Giovani Cidreira exalta Ederaldo Gentil em álbum que celebra a ancestralidade

05/02/2025

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Por: Revista NOIZE

Fotos: Vine Ferreira/Divulgação

05/02/2025

Já no apagar das luzes de 2024, Giovani Cidreira lançou Carnaval Eu Chego Lá (2024), um dos álbuns mais interessantes do ano – a data de lançamento, inclusive, foi estratégica, já que saiu no Dia da Consciência Negra. Firmando-se como um dos principais compositores da nova geração baiana, o músico, neste trabalho, se lança pela primeira vez totalmente como intérprete.

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O ineditismo vem para homenagear o conterrâneo Ederaldo Gentil. O músico, que nos deixou em 2012, é inspiração na trajetória de Cidreira. “Sensível, rebelde, gênio”, define o artista. Para ele, a homenagem se trata não de trabalhar versões, mas reinterpretar essas canções.

Somam as participações de Alice CaymmiCéuDanilo CaymmiJosyara e VANDAL com produção de Mahal Pita e Filipe Castro. O resultado é um álbum com arranjos mais frescos para músicas atemporais, como é o próprio carnaval, celebração da Bahia e do Brasil que dá nome ao álbum. “Cantar minhas músicas é uma coisa, criar arranjos para músicas que já possuem arranjos originais incríveis, é outra”, explica Cidreira, sobre os desafios do disco. O resultado é um álbum que carrega também suas características, incluindo referências contemporâneas como Frank Ocean.

Giovani destaca canções como “Baticum”, que celebram a ancestralidade, e “Identidade”, que, no lirismo, traz uma forte mensagem sobre a vida de um trabalhador periférico. “Lembra meu pai, que trabalhou a vida inteira para nos dar vida, e ainda hoje trabalha para sobreviver. Poucos compositores trabalham tão bem esse tema”, defini Giovani, que apresentou o show de seu disco recentemente, em São Paulo.

Confira Carnaval eu Chego Lá faixa a faixa:

“Feira do rolo”: Inicialmente, não estaria no disco. Essa música me foi apresentada por Mahal Pita, em sua versão original cantada por Alcione. Mahal deixou claro que o intuito era dar um ar mais solar ao disco, e esse aspecto mais afirmativo meio que tomou conta do restante do repertório. Vandal sempre foi uma escolha pra somar nela, mesmo antes da música ser escolhida.

“Baticum”: Essa é uma do repertório de Ederaldo Gentil que reforça sua ligação com as religiões de matriz africana, e esse lugar de pertencimento, saber de onde vem nossa música, saber que todas as
criações, gêneros contemporâneos, todos vem de uma música essencialmente preta muda nossa
perspectiva. Mais uma que foi arranjada solar, afirmativa. Acho que representa muito o disco.


“Identidade”: Essa música consegue passar a sensação de ser um trabalhador da periferia do Brasil, e acho que é a música que mais gosto do disco. Me lembra meu pai, que trabalhou a vida inteira pra nos dar vida, e ainda hoje trabalha pra sobreviver. Acho que poucos compositores trabalharam tão bem o tema. Tentamos criar um clima caótico industrial no final da faixa com os tímpanos, sintetizadores e os metais.


“O samba e você: Essa foi escolhida para ser a primeira faixa do disco inicialmente. Na verdade, essa música deu o pontapé no disco, que teve um processo bem diferente de todos que fiz – cantar minhas músicas é uma coisa, criar arranjos para músicas que já possuem arranjos originais incríveis é outra, acho que essa foi a primeira música de Ederaldo que internalizei e depois soltei do meu jeito. Me identifico muito com essa letra e sempre cantei a plenos pulmões. O arranjo é baseado nos sambas minimalistas de Riachão e Paulinho da Viola. No finalzinho ali tem uma brincadeira com o Frank Ocean, será que o pessoal reparou?


Vale ressaltar a participação de Céu. Na minha cabeça eu já conseguia ouvir a voz aveludada dela, ficava imaginando… demorei um pouco pra convidá- la, coisa de fã sem jeito mesmo. Pra minha surpresa, ela topou e fez aquilo genial, agora a gente tá junto e não desgruda.


