Não é de hoje que a NOIZE acompanha o trabalho da banda paulista Molodoys. Lá em 2014, já estávamos atentos ao seu EP de estreia, Metamorphic Fragments, feito na época em que as composições eram todas em inglês. No ano seguinte, o grupo participou da coletânea Neo-Psicodelia Brasileira, do selo Ministério da Contracultura, e lançou os singles “Blues do Cangaço” e “Ácido”.
Essas duas músicas foram os primeiros acordes que ouvimos do disco de estreia do Molodoys, Tropicaos, que está sendo lançado oficialmente hoje e já está disponível para download gratuito aqui (ouça abaixo). “Pra banda é um grande passo, talvez um dos mais importante por ser o álbum de estreia. Vai ser a conclusão de um ciclo que se iniciou lá no começo de 2015 quando lançamos ‘Blues do Cangaço’. Estamos bastante animados e ansiosos pra ver como o disco vai repercutir”, diz o vocalista e guitarrista Leonardo Fazio.
Tropicaos foi produzido pelo próprio Molodoys e, dentre suas 12 faixas, estão gravações feitas com apoio do projetos Converse Rubber Tracks e Original’s Studio, da Levi’s. Encarnando a essência tropicaótica do álbum, a banda chamou vários músicos para fazer o que quisessem no disco, como explica a baixista Camilla Merlot.
– Propusemos uma espécie de “intervenção” de cada um em musicas especificas, algo bem aberto, para que eles pudessem ser livres para criar, com exceção da participação do rapper Edgar (da banda Arara Saudita), que foi a encorporação da personagem “Formiga” dentro da história contada pela música “Uirapuru”. Também participaram Tomás Oliveira (Mustache e Os Apaches, Sexy Grove), gravando taças de cristal em “Uirapurú”, Eduardo Kolodoy (Orquestra Abstrata) gravou a segunda guitarra em “Hora do Chá” e Marcel Willow (Nuvem Leopardo) contribuiu com guitarras e modulações em “Dois Mil e Dez”. Por fim, a masterização ficou por conta do nosso grande amigo Humberto “RMNY” Fernandes, que também trabalha como produtor musical e é especialista em Mutantes nas horas vagas.
Tendo sido feito por tantas mãos, Tropicaos é um disco que cumpre a promessa do seu nome. Sua faixa-título, apesar de ser instrumental, tem um quê de manifesto artístico, onde o que está em pauta é a busca por um som que condense a tensão e o êxtase da experiência cotidiana de quem vive nas cidades brasileiras. O stress do trânsito, a explosão hormonal dos bailes funk, o melhor e o pior do caos se misturam na faixa que dá nome ao álbum.
“É definitivamente um disco sobre o nosso tempo. As composições tem uma ligação direta com as nossas experiências, com o que a gente vê e vivencia no dia-a-dia nesse contexto distópico em que estamos inseridos”, explica Leonardo, que segue: “É um disco sobre o nosso solo, sobre nossas angústias, nossas gaiolas e abismos, sobre nós e nossa cultura sobrevivendo em meio ao caos do mundo pós-moderno. É sobre aqui e agora, e às vezes até sobre um futuro, se houver”.
– Toda base do disco foi erguida sobre referências nacionais. Logo após lançarmos nosso EP entramos em uma vibe sobre o aqui e o agora, sobre olhar para o nosso redor e não ignorá-lo. Certamente a influência externa diante de todo esse Caos político-social influenciou essa mudança de perspectiva. Partimos daí para uma viagem ainda mais intensa em relação ao histórico cultural de nosso país e nos apaixonamos totalmente. Lançamos “Blues do Cangaço” como single em Junho de 2015, e não estava muito claro pra nós como as coisas seriam dali em diante em relação ao alcance da nossa música. Acabou que o single teve uma repercussão bem legal, chegou até a ser compartilhada na página oficial d’Os Mutantes pelo próprio Sergio Dias, que entrou em contato com o Léo porque tinha curtido a voz dele. Os dois chegaram até a conversar por skype algumas vezes, o Sergio foi bem simpático e atencioso, deu algumas boas dicas de composição e chegou até a convidá-lo pra tocar em um show com Os Mutantes (que acabou não rolando, infelizmente). Isso tudo deu uma enorme confiança para seguirmos em frente com o que estávamos criando. Reunimos várias referências, que vão de Mutantes a Chico Science, Villa-Lobos, Funk Carioca, trocadilhos com Álvares de Azevedo e ao nosso folclore, rs. Acabamos por tentar mesclar essas referências históricas/culturais com texturas contemporâneas tiradas de nossas experiências de resistência em uma metrópole como São Paulo. Mas como bons filhos da globalização, usamos ainda muito das referências internacionais que fazem parte de nossa base musical, como o Rain Dogs do Tom Waits e The Piper at The Gates Of Dawn do Pink Floyd, juntamente a novas referências como a neo-psicodelia e até mesmo o Vaporwave (que é algo em que temos pirado bastante ultimamente) – explica Camilla.
E ao ouvir o disco fica claro que essa lista de referências é apenas um resumo. Nessa bagunça acalorada também tem espaço para ecos do punk rock do ABC paulista na faixa “Balada Para Os Peixes Abissais” e até mesmo uma citação literal de “Da ponte pra cá”, dos Racionais MC’s, em “Ácido”. É que nem aqueles restaurantes onde a pessoa serve sushi, feijão e lasanha no mesmo prato e fica uma delícia, sabe? Aquele caos gostoso do Brasil.