Samples finos dão o tom do disco de estreia da DOMKOBA

14/07/2020

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Revista NOIZE

Por: Revista NOIZE

Fotos: Divulgação

14/07/2020

Terceiro lançamento do selo brasileiro Sampleada, DOMKOBA reúne uma coletânea de beats produzidos durante encontros entre Caio Rodrigues e Pedro Dom em 2017. Além das nove faixas disponibilizadas ontem pelas plataformas da Sampleada, nove vídeos serão lançados nas próximas semanas, começando hoje. A NOIZE estreia o vídeo de “Cosmos”, primeira faixa do álbum.

Assista:

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“DOMKOBA parece que foi deixado maturando pra sair só agora mesmo com a chegada desse novo projeto, foi premeditado parece, era pra ser”, diz emocionado o produtor, poeta, mc e artista plástico Yuleh Aurêh, organizador do selo ao lado de Lucas Uilson, o poeta, mc, beatmaker e produtor cultural ZillaDxg. “A Sampleada nasceu de uma vontade antiga minha e do Lucas de fazermos um projeto onde fosse possível tocar, registrar, movimentar e conectar produtores locais e apreciadores de músicas eletrônicas e de batidas instrumentais de um modo geral, que navegam por todo o universo das samples. Em 2019, num primeiro passo como um encontro, uma festa onde eu e meu comparsa ZillaDxG, tocávamos as músicas que nos acompanharam e também pesquisas mais atuais, com liberdade para misturar tudo isso. Com a situação da pandemia, tivemos de cancelar três eventos numa tacada, foi daí que veio a força e a necessidade para enfim dar o segundo passo, que era o de se firmar como uma label. A fim de organizar nossos novos trabalhos e dos amigxs da caminhada musical, e assim seguir expandindo esse movimento”, explica Aurêh.

Entre 2013 e 2016 se pôde ver a O.C.L.A. emergir do cenário local, mais especificamente da grande Porto Alegre, em Novo Hamburgo e dialogar com o cenário nacional. Recém formado em cinema na época, Caio realizou o vídeo clipe da música “Massa Sonora” – que lançamos com exclusividade aqui -, com o áudio captado no show que a O.C.L.A. realizou dentro do projeto Som no Salão. Em meio a isso, Pedro lançou seu primeiro disco solo, integrou a edição de 2016 do PULSO da Red Bull, estimulou a transformação da banda em Orquestra Livre, com quem gravou uma homenagem ao maestro Moacir Santos no Audio Porto, trabalhou com artistas como Ian Ramil e Dona Conceição (que você viu aqui, com a estreia da música “Deus é uma mulher negra, produzida pelo Pedro) e nos pegou de surpresa ao anunciar sua partida para Los Angeles.

Os produtores responderam algumas perguntas para o núcleo de produção de conteúdo LabXP, sobre o lançamento, a vida, os projetos e o impacto do tempo pandêmico nisso tudo.

Ouça o álbum e leia abaixo.

Caio, como você conheceu a O.C.L.A.? Como se deu a aproximação? 
Caio: Conheci a O.C.L.A quando achei por acaso a página do Pedro no Bandcamp. Nessa época, eu conheci o Yule e foi ele quem começou a me levar nos ensaios e nas gigs pra conhecer o time. Tenho lembranças boas demais dessa época, quando eu aprendi demais com essa turma. “Não esqueci onde começa o episódio”.

Fale um pouco sobre a tua trajetória.
Caio: Em 2011 entrei na faculdade de cinema e comecei a trabalhar com audiovisual. De lá pra cá, participei de vários projetos dentro do departamento da fotografia: longa-metragem, curta-metragem, série, videoclipe, comercial, televisão e me estabeleci como assistente de câmera. A música sempre foi uma paixão e me acompanhou todo esse tempo.

Como se deu a parceria e a produção dos sons do DOMKOBA?
Caio:  Eu e o Pedro fomos nos aproximar mais quando fizemos o clipe de “Massa Sonora”. Trocamos bastante durante o processo e dali em diante fomos naturalmente convivendo mais. Em 2017, decidimos produzir uns beats pela diversão. Fizemos algumas sessões lá na sala da Banca 9, com a casa sempre cheia. 

Pedro:  A gente ouvia discos procurando por “aquele” momento. Eu lembro da gente ouvindo Pérola Negra do Luiz Melodia, aos prantos, no dia em que ele faleceu. Rolavam uns dois ou três beats a cada sessão. Foi sensacional fazermos a mixagem-residência-artística lá na Pedra Redonda, experimentando esses beats com a engenharia – e engenhosidade – do Guilherme Ceron, Tiago Abrahão e Wagner Lagemann. O resultado tá aí!

