“A bala de borracha não apaga o poema” . É com essa frase chave que a Renascentes abre o seu novo single, “O Poema”, espécie de poesia manifesto que reforça a resiliência da arte frente à força bruta da repressão. O manifesto que já tinha ganhado letra e música se transforma agora em um clipe pelas mãos do duo Couple of Things – formado pelos filmakers Diana Boccara e Leo Longo e que recentemente trabalharam com as bandas Tuyo e Carne Doce. Confira abaixo, com exclusividade para a NOIZE, o vídeo de “O Poema”:
Formado por Átila Viana (baixista e arranjador), João Ortácio (guitarra e voz), Dionísio Monteiro (bateria) e Eduardo Morlin (flauta, violão e programações), a banda gaúcha lançou no ano passado seu segundo álbum Dia Real Inventado. Pra quem quiser conferir o trabalho dos meninos de perto, eles estarão se apresentando no show Renascentes em Noites no Bixiga no dia 23 de maio, quinta-feira, em São Paulo, ao lado de participações como Dani Nega, Bruno Morais e Zé Manoel. A casa abre às 21h e os ingressos custam R$ 15 e podem ser adquiridos no próprio evento.
No embalo do lançamento, batemos um papo com o vocalista e guitarrista João Ortácio sobre traduzir reflexão em disco, os sentidos de “O Poema” e conseguir lançar um clipe no cenário independente. Corre pra ler tudo na sequência:
No segundo disco da Renascentes, Dia Real Inventado (2018), vocês afirmam que a reflexão sobre o contexto histórico-social do Brasil foi a principal força de criação. Vocês consideram o disco mais maduro?
O nosso primeiro trabalho [Renascentes (2014)] demorou um tempo bem extenso pra ser concluído, por isso o resultado nos pareceu descontextualizado com o que pensávamos na época do lançamento. Já no Dia Real Inventado, tivemos a preocupação de compor e gravar algo que representasse o que estávamos e ainda estamos vivendo. Já que as composições foram feitas num mesmo período, o disco ganhou uma narrativa coerente e mais madura sobre o que representa o nosso contexto histórico-social. Ele acabou sendo o reflexo da nossa percepção de mundo carregado por um discurso crítico. Todos na banda concordam que a arte deve ser ativa, indo de encontro ao que nos incomoda e ao que nos priva de liberdades. No nosso caso, as canções tem a intenção de propor uma reflexão sobre o período difícil que estamos passando, principalmente quando se trata de cultura. Olhar pra fatos históricos sem um distanciamento temporal nos faz perceber muito menos do que devíamos e é por isso que nos propomos a fazer esse disco carregado de um discurso que nos joga a realidade na cara e nos faz lembrar que a música tem uma força que vai muito além do entretenimento.
Como essa reflexão foi traduzida pro disco e como foi trabalhada na faixa “O Poema”?
Todas as letras carregam reflexões sobre o nosso contexto histórico-social, seja de forma mais direta como em “O Poema”, ou representado por um personagem afogado na rotina no caso de “Relógio”. São maneiras diferentes de apresentar a mesma ideia. As imagens e metáforas das letras e as misturas rítmicas são as ferramentas que deixam o discurso do disco mais colorido e dão mais leveza às temáticas que por si só são densas. Na faixa “O Poema”, a resistência da cultura sobre a força bruta é representada pela própria palavra poema, que se repete exaustivamente ao longo da música persistindo frente aos embates numa situação de repressão. A metáfora que originou toda a composição e que representa bem o contexto dessa faixa e também do disco está no verso: “a bala de borracha não apaga o poema”.
No cenário independente, produzir um clipe pode ser bem complicado e quase inviável. Qual é a importância de fazer um e conseguir lançar um material audiovisual?
Assim como na música independente, o cenário audiovisual também sofreu uma desvalorização, isso acabou aproximando os dois segmentos como uma forma de resistência através de apoio mútuo pelo viés da colaboração. É essa a maneira de driblar o contexto desfavorável e de continuar produzindo materiais com qualidade muito boa. O material audiovisual acaba potencializando a canção e levando-a a um outro nível, tanto poético quanto mercadológico. No caso desse clipe, o casal Couple of Things, Diana Boccara e Leo Longo nos presentearam com um material incrível, um plano sequência muito bem pensado e captado que foi muito além das nossas expectativas. A colaboração aqui foi essencial, tanto por parte do Colégio Paula Soares que nos cedeu uma locação maravilhosa, quanto por parte dos figurantes e dos atores Maria Galant e Antônio Carlos Falcão que deram o melhor de si. Pensar e fazer um clipe é um trabalho de composição complexo e um complemento cada vez mais necessário no cenário musical independente.
Veja abaixo o making of do novo clipe da Renascentes: