Encabeçado por Sergio Molina, o projeto Música de Montagem retorna aos palcos e plataformas de streaming, apresentando nova formação e sonoridades inéditas. Após um hiato pandêmico, o grupo lança dois singles inéditos, “ALADA” e “MELANCHOLIA II”, e volta às apresentações ao vivo. Quem estiver em São Paulo nesta semana terá a oportunidade de vê-los: Música de Montagem toca no dia 13 de dezembro no Sesc Pinheiros (ingressos e mais informações aqui). “Voltamos com um som mais pop e mais alternativo”, comenta Sergio na entrevista que segue abaixo.
Com doutorado em Música e uma carreira artística que contempla parcerias com artistas como Chico César, Itamar Assumpção e Juçara Marçal, Sergio desenvolve seu trabalho de criação musical em permanente diálogo com as reflexões de sua produção acadêmica. “Música de Montagem” é um conceito de sua pesquisa, é o título de um livro de sua autoria e é também o nome da banda, cuja formação atual inclui Xofan (voz e pedal loop), Clara Bastos (baixo), Vitor Ishida (guitarra), Priscila Brigante (bateria e bateria eletrônica), além de Sergio no piano e violão. “Mas o nome da banda veio antes!”, explica Molina. Confira a seguir nosso papo com o artista.
O projeto Música de Montagem lançou seu disco de estreia em 2018, com uma formação diferente, e agora chega uma nova fase da banda. Como a banda está hoje e como se deu esse movimento?
Sim, voltamos com um som mais pop e mais alternativo! É um lugar ainda pouco explorado no Brasil. Pop, mas sofisticado; sofisticado, porém acessível! A mudança de som e de formação foi provocada pela situação da pandemia. Depois de lançarmos o primeiro álbum, pelo selo Circus, fizemos no pré-pandemia uma sequência incrível de shows em locais muito especiais: Sesc Pompeia, Casa de Francisca, Sesc Campinas, Centro Cultural SP, Itaú Cultural, Áudio Rebel (RJ), Sesc Belenzinho, entre outros. O processo que iria se estender, foi interrompido. Durante a longa pandemia, comecei a compor algumas baladas ao piano e fui convidado para dirigir um projeto muito bacana para o Sesc Carmo, o “Laboratório Música em Nuvem”. A ideia era compor uma canção do zero até a master, em cinco lives no Zoom, com público ao vivo. Montamos uma equipe muito especial, com Juçara Marçal (voz), Marcelo Segreto (letras), Rômulo Alexis (trompete free), Clara Bastos (baixo do Música de Montagem) e Priscila Brigante (bateria do Música de Montagem). Eu faria as músicas (melodia, harmonia). Gustavo Lenza foi convidado para fazer a mixagem e o crítico Tulio Ceci Villaça, do Rio de Janeiro, para escrever um ensaio final. Por conta da objetividade que a situação exigia, comecei a trabalhar com harmonias mais simples e usando alguns destes aparatos eletrônicos. Esse foi o start para começar a pensar numa nova sonoridade para a banda. Compus, a partir daí, um material completo para um novo álbum. Joana Duah, nossa excelente cantora, havia se mudado para Brasília na pandemia. Então iniciei um laboratório intenso de ensaios com a Xofan, e comecei adaptar as novas composições para a voz dela.
O cartão de visitas desta nova etapa são os singles “Melancholia II” e “Alada”, que acabaram de ser lançados. Como foi o processo de produção das faixas?
Resolvemos começar gravando esses dois singles, que lançamos juntos agora em novembro. Duas baladas com propostas bem diferentes; “ALADA”, com letra de Paulo Souza, é mais “orgânica”, e faz referência às baladas ao piano da década de 1970, como as do Paul McCartney, Arnaldo Baptista (do Lóki?) etc. Mas tem uma abordagem de gravação e mix totalmente atual. Ensaiamos e gravamos as bases, voz e backings no Estúdio U, coloquei o piano (de cauda) no estúdio da Faculdade Santa Marcelina [instituição na qual Molina coordena um curso de pós-graduação em Canção Popular]. Para essa proposta “extra pop-alternativa” foi fundamental fazermos a mixagem com o Gustavo Lenza e a masterização com o Felipe Tichauer, nos Estados Unidos. O som ficou “quente”, encorpado, e sem perder a vibração de uma performance ao vivo.
