Black Alien: É tempo de comemorar

10/09/2014

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Lidy Araujo

Por: Lidy Araujo

Fotos:

10/09/2014

A noite desta quinta, 11, ficou marcada na carreira de Black Alien. Foi quando ele subiu no palco do Cine Joia, em São Paulo, para comemorar os 10 anos de Babylon by Gus – Vol. I: O Ano do Macaco, considerado um dos melhores álbuns de rap já lançados no Brasil. E o show não poderia ter acontecido num melhor momento. Veja as fotos do show clicando aqui.

O rapper acaba de voltar de um período em que ficou afastado dos palcos, cuidando da saúde e preparando o lançamento do aguardado “Babylon by Gus – Vol. I: No Princípio Era o Verbo”. Boa parte do álbum foi composta no litoral paulista, onde Black Alien passou uma temporada, na companhia apenas da família, do seu sócio e empresário Leo Motta e do produtor musical Alexandre Basa, que também assina com ele o primeiro volume. “Fiquei mais perto da natureza, em contato com o mar, dei umas voltas de skate, e nessas, a gente gravou quatro faixas que estão prontas”, conta.

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O próprio rapper admite que dá um frio na barriga lançar o sucessor de seu único e aclamado disco solo. Ao mesmo tempo, comemora o resultado do financiamento coletivo realizado no Catarse, que viabilizou o segundo volume de “Babylon by Gus” e já prepara o terceiro álbum.

“O crowdfunding rendeu o volume 2. Na sequência vou realizar também um projeto de reggae que será gravado na Jamaica. A gente pretende ir em março do ano que vem pra lá”, conta, emocionado com o apoio que recebe dos fãs. “Agradeço a Deus todos os dias por ter esse carinho, por ter conseguido um público, que não é grande, mas é um público que me segue, se preocupa comigo, tem um grande carinho por mim, me manda presente. É um privilégio. Sem ele não sou ninguém. Agradeço a Deus também o privilégio de me manter relevante durante tanto tempo, num mercado queonde há um entra e sai de artista. Os artistas chegam, ficam um pouquinho e vão embora. Eu estou aí há 20 anos, conseguindo viver a minha vida só com música.”

Ouça Black Alien ao vivo, com DJ Negralha, no Ballroom (Rio), em 2002

E olha que falamos de duas décadas que, segundo ele, não foram fáceis pro rap brasileiro. “As pessoas vêm reclamar comigo que está ruim, mas elas não estavam aqui desde os anos 90, como eu, o Thaíde, o DJ Hum…”, comenta. “Desde aquela época, muita coisa mudou, e o que eu percebo é que se, até cinco anos atras, eu ficasse ouvindo rap em casa, de 20 discos, 18 seriam gringos. Hoje, quando eu paro pra ouvir, dos 20, uns 15 são de rap nacional. A fase é ótima.”

Nos últimos tempos, Black Alien também voltou a ensaiar o show, especialmente este, do Cine Joia. “Vai ser um pouco diferente, porque vamos tocar o disco na íntegra, e tem músicas que eu nunca toco no show”, conta. “Além disso, vai ser todo tocado na ordem, as 12 faixas, com uma pausa no final. Aí, eu canto duas novas, que são ‘Somos o Mundo’ e ‘Terra’. Tem também releituras de músicas antigas, além de ‘Homem da Família’, ‘Identidade’ e ‘Um Bom Lugar’, do Sabotage. Vou deixar a voz dele rolando, aí o público canta junto, depois tem a minha parte, que eu canto ao vivo. São coisas que raramente faço.”

Ouça o disco:

As gravações do álbum, aliás, guardam boas lembranças. “Eu olho pra cara do Basa e lembro dos dias que a gente passou junto num apartamento. O disco foi escrito e gravado em 45 dias, e foi uma correria, 10 anos atrás”, conta Black Alien. “A gente ficava muito feliz com as músicas no estúdio. Hoje em dia, a gente fica feliz também, mas não sei se é porque estamos mais velhos, mas acaba sendo diferente. Naquela época, a gente se abraçava no estúdio a cada música que terminava, mas acho que foi porque o disco rolou num momento cósmico. Ele acabou sendo um disco que tem uma certa mágica. Eu paro pra escutar e fico impressionado em como o disco rola fácil da primeira à última faixa. Não é um disco grande, tem menos de 50 minutos, e ele é atual até hoje.”

