Nascida em cima do palco, a Dingo Bells tem na experiência ao vivo sua maior inspiração. Amigos há mais de uma década, seus membros aprimoram seu som através da riqueza dos encontros proporcionados pela música.
Rodrigo Fischmann (voz principal e bateria), Diogo Brochmann (voz, guitarra e teclado) e Felipe Kautz (voz e baixo) se conhecem há muito tempo, mas sua amizade foi estreitada pela música.
- A Dingo Bells surgiu na época do colégio sem nenhuma pretensão. Depois de cada um passar um ano morando fora, nos juntamos e pensamos: “Tá, vamos levar a sério?" Aí, com a cancha de muitos shows, montamos um repertório autoral. Em 2013, lançamos o single Lobo do Mar (com a participação do Helio Flanders, do Vanguart) em que é notável uma certa evolução sonora. Foi natural, estávamos amadurecendo - explica Rodrigo.
No início, o som da banda trazia um quê de retrô, o que era inevitável considerando as referências explícitas de Mutantes, Secos & Molhados e Neil Young que trazia. O tempo passou e chegou a hora de entrar em estúdio novamente, dessa vez com um novo olhar. A sutileza psicodélica do Fleet Foxes, a elegância do Steely Dan e a vanguarda experimental do Caetano Veloso sobrepuseram o classic rock de antigamente. "A diversidade é a riqueza em si. Tudo que se mantém muito puro acaba sendo um pouco frágil de vez em quando", comenta Felipe.
Bancado por um financiamento coletivo, a construção do primeiro álbum, Maravilhas da Vida Moderna (2015) foi um processo consciente e ao mesmo tempo natural. O background comum aos três, unido à facilidade que têm para se relacionar, fez da gravação do disco uma experiência fluída de colaborações.





Por sermos amigos de infância, trocamos referências há muito tempo. As escolhas feitas pra esse álbum são a congruência do que é legal para os três. Não consigo lembrar de uma ruptura de opiniões em que não chegamos a um consenso – conta Felipe.
O Maravilhas... reúne influências de jazz fusion, funk setentista, pop alternativo e rock psicodélico, aliado a letras que revelam sentimentos confessionais sobre a transição da juventude para a vida adulta. Marcelo Fruet, produtor do disco, adaptou a engenharia sonora do álbum de acordo com o conceito e reflexão necessários para cada faixa:
- A tecnologia acaba sendo não uma escolha, mas algo que vai de uma forma ou de outra influenciar no processo. Por exemplo, decidimos gravar o violão de “Anéis de Saturno” diretamente num gravador Tascam de fita K7 que o Diogo tinha. E ficou animal, com aquelas modulações exageradas de um player lo-fi. Depois, foi necessário gravar todo o resto com base nesse violão, já que o som não ficou tão preciso na K7 porque a fita oscila muito e perde sincronização de tempo. Isso deu um ar completamente novo e interessante pra música. “Hoje o Céu” teve muita edição criativa na parte de mixagem e isso acabou “resolvendo" a música absurdamente. Não tinha ficado tão legal quanto imaginávamos, então misturamos diferentes partes da música, recortando e colando até achar um caminho. Em "Maria Certeza” gravamos violão e voz, depois chamamos a Carina Levitan pra tocar uma série de instrumentos de percussão inventados por ela com sucata. Não havia como controlar tudo: afinação, timbre e intensidade de cada um. Por isso houve um trabalho grande de pós-produção, afinando, editando, montando e sequenciando as coisas. Sem tecnologia, isso não seria possível, pelo menos não dessa forma - explicou Marcelo.
O resultado foi melhor do que o esperado. Além de satisfazer os objetivos do trio, Maravilhas da Vida Moderna é um álbum reconhecido pelos principais meios de comunicação do Brasil, destacando-se também no projeto Music Map: Cities of the World, do Spotify, — "Eu Vim Passear", "Dinossauros" e "Maria Certeza" ficaram entre as faixas mais reproduzidas pelos assinantes em sua cidade de origem, Porto Alegre.


A extrema empatia com sua base de fãs, aliada à preocupação com toda identidade visual da banda, revela interesses e aptidões que vão além do ato de criação musical. Felipe Kautz conta que um livro que lhe chamou atenção recentemente foi How Music Works do David Byrne:
- Ele tem um jeito bem direto de abordar os temas, sem colocar nada nem ninguém em um pedestal. Acredito que ele aplica isso em todos os processos musicais dele, pensando também no papel da música na sociedade. Não é a toa que se chama How Music Works, pois vai desde o contexto em que a música é criada e é ouvida até as plataformas em que se pode lançá-la, cenas locais, e a arquitetura envolvida nesse universo. É uma piração.
Já o encarte do Maravilhas... vem com quatro opções de capas que intercalam ilustrações e fotografias em preto e branco. Os desenhos são do Lipe Albuquerque, as fotos do Rodrigo Marroni e o design, do Leo Lage.
- Nosso maior envolvimento com outros tipos de arte nesse disco foi no desenvolvimento do projeto gráfico. Utilizamos fotografia digital com a analógica por cima. Me interesso muito por fotos em preto e branco, pois é um tipo de informação mais essencial. É luz no final das contas. Entre as nossas referências estão Boris Kossoy, Robert Capa e Cartier-Bresson, conta Felipe.
“Arte é arte. Uma coisa alimenta a outra, é cíclico”, reflete Rodrigo Fischmann. A arte da música já levou a Dingo Bells para os festivais mais importantes do Brasil e lhe rendeu apresentações em países como o Japão. Suas descobertas sonoras se dão enquanto fazem o que mais amam na vida: subir no palco e tocar. É como Felipe diz:
-A música é o que nos move mesmo. Gostamos muito de tocar ao vivo porque isso fez parte da nossa formação. Então pretendemos manter uma carreira que nos permita gravar e circular ao máximo. Sonhamos em desenvolver uma carreira que seja realmente sólida e que faça alguma diferença na vida das pessoas. Acredito que a música vai nos levar a um lugar de muito trabalho, mas de muito prazer também.



