George Duke e seu legado merecem todas as homenagens possíveis. O pianista, compositor e produtor de grandes hits nos deixou em agosto do ano passado e em 2014 acaba de ganhar um disco do parceiro de vida e palco Al Jarreau. My Old Friend: Celebrating George Duke foi lançado no Brasil na semana passada e reúne dez faixas com novas versões para clássicos de Duke.
Para participar do disco, Al Jarreau chamou um time de artistas do melhor do soul, R&B e jazz norte-americano: Gerald Albright, Dianne Reeves, Marcus Miller, Lalah Hathaway, Jeffrey Osborne, Kelly Price e Dr. John. Assim como George Duke, Al Jarreau já foi vencedor de diversos prêmios Grammy, sendo o único a levar em três categorias distintas. Os dois compartilhavam não só o amor pela música como a ideia de que não podemos ficar parados e presos em um estilo único, como nos contou o músico Al Jarreau na conversa que tivemos com ele.
Leia a entrevista completa abaixo:
Conte-nos um pouco sobre os primeiros anos da sua amizade com George Duke.
George e eu éramos como filhotes. Nós estávamos tocando e aprendendo sobre a música como filhotes em San Francisco em um dos períodos mais importantes da revolução musical. Nós estávamos tocando esse música jazzy e assistindo os jovens dançar ao som de Janis Joplin e Greateful Dead e toda essa nova música. Mas nós estávamos fazendo jazz juntos como filhotes. Com o tempo, esse estilo de música nos transformou no que somos hoje e essa é uma experiência rara e especial que nós tivemos juntos. Nós tivemos essa amizade desde 1965, fizemos música por todas nossas vidas e isso é um bom tempo sendo filhotes juntos.
Nós dois pensávamos que você não precisa limitar-se. Você não precisa desenhar um círculo em volta de si e não mover-se para longe do jazz. Você não precisa desenhar um círculo em volta de si e limitar-se em ser um músico de jazz e não fazer música pop. “Eu não vou desenhar um círculo em minha volta e fazer isso”, foi essa a promessa que George fez para si mesmo e a promessa que eu fiz para mim mesmo quando nós estávamos lá caminhando com toda essa música à nossa volta. Essa é a amizade que a gente divida, essa é parte do legado que ele deixou. Não limite as pessoas.
O que na música de George Duke te emociona e inspira tanto?
Com certeza, a profundidade dos sentimentos e da sensibilidade, e o senso de humanização que George era capaz de expressar em sua música. Essa capacidade de compreender profundamente quem nós somos como seres humanos. George era capaz de entender dois sons distintos e traduzi-los direto para sua música para que possamos entender. Não é todo mundo que consegue fazer isso. George escreveu para a Orquestra Sinfônica, George escreveu as músicas mais funky que até o Parliament Funkadelic gostaria de dançar. É isso que eu tiro da música de George: essa humanização e sensibilidade. Era esse tipo de pessoa que eu gostaria que estivesse tornando-se político e tomando as decisões por mim. É mais do que somente música.
Você acha que o que te inspira em George Duke está faltando na nova geração de músicos?
A nova geração continua um tanto nova. Nós sempre pedimos que as novas gerações tragam o que elas tem de especial: sua juventude, para todos aproveitarem essa energia. Risos, alegria e diversão, é isso que nós como consumidores pedimos que eles mostrem. Então eles não têm tempo nem chance de fazer outra coisa, sabe? Então eles fazem o que nós pedimos. É isso o que as gravadoras e as rádios querem. O que nós precisamos fazer é pedir para eles façam mais. E eles farão. Dê tempo a eles. Deixe-os crescer.
Nesse disco, há duas músicas que falam sobre o Brasil. Existe alguma diferença entre o jazz norte-americano e o brasileiro?
São estilos bem parecidos. Talvez a diferença seja que o jazz norte-americano escolha não destacar o ritmo e os contrapontos do jeito que a música brasileira faz. Acho que a música brasileira é mais africana, assim como o ritmo e os batuques do jazz [brasileiro]. Os dois estilos são muito importantes para mim e para George, e eu quis enfatizar esse amor que nós compartilhávamos pela música brasileira. Então, eu fiz duas músicas que falam do Brasil. “Brazilian Love Affair” é do disco A Brazilian Love Affair (1980) e foi uma das canções mais importantes que eu fiz, porque essa talvez seja a música mais famosa de George que fala sobre o Brasil.
Tem outra [“SomeBossa (Summer Breezin’)”] que é como se ela falasse “Obrigado, Antônio Carlos Jobim. Obrigado, Milton Nascimento. Obrigado pela sua leve bossa nova”. Então eu escrevi una letra que diz exatamente isso. “Summer Breezin’” não tinha letra, mas eu escrevi uma letra que diz “Eu quero ouvir aquele tipo assim que não tocam mais”. Sabe, o Rock in Rio tem sido muito importante, mas eu não quero o Brasil se esqueça de Jobim e todos esses músicos que escreveram canções de sentimentos íntimos, pessoais, leves e delicados.
O que você gostaria de falar sobre a voz poderosa de Lalah Hathaway que aparece na faixa “Sweet Baby”?
É uma voz inesquecível! Ela tem um pouco da garganta de seu pai, Donny Hathaway, uma das pessoas que nasceram com um instrumento vocal que vem dos céus. E ela pegou essa voz angelical que seu pai tinha e que está em sua música. Nós a chamamos e pedimos que ela cantasse uma das músicas mais importantes que George já fez. “Sweet Baby” foi um grande sucesso pop para ele. Eu acho que para as pessoas é uma boa surpresa. “Quem é essa pessoa cantando essa música?”; “É Lalah Hathaway!”. A voz dela criou uma nova versão para essa canção, é totalmente novo para as pessoas.