Exclusivo | O diário de viagem do BaianaSystem pela Europa

25/07/2019

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Brenda Vidal

Por: Brenda Vidal

Fotos: Divulgação/ Filipe Cartaxo

25/07/2019

O BaianaSystem atravessou o Oceano Atlântico – águas tão cheias de histórias e memórias íntimas ao Brasil – para navegar em com a tour “Sulamericano” pelo continente Europeu, baseado em seu álbum mais recente, O Futuro Não Demora (2019) .

Além de momentos inesquecíveis no palco, a viagem foi carregada de encontros, reencontros, reflexões, reafirmações e descobertas. Com toda essa bagagem, Roberto Barreto, guitarrista do grupo, decidiu transformar tantos sentimentos e pensamentos em um “diário de viagem” acompanhado de fotos de Filipe Cartaxo, e que você pode conferir abaixo, com exclusividade para a NOIZE. Bote O Futuro Não Demora pra tocar, desça a página e embarque nessa trip:

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BaianaSystem

Sulamericano Show na Europa

Ao longo do processo de construção do álbum O futuro não demora, bem como após seu lançamento, temos aos poucos entendido os caminhos e nuances dessa relação com o tempo. Em julho de 2018, estávamos com a pré-produção do disco toda pronta e nos preparando para retomar as viagens para os shows e festivais que acontecem no verão do hemisfério norte, algo que foi muito presente nos primeiros anos do BaianaSystem e que agora voltava de forma mais efetiva. Naquele momento, dois países que ainda não tínhamos tocado estavam no roteiro e surpreendentemente tinham muito a ver com o contexto do disco: Portugal e Inglaterra.

Portugal, por toda sua ligação com nossa história, o entendimento das navegações, das rotas da escravidão e formação do nosso povo e com ligação direta com Itaparica, Recôncavo Baiano e Salvador.

Inglaterra, trazia toda a referência e importância para a consolidação do reggae mundialmente com uma história muito parecida de ligação com suas colônias tendo a Jamaica como protagonista. Ficamos em Brixton, bairro de imigrantes jamaicanos e íamos nos encontrar com o incrível Adrian Sherwood, produtor de Dub que naquele momento produzia os discos das lendas Lee Scratch Perry e Horacy Andy. Com ele, pensamos fazer “Navio”, uma faixa carregada dessa aura de história, navegação e escravidão e que seria um “samba reggae dub”!!

Um ano após essa viagem e com o disco lançado em fevereiro, voltamos agora já com o “Sulamericano Show” para esses mesmos dois países, só que agora acrescentando um ponto fundamental nesse roteiro: Barcelona. Lá, íamos, talvez, encontrar finalmente Manu Chao, que em 2018 quase chegou para o show de Londres, se tornou parceiro na faixa que acabou dando nome à turnê e que até então nunca tínhamos visto ou falado. Só a música conduziu essa relação e ele sempre foi uma grande referência para falar de latinidade, de imigração, pirataria, fronteiras e as relações presentes nessas trocas.

Barcelona foi logo o primeiro show, na conhecida casa Apolo, perto das ramblas, e já na passagem de som tivemos a surpresa. Lá estava Mano para participar e cantar pela primeira vez junto “Sulamericano”, de forma bem aberta no melhor estilo soundsystem. Além disso a noite ainda teve a presença de ninguém menos que Black Alien, fazendo ao lado de Dj Castro o show do seu novo e incrível disco Abaixo de zero: hello hell (2019). Casa abaixo com todos cantando juntos a volta de um dos mais importantes rappers brasileiros. Black Alien e Manu Chao nesse primeiro show deram um novo significado para “o futuro não demora” e uma vibe muito especial tomou conta no ar naquela noite.

De Barcelona, seguimos para Londres onde, novamente, faríamos um show com Black Alien numa casa recém-inaugurada com nome bem sugestivo: Earth!! Voltamos para Brixton e a primeira loja de discos jamaicana que entramos vimos o cartaz de lançamento: Rainford (2019) Lee Scratch Perry, produzido por Adrian Sherwood. Tudo fez sentido. Nos demos conta que estávamos no mesmo lugar onde assistimos há um ano uma passeata de imigrantes jamaicanos reivindicando seus direitos à cidadania britânica que, naquele momento, estava sendo questionada pelo governo, jogando fora a história de uma geração que, desde os anos 60, veio da Jamaica em navios de imigrantes.

Mais uma noite incrível de dobradinha com Black Alien, casa cheia de brasileiros e alguns londrinos que também puderam conferir a performance do soundsystem Mungo’s Hi-fi, que trouxe para nós a surpresa de Eva Lazarus, cantora de Brixton que lançou com eles o álbum More Fyah! (2019).

De Londres, a rota final era por Portugal, nossos colonizadores, onde mais uma vez percebemos a grande presença de brasileiros trabalhando por toda parte, em uma nova rota de imigração, agora em sentido inverso. Apesar da familiaridade que a língua traz, a ideia de “forasteiros” se faz sentir em muitos momentos e ficou claro como essa questão dos movimentos de pessoas e as novas fronteiras têm sido uma grande questão no nosso tempo. O show foi no Superbock-Superrock, dando sequência ao circuito de festivais que tínhamos feito no ano anterior com Mimo e Sinnes, porém agora mais próximo de Lisboa e num circuito mais pop.

De Portugal, agora o caminho era a volta direto pro Brasil e imediatamente nos voltou a lembrança do primeiro show em Barcelona e da força que teve o encontro com Mano Chao. O sentimento de Sulamericano se fez ainda mais forte, completou o sentido, reforçou nosso entendimento como nordestinos. Passado, presente e futuro se alternam como rotas que se cruzam num mapa e podemos agradecer por ter a arte como guia dessa aventura.

Roberto Barreto

Julho de 2019

25/07/2019

Brenda Vidal

Brenda Vidal