Entrevista | Thiago Nassif espatifa equações no disco “Mente”

16/12/2020

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Brenda Vidal

Por: Brenda Vidal

Fotos: Divulgação

16/12/2020

Um exercício de transmutação no ato. Um artrópode trocando de pele em frente a uma plateia. Num processo de retroalimentação dos aspectos visuais daquilo que é sonoro, Thiago Nassif se descama e expõe a pele nova no disco Mente, terceiro álbum da carreira lançado em julho e um dos melhores registros da música brasileira em 2020.

“Incapsulável” em seu próprio título, visto que o termo Mente foi escolhido pela dualidade de poder comunicar tanto aquele que mente quanto a mente no sentido da parte incorpórea dos seres humanos, o álbum é denso, refratário ao mesmo tempo que maleável, e extremamente transparente; revela seu conteúdo como um copo de vidro, mas também o distorce como o reflexo de um espelho.

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Com produção de Thiago e co-produção de Arto Lindsay, o álbum conta ainda com uma série de participações escolhidas a dedo: Vinicius Cantuária, Gabriela Riley, Ana Frango Elétrico, Negro Léo, Laura Wrona, Jonas Sá, Donatinho e Vitor Araújo integram a trama de timbragens ruidosas, trançadas entre o sintético e o orgânico. A NOIZE conversou com Thiago Nassif por e-mail e bateu um papo com o artista sobre o processo de gestação do disco, a inspiração a partir de materiais não sonoros, música experimental, entre outros assuntos. Coloque o álbum para tocar enquanto acessa as outras camadas de Mente através da entrevista abaixo:

Thiago, Mente não parece conjunto de faixas aleatórias e não é um disco à toa. Durante quanto tempo o álbum foi gestado e a partir de quais investigações sonoras e líricas ele foi tomando corpo? 
A gestação de algo é sempre um momento crítico , pois não sabemos o que se dará daquele corpo em formação. Comecei o processo de gestação do Mente assim que acabei de lançar o meu outro disco Três; diríamos que o Três foi a transa que inseminou este outro gesto, isso em meados de 2016. O DNA do Três foi transmitido para a genética do Mente, isso de que forma: Três é quase que uma mãe silenciosa que passa para Mente o potencial da timbragem ouriçada e do corpo agitado dançante, o qual ela não trabalhou com muito afinco em sua formação. Mente é o espelho inverso daquela Três.

Li em uma bio sua para o festival Novas Frequências que, em sua pesquisa musical, você busca investigar os aspectos e sensações visuais dos sons. O elemento plástico foi um disparador para a sonoridade de Mente? Que materiais não sonoros te instigaram na produção do disco? 
O Plástico é Plutônico, vem do petróleo, o sangue da terra; o mental é Mercúrio, tudo que envolve nossa mente nos dá algum tipo de prazer. O Plástico sempre me envolveu, eu me enrolo em suas texturas. O Mercúrio é a ligação entre o Céu e a Terra, ele é o eixo transversal, enquanto que Plutão é a profundeza, ou seja, tudo que está abaixo do campo da percepção, as vísceras de algo, o invisível, o obscuro. Minha obra foi inspirada por esses eixos.

Como foi o processo de produção? Qual o eixo que torna essa criação fragmentada em algo ainda sim coeso? 
A fragmentação é coesa, algo pode parecer fragmentado e desconectado para alguns e fazer total sentido para outros. Eu sempre trabalhei com colagens e livre associações, eu vejo sentido nestas aproximações porque meu olhar tem a tendência de enxergar o conjunto do que foi criado e os rearranjos necessários para dar harmonia àquilo. Isso tem muito a ver com a produção musical em algum sentido, acredito que Arto Lindsay, o co-produtor do disco, tenha essa mesma percepção de também conseguir unir fragmentos

E como você encara a categoria “música experimental”? Se encaixa nela? Por quê?
Acho fraco o título, tudo é experimentalismo em termos de música. Ele atravessa todos os gêneros, todo tipo de invenção. Em meu outro disco Práxis (2011), brinco um pouco com este termo, pois o aprender vem do experimentar. É uma palavra com origem no termo em grego que significa conduta ou ação. Corresponde a uma atividade prática em oposição à teoria. Música é corpo e cria transes corporais, e essa tecnologia vem sendo aprimorada a séculos por etnias em torno do mundo. Quando uma terminologia é aplicada a algo,  parece que o corpo daquilo é tirado de cena e fica apenas o racional… pelo o mesmo motivo, ironizo isso tudo com o título Mente.

Em algumas resenhas, estava dito que você afirmou querer abrir mão inclusive da necessidade de satisfação ou de agrado ao público na hora de construir o disco. Como você gostaria que o ouvinte saísse após uma primeira escuta em Mente
Não penso que abri mão, pois fui profundo no que eu acredito e pesquiso musicalmente em termos do que eu gosto para criar o disco, e quando fazemos para nós algo com afinco, com certeza aquilo de alguma forma ressoa com a percepção do outro. Fiz outros discos autocentrado ao ponto de tirar o público da equação, mas neste, pelo contrário, me dediquei para ser abrangente. Espero que as pessoas ouçam e dancem, apenas isso!

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16/12/2020

Brenda Vidal

Brenda Vidal