Lenna Bahule conduz uma viagem transcendental às suas raízes

02/08/2016

Powered by WP Bannerize

Joana Barboza

Por: Joana Barboza

Fotos: Loop Discos

02/08/2016

O corpo e a voz usados como diversos instrumentos musicais para que juntos possam tocar as pessoas. Assim é a música de Lenna Bahule, a mensageira que conecta África e Brasil.

Lenna é filha de Maputo, capital de Moçambique. O país conhecido por sua abundância de recursos naturais e forte veia cultural, nos entregou essa taurina corajosa, que veio para São Paulo em 2012. Sorte a nossa!

*

Dona de uma voz, que consegue ser potente e suave ao mesmo tempo, ilumina a todos com seu talento. Chegou ao Brasil – trazida pela sua intuição – com uma mala cheia de sonhos, anseios e vontade, muita vontade. Foi especialmente devido à gana por realizações que lançou o primeiro disco da sua carreira solo, Nômade.

Como uma chef experiente de cozinha, Lenna se descreve. Através da mistura de ingredientes de sua origem africana com altas doses de brasilidade, polvilhada com sensibilidade e colheradas generosas de sonoridade obtemos essa delícia de música. Conversamos com a cantora sobre a sua trajetória, encontros cósmicos, improvisação e muito mais. Junte tudo e sirva a gosto!

Como aconteceu o seu primeiro contato com a música?
Meu pai sempre foi apreciador e colecionador de música e no final dos anos 80 foi DJ e engenheiro de som. Então, a casa onde morávamos era sempre muito bem preenchida musicalmente desde quando era criança.

Você frequentou uma escola de música desde muito cedo. Fez aulas de piano e depois já foi direto para os palcos. Como você enxerga essa transição entre o período de aprendizado e o fazer?
Sou uma pessoa do aprender fazendo. Minha vida e carreira em São Paulo são provas disso. Tudo o que aprendi tanto sobre ministrar oficinas, dar aula, subir no palco, gerir as finanças, aprendi vendo aquilo que não funciona, não funcionar. Então, fui testando até achar o que funciona para mim. E no fazer você interage com o que está vivo e presente, fazendo a experiência real e não teórica ou padronizada. É mais pessoal.

Você diz que saiu de Moçambique para explorar outras oportunidades como cantora e aprofundar sua criatividade. Você está conseguindo realizar esses objetivos que buscava quando saiu do seu país? Quais são os próximos?
Sim. O CD é uma prova viva disso. É extremamente difícil gravar um CD, ainda por cima sendo mulher, imigrante e artista independente. Próximos projetos: expandir, prosperar e contribuir para um mundo melhor [risos]

O seu projeto solo está cheio de composições suas, com diferentes sonoridades de diversas influências. O seu processo criativo ocorre de que maneira?
O meu processo criativo é cotidiano, trabalho com improvisação. Boa parte das músicas foram feitas desse jeito. No dia a dia, improvisando uma melodia enquanto cozinho ou durante uma caminhada, melodias que aparecem no meio do sono… Enfim, a minha vida se dá de uma forma criativa constante e assim é com a minha música.

Nômade exalta a África de maneira bastante plena, sem deixar de lado a globalização e as influências brasileiras. Como acontece essa mistura?
Hmm…sou taurina, então esta é a melhor perspectiva que consigo te dar no momento. Assim, pense que estás uma cozinha com vários ingredientes que tu gostas e que te possibilitem fazer várias comidas gostosas e diferentes. E tu estás empolgada com a ideia de fazê-los combinar de várias formas e ver o que vai dar. Algumas combinações já conheces e já sabes que o resultado é super, mas outras serão novidades de sabores e tu estás empolgada com essa surpresa. Tudo será feito do teu jeito único e de acordo com os teus desejos e inspirações gustativas para aquele dia. Uns pratos serão mais rápidos e simples enquanto outros serão caprichados, adornados e coloridos porém vão valer a pena pelo tempo dedicado. Então, tu vais testando e jogando na panela, na travessa, molda, prova, aumenta aqui, diminui ali, e voilá! Vários pratos diferentes inusitados inspirados no teu paladar daquele momento. Assim se fez o Nômade.

Em Nômade há muito da sua pesquisa sobre os diferentes caminhos do uso da voz como instrumento musical e de expressão. O que as pessoas podem esperar ao ouvi-lo?
Bom, acho que no mínimo o que descreveu. Tudo o que não for isso é de escuta e sensibilidade pessoal e particular de quem ouvir.

Há muitas participações no álbum. Como foi feita essa escolha?
O principal critério para a escolha das participações foi o encontro e a influência que esses artistas tiveram na minha trajetória.

As Clarianas são uma grande inspiração, como mulheres e pessoas protagonistas, na voz que levam em sua arte. A voz do povo, pelo teatro, pelo espaço que elas têm no Taboão da Serra, que é um lugar onde muitas vozes são ouvidas e ressoadas. Então tê-las no CD foi uma forma de, também, expandir onde mais essa voz poderia ressoar.

O Zé Leônidas é um amigo querido que conheci em Moçambique em um momento muito importante na minha caminhada. Além de ele ter uma criatividade incrível e uma voz que serena, representa a alegria dos encontros e que eles são sem fronteira.

A associação cultural HODI, é um grupo que faz um trabalho de difusão da cultura tradicional moçambicana. Eu queria registar essa pesquisa que também é minha.

O Sérgio Reze é um querido com quem tive a honra de cruzar pessoalmente, sendo que já admirava bastante a simplicidade e meticulosidade do seu tocar. Então foi um encontro de sincronicidade cósmica.

TChaka Waka Bantu é um poeta de língua bantu (changane, chope, ronga) de uma sensibilidade rara e inusitada. Que era o único que poderia por em palavras a emoção de estar fazendo esse CD.

Cheny Wa Gune é uma inspiração imensa por levar a música chope para o mundo de forma tão viva e comunicativa. Artista criativo com o qual me identifico muito, devido a sua trajetória artística.

Gumboot Dance Brasil minha África no Brasil. Faço parte do grupo e é através dele que me mantenho conectada à cultura local que é muito próxima.

Fernando Barba e Marcelo Pretto (Barbatuques) – Dois artistas que me inspiram sempre e que por essa inspiração me vi introduzida no universo da música corporal.

Sebastian Notini músico transcendental de criatividade e dos timbres.

Houve uma campanha de financiamento coletivo para fazer a prensagem do CD físico de Nômade que excedeu a meta. Como você se sente em perceber a força do coletivo e o reconhecimento das pessoas?
Super feliz! Realmente, é muito bom olhar para o agora e poder celebrar tudo o que foi vivido e trocado em algum nível com todas as pessoas cujos nossos caminhos se cruzaram. E também ver que o coletivo quando unido pode fazer as coisas acontecerem, é só querer… É bastante empoderador.

Tags:, , , , , , , , , , , , ,

02/08/2016

Joana Barboza

Joana Barboza