Black Alien aproveita pra ressaltar um fator que, pra ele, é fundamental na concepção de um disco: ter o que dizer. “Na época do ‘Ano do Macaco’, eu era 10 anos mais jovem, tinha muita coisa pra dizer, porque não tinha um disco solo ainda. Resolvi fazer um disco em que só eu falava, sem participações especiais no vocal. Foi muito bom. Nesses 10 anos, não fiquei parado, eu trabalhei pra novela, teatro infantil, fui diretor musical, fiz músicas específicas pra filmes, músicas que o cara encomenda do jeito que ele quer, e é muito interessante trabalhar a ideia de outra pessoa, é um exercício do caralho. Mas em relação ao meu trabalho pessoal, eu não tinha muita coisa pra falar, não.”

Só que, com o tempo, ideias foram surgindo e ele percebeu que os cadernos de anotações estavam ficando empilhados. “Essa é a fase em que o artista tem que expelir o que ele está sentindo na alma. Fui vendo muita coisa acontecer, inclusive muitas ideias parecidas com as minhas. Não que eu tenha deixado vazar ou que tenham me copiado, mas é que a arte funciona assim, às vezes um cara tem a mesma ideia que você do outro lado do mundo, e a ideia é uma frequência, quem pegar pegou. E você tem que entrar nessa frequência. Aí, chegou a hora de lançar um novo disco, porque eu já tinha material e tinha que falar algumas coisas. Por exemplo, política me incomoda demais, o funk ostentação me incomoda extremamente. Porque o cara vir falar que ostentação não é problema, é solução, é um desserviço pra juventude brasileira. Me sinto no dever, como artista, de ajudar a sociedade e, no meu caso, eu miro mais no jovem e nas crianças, porque se eu conseguir pegá-los antes de eles serem poluídos por certas ideias, eu acho que posso ajudar a mudar o adulto que ele vai ser.”

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E é justamente por isso que Black Alien não abre mão de certas regras em sua própria carreira. “Não costumo falar palavrão, no meu disco não tem palavrão. Dizem que é o único no Brasil não-evangélico que não tem palavrão. Coloco crianças e mulheres sempre em primeiro lugar. Tenho uma música que chama ‘Mulheres e Crianças Primeiro’. Nos meus shows, a gente sempre pede pra ter papel no banheiro feminino, pra não vender álcool em garrafa e pra começar cedo. Além disso, nunca termino com música agressiva, mas com música de amor, pro jovem não sair do show inflamado e querer causar, porque o rap é uma música agressiva por natureza, e se ele sair inflamado do show, pode arrumar confusão na rua. Eu sempre falo de amor, o que faz ter mais meninas no baile, e a molecada briga menos. Depois que eu escrevi minha primeira música de amor, em 2004, eu só tive uma ou duas brigas no meu show. Antes, na terceira música, a porrada já comia. Era só música de ataque, e resolvi mudar isso.”

A positividade que Black Alien transmite, hoje também invade sua vida pessoal. Recém-instalado em sua nova casa, no interior de São Paulo, ele se prepara pra trazer, do Rio de Janeiro, sua coleção de LPs. Com cerca de 1.200 discos, ela começou a ser montada quando ele ainda era garoto e gastava o dinheiro do lanche em discos. “Meus pais passaram a me dar, no domingo, o dinheiro da semana inteira. Na segunda, eu gastava tudo em vinil e tinha que me virar nos 30 no colégio. Passava fome”, lembra.“Dava meu jeito, até o dia em que o bicho pegou de fome, e eu liguei pra minha mãe dizendo que estava sem dinheiro pro lanche. Ela perguntou o que eu tinha feito, e eu falei: comprei disco. E ela falou: então come o disco.”

Da coleção, ainda fazem parte os álbuns que herdou do pai, que inclui Sérgio Mendes, Dom Salvador & Abolição e Wilson Simonal. A maior parte, porém, acredite, é formada por discos de rock e jazz. “Tem muito tempo que não ouço os meus discos, e eu sou apaixonado por eles”, confessa, citando Miles Davis, Nina Simone, Oscar Peterson, AC/DC, Led Zeppelin, The Smiths, The Cult e Ramones entre os artistas que mais sente falta de ouvir em bolachão.

Fotos: Vinicius Branca

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10/09/2014

Lidy Araujo é uma grande mulher. Porém, louca.
Lidy Araujo

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