Como foi motivado o movimento de mudança para LA, Pedro?
Pedro: Quando o Darkson, colega clarinetista, me ligou dizendo “tu queres vir pra Califórnia pra fazer teu mestrado? Te consigo bolsa” … eu me joguei sem pensar muito, chocado com a oferta. Como sempre, contei com a parceria, compreensão e infinito amor da minha companheira Amanda Hummes, que é artista visual e tava com um projeto em ascensão no Brasil. Hoje, ela tá se estabelecendo aqui em LA como ceramista. 


Queria que você destacasse passagens dessa estada nos Estados Unidos.
Pedro: Em primeiro lugar, o fato de conhecer uma das maiores lendas vivas do clarinete, Michele Zukovski, principal clarinetista da Los Angeles Philharmonic, e que se tornou além de professora, minha mentora. Os 54 anos em que ela trabalhou pra LA Phil renderam experiências épicas, como trabalhar com Stravinsky, Bártok, Bernstein, Copland, Berio, John Williams… é uma senhora de muito respeito! Outra coisa que aconteceu ao natural aqui foi começar a tocar em orquestras sinfônicas. Pude tocar os solos de clarinete de grandes peças do repertório sinfônico, e fazer premieres e gravações de compositores contemporâneos. Outra coisa que aconteceu aqui ao natural, por sobrevivência, foi me descobrir professor de música, algo que nunca pensei que ia ser. Dou aulas de música de câmara como professor assistente pros alunos de bacharelado na minha universidade, California State University Long Beach. Outra experiência inenarrável foi a oportunidade de ser escolhido pro quinteto de madeiras da CSULB, com quem faço concertos pra comunidade aqui de Long Beach. Aos poucos, tô fazendo umas parcerias e gravando uma coisinha aqui, outra ali. Há algumas semanas atrás, gravei um clarinete pra uma série italiana da Netflix, talvez abrindo a possibilidade de mais uma frente de trabalho, fazendo televisão e cinema.

Volta e meia você me cita o Mário Caldato Jr. Queria que falasse um pouco dessa relação, como se deu, e das parcerias e trabalhos realizados junto ou para ele.
Pedro: Um amigo nosso, Jeferson De, cineasta paulistano, militante do cinema preto, veio pra LA rodar o filme “Running After” no Pan African Film Festival e nos convidou pra sessão. Chegando lá, ele me apresentou pro Mario Caldato Jr. A Samantha, esposa do Mario, foi de primeira muito simpática e nos chamou pra um churrasco no outro dia. Não muito tempo depois, ela ligou convidando pro aniversário do Mario. Lá, fiz uma jam com o Seu Jorge e Rodrigo Amarante, alternando os instrumentos entre a gente. Algum tempo depois, o Mario me ligou perguntando se eu animava de gravar uns clarinetes arranjados pelo Miguel Atwood-Ferguson no disco novo do Seu Jorge (hahah). Lógico que sim. A mais inusitada foi essa: Amarante me ligou pedindo umas aulas de orquestração e que eu transcrevesse uns arranjos pro disco novo dele. Trabalhei brevemente com Rogê, gravei com Jupiter & Okwess, e tô produzindo um remix da Orquestra Afro Brasileira que vai sair pelo Amor Embassy, projeto idealizado pela Samantha.

Como está o momento atual com o impacto da pandemia?
Pedro: Tá horrível, né?! A coisa é séria, a gente tá em casa desde o dia 11 de março, e não flexibilizamos quarentena. Brasil e Estados Unidos estão no topo do ranking da ignorância. Países extremamente ricos em belezas e recursos naturais, mas mal administrados por sociedades brancas, patriarcais, racistas, xenófobas (principalmente os EUA), injustas, desiguais, que oprimem minorias. Vivemos uma era apocalíptica! Estamos tentando manter o equilíbrio e nos reinventando. Precisamos criar o presente em que queremos viver.

Caio: Eu tenho oscilado entre momentos de produtividade e momentos de ócio e introspecção. Esse mal-estar e as reflexões que o momento impôs estão impressos nas coisas que eu tenho criado durante a pandemia.

Qual o sentimento de lançar esse trabalho em colaboração com a Sampleada?
Pedro: O sentimento é de puro amor e a mais pura conexão. Não tem ruim, aprendemos a desatar o nó, temos um relacionamento de muitos anos trabalhando juntos. Tudo começou quase como brincadeira e agora o Lucas já tá com criança no colo. Todo mundo mais lúcido e sabendo um pouco mais o que se quer. Sampleada é família. E temos o maior orgulho de estar lançando nossas sujeiras pra geral ouvir. Caio, Yule, Lucas: amo muito vocês!

Caio: Eu fico muito feliz em trabalhar com artistas que me influenciaram tanto como o Zilla, o Yule e o Pedro. Quando tive notícia, a Sampleada me soou como o fechamento de um longo ciclo e o começo de outro.

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14/07/2020

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