno destinado para Thiago Leal, que hoje está na função de baixista do grupo.

“O único Brasil possível é o musical”, canta Moura, na faixa que dá nome ao disco. A música, que conta com um baixo suingado, também traz instrumentos de sopro, enquanto a letra ruma para uma certa esperança no dia depois de amanhã. Essa nova disposição levou para o álbum ondas sonoras que ainda não tinham sido desbravadas pela banda.

Com uma pegada tropical mais evidente, sem deixar de lado a identidade original da psicodelia indie rock, o grupo de raízes paraibanas traz nove faixas muito bem estruturadas, com produção musical assinada pelo produtor musical, arranjador e multi-instrumentista Zé Nigro, que já trabalhou com nomes como Curumin, Russo Passapusso, Anelis Assumpção e Francisco, el Hombre.

“Trabalhar com o Zé foi maravilhoso, ele não tem um distanciamento que muitos produtores acabam tendo, ele foi um cara que abraçou o Nada Tropical (2022). Desde o começo, das demos até a masterização, o cara estava lá em todos os momentos. Para além de deixar [o disco] com a nossa cara, mas também deixar o gostinho dele, o que é muito importante”, diz o vocalista da banda.

As referências para o álbum começaram quando o grupo definiu um tema para o projeto: “Brasil dos anos 70”. Com as noites de vinil a dentro, e tudo quase sempre acabando com músicas do Marcos Valle – sim, assim como diz a letra da faixa “Marcos Valle” -, os amigos passaram por um repertório grande de artistas e acabaram esbarrando em um grande clássico, o álbum Transa (1972), de Caetano Veloso, que está completando 50 anos neste ano.

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Contendo percussão, piano elétrico, sintetizadores analógicos e outros elementos que enriqueceram o disco com timbres vintage, pensar em um time de convidados externos foi algo que não pôde ser deixado de lado. “Queria que esse disco tivesse a banda ensaiada, todos entrando em estúdio, com a produção musical, com alguém para mixar e masterizar, além das participações. Eu queria que fosse um discão”, revela Moura. O álbum apresenta participações do maestro Arthur Verocai, que adicionou drama e uma atmosfera de fantasia à faixa “Lazy Days“, os cantores pernambucanos Otto e Felipe S, e a cantora paulista YMA.

O contato com Verocai foi um dos mais significativos, quando o maestro orquestrou mais 12 músicos para a concepção da faixa, além de realizar os arranjos de corda. Em convite despretensioso por e-mail, o músico apresentou o trabalho da banda e não contava que aceitaria um sim como resposta. Em viagem para o Rio de Janeiro, ao lado do produtor, Moura pôde ver a explosão do caldeirão de referências do carioca se harmonizando com a atmosfera da Glue Trip.

Seguindo a tradição de capas psicodélicas anteriores da Glue Trip, todas criadas por Bruno Borges, a ilustração de Nada Tropical (2022) não poderia ter sido distinta. Com afinidade pelo trabalho do ilustrador, o músico assume que a arte em nenhum momento foi alterada e explica como é o processo de criação com o artista: ” A primeira coisa é a escuta do disco, depois o envio umas referências e, por fim, uma conversa franca. Uma das referência para a capa do Nada Tropical foi a contracapa do disco Quem Sabe Sabe Quem Não Sabe Não Precisa Saber (1974) de Zé Rodrix e a Agência de Mágicos. Passei outras referências também, falo sobre os sentimentos que afloraram durante a gravação e ele [Bruno Borges] sempre estatela nossas mentes na entrega”.  

Tendo aberto a temporada de turnês na primeira quinta-feira do mês, no recém aberto Cineclube Cortina (Rua Araújo, 62, República, São Paulo), o grupo confirma apresentação no dia 25 de agosto, no Studio SP (Rua Augusta, 591, Augusta, São Paulo). Os ingressos estão sendo vendidos pelo site oficial da Eventim, pelo valor de R$ 30,00.

Os quatro integrantes também irão apresentar, a partir de setembro, a primeira tour pela Europa. Sendo breve, mas intensa, a banda anuncia 25 datas de shows, que começam pela França, passam pelo Reino Unido, Alemanha e Itália. “Vai ser o primeiro contato ao vivo com um público que só nos conhece pelos clipes e músicas, e isso é muito massa.”, finaliza Moura.

https://open.spotify.com/album/1EboAICOrhUiIE9Vz1OfPn?si=0ow1hWLBTZ2ltEsdvBNjFQ

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12/08/2022

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