“O rei”: Primeira música do Ederaldo Gentil que ouvi na vida. Estava na casa de um amigo que é compositor, Paulo Diniz. Assim como o pai dele, que também era compositor e se chama Paulo Diniz – mas não é o cantor da música “Como vou deixar você..” Esse Paulo compôs algumas músicas para grandes artistas, e um deles foi Ederaldo. Meu amigo estava me mostrando algumas músicas que o pai dele tinha feito e colocou pra tocar essa.. amor à primeira vista! Pro disco eu não sabia muito o que fazer porque a versão original dessa música é simplesmente perfeita, então resolvi que ia colocar esse pepino nas mãos de outro, nesse caso outra, Josyara, o arranjo é dela.


“A metade da metade”
Sempre achei essa música muito louca, a letra é uma das coisas mais fodas que existem de verdade.
E nós acabamos entortando mais, o método foi o seguinte: Filipe Castro veio com a bateria
minimalista e constante inspirado nos Marcelo Callado da vida, e me disse “agora vc faz uma linha de
violão que pode sair do tempo, entortando tudo porque a bateria vai manter o groove”. Gravei de
improviso e todas as vezes toco diferente, não tem jeito.

“Provinciano”: Essa música sempre foi muito especial pra mim, falar do fazer artístico, do trabalho, desse jeito que não existe e esse é só um dos pontos em que ela toca. Poesia ferina do Ederaldo no auge. O arranjo ficou por conta de Filipe Castro, inicialmente eu queria que ela fosse um samba choro, gravei o violão dessa maneira. Filipe chegou pela madrugada e eu estava no estúdio, ele ouviu e me disse que era um aboio, pegou zabumba, triângulo e mudou o andamento.


“Rose”:Raras as vezes em que na música brasileira encontramos uma canção que fale sobre depressão de uma forma tão direta e bonita. Ederaldo escreveu essa música para sua irmã, Rose, que sofria de depressão. É de uma verdade e um carinho enormes. O que Filipe Castro fez aqui foi basicamente me fazer ouvir “quando eu partir” do Roberto Carlos e simular o arranjo dele. No início não botei fé, mas ficou incrível. A gente já tinha gravado os violões e vozes quando Alice Caymmi ouviu e reivindicou seu lugar na música. Danilo Caymmi já é um amigo, uma pessoa bem família, conversamos algumas vezes e eu não perderia essa oportunidade de convidar esse mestre, e não é que ele aceitou?

“O ouro e a madeira: Ficamos um pouco indecisos com o que fazer com essa música, ela guarda o peso de ser o grande hit da carreira de Ederaldo, queria um lugar que fosse comum pra ela, alegre, como um encontro em familia, o samba no quintal, com muita cerveja e tudo mais que quiser. Tivemos a ideia de inserir o texto de agradecimento nesse clima bem descontraído, foi dela que surgiu a vontade de convidar as cantoras, Duce, Mara e Graça para participar do disco.


“Ternos da Lapinha”: Algumas pessoas acham essa escolha improvável, talvez pelo ritmo da própria versão original que é uma marcha. O que fizemos com ela também foi bem doido, nos inspiramos nas próprias festas de largo de Salvador, esse clima quase insalubre com muita loucura e alegria, um pouco de perigo também. Ela traz em seu texto os bairros de Salvador onde passavam bloquinhos de Carnaval, lugares onde Ederaldo gentil e nós também vivemos.

“A saudade me mata”: Essa foi minha música preferida de Ederaldo durante anos! Eu acho que ela foi feita pra eu cantar (rs). Todo mundo que veio de outros lugares para tentar a vida no sudeste, carregando seus sonhos e a responsabilidade com os que ficaram, sabe o peso dessa letra. Pais, filhos, netos, todos nós trabalhamos aqui pensando num dia quem sabe poder voltar. A veracidade com que a carta na música conta isso é de chorar.

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