_por Nícolas Gambin
@nicolasgambin
Disco:
O Deus Que Devasta Mas Também Cura
Lucas Santtana já tem certa estrada: colaborou com Nação Zumbi, Caetano Veloso, Gilberto Gil e segue a lista. Em carreira solo, pontuou a cena atual, destacou-se por sua inventividade, arrancou bons ecos até na gringa e, aqui, foi aclamado como o melhor compositor de sua geração.
Com o iatrogênico título O Deus Que Devasta Mas Também Cura, o quinto trabalho do compositor baiano – sucessor do elogiado Sem Nostalgia (2009) – se torna mais um porquê de ele ter virado figura fácil ante a crítica e o público. Lucas encabeça, hoje, o front da boa nova música brasileira, junto de nomes que inclusive dão suas caras nas faixas do álbum, como Céu, Curumin, Guizado, Kassin, entre outros.
Mesmo com a melancolia oriunda de uma separação conjugal servindo como pano de fundo – na época em que compunha, Lucas Santtana passava por um conturbado divórcio, algo próximo ao que se transcorreu com o cantor Otto, em seu Certa Manhã Acordei De Sonhos Intranquilos (2009), e com mais incontáveis artistas – o repertório não soa injuriado ou ressentido. Mas maduro e libertador. E para bem do ouvinte, como notou nosso velho Freud, grosso modo, toda a boa arte nasce da repressão e de fortes momentos de crise. Amém.
Tempestades pessoais à parte, o que se ouve é um liquidificador musical camaleônico, que passa por estilos com os quais o multi-instrumentista (violão, guitarra, baixo, flauta, sax, samplers…) havia flertado anteriormente (o dub, o ska, o samba), com sucesso.
A confessional letra de “É sempre bom se lembrar” faz tenra reflexão sobre o deleite de amores passageiros, desenredados diante da ação do tempo, e é floreada por um instrumental denso, mas ao mesmo tempo doce, de clarinetes, vibrafones, violoncello e um delicado piano rhodes.
Ponto marcante, talvez a grande inovação desta vez seja a recorrente inserção de arranjos de música clássica, adicionando peculiar dramaticidade às canções. Como no single “Músico” (Herbert Vianna/ Bi Ribeiro/ Tom Zé), releitura d’Os Paralamas do Sucesso, na qual as texturas de cordas dançam e se entrelaçam, livre e paradoxalmente, com sintetizadores e com a batida quebrada, que cadencia os versos entoados suavemente com o apoio da cantora Céu. Sim, há algo de qualidade e (nem tão) novo no front.