“MELANCHOLIA II” havia saído no disco de 2018, mas com uma roupagem diferente. Como foi o trabalho de redescobrir e reinterpretar a canção?
Regravar a “MELANCHOLIA II” foi uma forma de mostrar um viés fundamental dessa nova proposta, que difere do primeiro álbum: o uso mais intenso de sons eletrônicos, sons densos e espaços sonoros rarefeitos. Eu mesmo produzi toda a base, ou seja, bateria, baixo synth, teclado, a partir de uma MPK [Akai MPK, teclado controlador MIDI]. Depois processei todos os canais e acrescentei o piano acústico. Priscila completou com pratos, e o Vitor Ishida com as guitarras processadas. Sobre tudo isso vieram as vozes versáteis da Xofan. Os sons “acústicos” humanizam os eletrônicos quando conversam entre si. Para quem curte procurar detalhes no áudio (e o público da Noize certamente curte!), vale reparar nas duas vozes super-agudas equalizadas que dobram trechos da melodia principal. Escolhi essa canção também porque a letra do Chico César é super imagética e sugere outras ambiências sonoras para além da primeira versão! Compus a canção depois de assistir ao Melancolia, do cineasta dinamarquês Lars Von Trier, e pedi para que o Chico fizesse a letra nesse contexto. Mas ele acabou citando em alguns versos, o Dogville (2003), outro filme do Lars Von Trier. Em suma, tudo muito sugestivo e estimulante para diferentes leituras sonoras nos arranjos.
“Música de Montagem” é também o título de um livro de sua autoria, lançado em 2017, além de um conceito que você apresenta na sua pesquisa. Pode falar brevemente desse conceito e sobre como ele dialoga com a banda?
“Música de Montagem” é como me arrisquei a denominar o principal processo de criação de áudios de canções populares no pós-Sgt. Pepper’s (1967), dos Beatles. O termo advém da ideia de “obra de arte montável”, que Walter Benjamin elabora, ainda nos anos 1930, para falar de cinema. A música de hoje é, na maioria das vezes, “montada” com colagens, sobreposições de camadas, rompimentos, contrastes. Eu sempre compus assim, enfatizando esses contrastes: contrastes entre as partes de uma mesma música, contrastes entre as músicas de um álbum ou show. O nome da banda veio antes. Depois, o meu doutorado, que estudava esses processos de composição, venceu o Prêmio Funarte de Produção Crítica em Música para ser lançado em livro. Nós não encontrávamos um título sintético… até que o editor, o Edson Filho, da É Realizações, que já conhecia a banda, me falou: “Por que não chamamos de Música de Montagem“? Afinal, o livro é o braço reflexivo dos processos estruturantes do projeto artístico! E foi assim! Mas o nome da banda veio antes!
Ouça também o disco de estreia, de 2018:
Quais são os planos para o ano que vem? Há disco novo ou shows no horizonte?
Certamente, estamos muito animados com a nova sonoridade. Além das baladas (ao piano) temos as canções “para baladas”, ou seja, canções rítmicas, swingadas, com refrãos! Tudo com mais força e letras poético-contundentes, textos para hoje! Letras de Marcelo Segreto, Lilian Jacoto, Kleber Albuquerque, e releituras de parcerias minhas do meu álbum com letras de Itamar Assumpção e Miriam Maria na voz. Para 2024 o plano é lançar um clipe de “ALADA”, gravar tudo, lançar mais dois singles e o álbum até junho. E queremos tocar muito, teatros, casas pequenas, festivais! Além desse show do dia 13 de dezembro, no Sesc Pinheiros, estamos fechando fevereiro no Sesc Ipiranga. O trabalho nasceu de certa forma maduro, integrado. Queremos que chegue em muita gente!