Faixa a faixa | Selton mergulha em seu novo disco: “Loreto Paradiso”

19/04/2016

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Ariel Fagundes

Por: Ariel Fagundes

Fotos: Chiara Mirelli/Divulgação

19/04/2016

Unindo na mesma panela os sabores hi-tech do rock europeu e os temperos aveludados da música brasileira, o disco novo da Selton retrata o cotidiano intercontinental da banda. Loreto Paradiso foi gravado no Brasil, Itália e Inglaterra e, agora, o grupo está no seu país de origem divulgando o álbum.

Amanhã, eles tocam no Theatro S. Pedro, na sua cidade natal, Porto Alegre, e, dia 22 de abril, no SESC Araraquara, no interior paulista. Ramiro Levy, um dos membros multi-instrumentistas da Selton, comentou com exclusividade à NOIZE cada uma das faixas do seu novo disco.

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Para entender Loreto Paradiso do início ao fim, é só descer a página.

“Loreto Paradiso”
Talvez seja a música que mais represente o novo momento da banda. A estética frenética, a colagem, a mistura de línguas e a ousadia no arranjo são elementos centrais nesse álbum. O riff de guitarra, que parece ter influência direta da música africana, foi na verdade concebido em uma casa no meio da neve, em Lauzanne, na Suíça. A parte em português da estrofe foi escrita em Florianópolis, a parte em inglês em Londres. O hook “a minha vida”, por sua vez, nasceu na sala da Casa Selton, aqui em Milão. Essa espécie de colcha de retalhos intercontinental foi bem recorrente ao longo do processo do disco, e provavelmente essa seja a música na qual isso é mais evidente.

“Cemitério de Elefante”
São raros, mas também muito especiais os momentos da nossa vida em que conseguimos ter uma visão panorâmica das coisas. “Cemitério de Elefante” tenta traduzir essa sensação através de imagens fortes e de reflexões a respeito das nossas expectativas e escolhas de vida. Uma particularidade sobre a gravação do refrão da música é que tocamos ele de duas maneiras diferentes, e depois juntamos tudo. Escutando atentamente nos fones, é como se do lado esquerdo se ouvisse uma banda tocando, e do lado direito outra.

“Be My Life”
Mais um exemplo de criação conjunta intercontinental dentro do disco. A estrofe nasceu bossa nova na sacada de uma casa de praia no litoral sul do Brasil. Já o refrão foi escrito pelo baterista em cima de um skate andando pelas ruas de Milão. De alguma maneira, o refrão era a conclusão perfeita para o que a estrofe vinha tentando dizer. Quando juntamos as peças nos demos conta que os dois estavam escrevendo a mesma música sem saber.

“Don’t Play with Macumba”
A ideia da música foi baseada em uma história real que aconteceu com uma amiga nossa. Ela fez uma macumba para conseguir trabalho, e no início tudo parecia funcionar. Quando, de repente, tudo começou a dar errado, ela nos confessou que não tinha terminado a simpatia. Foi então que surgiu a frase “don’t play with macumba”. Gostamos tanto dela que de um jeito ou de outro sabíamos que acabaria virando música.

“Junto Separado”
Houve um período, quando ainda morávamos em Barcelona, no qual passamos a vir cada vez com mais frequência a Milão para gravar o nosso primeiro disco. Em uma dessas vindas, o Daniel e o Ricardo tiveram problemas com o visto e não podiam mais voltar para Barcelona. Enquanto eu e o Eduardo voltámos para lá e continuávamos a nossa vida hippie barcelonesa, Ricardo e Daniel viveram o período que gostamos de chamar de “exílio”. Eles prometeram não cortar nenhum pêlo do corpo enquanto não obtivessem a permissão para voltar para Barcelona. E foi assim, exilados e cabeludos, juntos porém separados, que a música foi escrita.

“Duty Free Romance”
É uma história de amor resumida no tempo de pegar um vôo de conexão em um aeroporto. A expressão “duty free” dá a ideia de que uma relação pode significar algo que vai além de um lugar e dura no tempo, só um sentimento, sem “impostos”. A mistura do beat hip hop com o pandeiro e o violão acabaram dando a atmosfera que buscávamos para a música.

“Up to Me”
A música fala basicamente sobre aceitar o próprio crescimento e fazer o seu caminho. Buscando soluções para o arranjo dela, nos demos conta que a chave era misturar a essência Beatle da composição da música com elementos bem brasileiros. No caso da passagem “Tava no mato, do mato para Loreto, de Loreto para o palco, do palco pro mundo inteiro”, nos apropriamos de um canto popular afro-brasileiro para contar o nosso percurso de maneira irônica. Essa mistura entre o regional brasileiro e a composição “british” acabou virando a marca registrada da música.

“Qualcuno Mi Ascolta?”
A música fala basicamente sobre conversas vazias, sobre pessoas que perguntam sem nem escutar a resposta. Quando você é brasileiro e mora em um país estrangeiro, inevitavelmente vira alvo de perguntas bestas, fruto de uma imagem estereotipada do nosso país. “Mas vocês falam português ou ‘brasileiro’?”, “Vocês vão voltar para casa um dia, ou já se sentem milaneses?” e “Toca uma bossa?” são perguntas que respondemos em piloto automático.

“Feliz Ano Velho (Buoni Propositi)”
Todo fim de ano é a mesma coisa: fazemos as mesmas promessas que não vamos cumprir, e a sensação é a de que o ano se repete, caindo nos mesmos erros. “Feliz Ano Velho” é no fundo uma promessa a si mesmo de mudar esse mecanismo, sem entregar tudo nas mãos de uma estrela cadente. Na maior parte dos casos escrevemos as nossas músicas em uma língua e depois as traduzimos para outras para ver como soa, e para ter um ponto de vista diferente sobre elas. Nesse caso a música foi realmente escrita em português e italiano ao mesmo tempo, as frases vinham mesmo bem misturadas, cada uma em uma língua.

“Hokkaido Goodbye”
Hokkaido é uma ilha no Japão com paisagem extremamente mágica e melancólica. O conceito de ilha está muito presente nesse disco, e isso explica também a escolha do poema recitado no final da música. O texto foi extraído do livro Equador, do português Miguel Tavares Souza, e foi colocado ali pela sua sensibilidade e incrível capacidade de falar sobre a despedida, mas não só: ele afirma que, em alguns momentos, é como se houvessem dois tipos de seres humanos, os que vivem na ilha e os que chegam e partem.

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19/04/2016

Editor - Revista NOIZE // NOIZE Record Club // noize.com.br
Ariel Fagundes

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