Flutuando entre sons ancestrais e contemporâneos, Alfamor lança hoje o seu álbum de estreia: ONÇA. Com produção de Saulo Duarte e convidados como Mateus Aleluia, Perotá Chingó, Mãeana e Bruno Capinan, o disco sai pelo selo YB music e apresenta sete faixas autorais da artista (ouça abaixo).
Gaúcha atualmente radicada entre São Paulo e Salvador, Alfamor é também fotógrafa, artista visual, tatuadora, mas conta: “A música sempre foi minha paixão”. “Quando era pequena (e até hoje) era o que mais me instigava. Mas eu era uma criança muito tímida, não conseguia me posicionar diante dessa vontade toda, apenas quando estava sozinha. Nessa eu me encaminhei pras artes visuais por ser uma expressão que me dava voz. Mas também, não muito tarde, encontrei amigues que me inspiraram a me arriscar mais e fazíamos jams musicais livres e logo formamos o que foi minha primeira banda, aos 16 anos, em Porto Alegre, chamada Kayab“.
– Depois aos 19 decidi realmente me desprender de tudo e me jogar na vida de artista e parti pra São Paulo tentar a sorte. E fui de malabarista de sinal à ilustradora, tatuadora, muralista, fotógrafa – explica.
A artista diz que, através da fotografia, teve chance de se reaproximar da música, dessa vez registrando diversos nomes que já lhe inspiravam desde sempre, como Gilberto Gil, Jorge Mautner, Milton Nascimento, Novos Baianos e Lazzo Matumbi. “Nessas, quando morei no Rio de Janeiro, conheci e me apaixonei pela Mãeana. Logo começamos a trabalhar juntas e na sequência formamos uma banda só de mulheres chamada Xanaxou, revolucionária em nossas músicas e performances. Por todos esses caminhos conheci muitos músicos incríveis e agora, nesse retorno definitivo à música, me senti amparada por elxs, podendo contar com esses artistas maravilhoses que participaram do disco como grandes parceirxs”.
Ela conta que o disco ONÇA nasceu a partir das trocas desenvolvidas com Saulo Duarte, músico e produtor que, além de ter seu trabalho solo, acompanha nos palcos artistas como Anelis Assumpção. “Tudo isso começou quando Saulo Duarte me instigou a mostrar minhas composições pra ele (que ele sabia que desde a Xanaxou eu tinha iniciado a compor). Nisso ele me deu coragem para gravá-las e foi um parceiro sem tamanho em todo esse processo. Em casa, mostrava letra e melodia e ele foi decifrando tudo, lapidando e colocando as harmonias”, diz.
As gravações começaram em maio do ano passado, quando Alfamor, Saulo e os músicos Klaus Sena, Thomas Harres e Mau juntaram-se em estúdio e fizeram seis faixas em quatro dias. “Em setembro, fomos a Salvador gravar especialmente ‘Paô’ [o primeiro single lançado] com meu querido [Mateus] Aleluia e Gabi Guedes, dois firmamentos da música pra mim”. Além de Saulo Duarte, o mestre Tincoã foi uma das pessoas que mais incentivou a artista naquele primeiro momento:
– Foi muito lindo como se deu minha aproximação com Mateus, em pouco tempo nos tornamos grandes amigos e sincronicamente, enquanto Saulo me instigava a gravar, ele me instigava a cantar (imagine!). Saulo, quando contei que ele estava nesse movimento comigo, falou: “Por que cê não chama ele pra gravar uma com você então?”, eu ri, achando talvez muito pretensioso, no caso. Mas, surpreendentemente, “Paô” no mesmo momento veio quase como uma canalização e eu não tive como não apresentá-la ao meu mestre que me ensina tanto! E essa música fala exatamente sobre o que aprendo com ele. Então, logo que a apresentei ele topou na hora (!!!) “Paô, o bicho vai pegar!” ele sempre me diz, rs. Gabi Guedes, esse músico incrível, também tinha se tornado meu amigo pela caminhada e foi outro que topou imediatamente, me emocionando muito com sua tamanha gentileza.
Com as bênçãos de Aleluia, os caminhos se abriram e possibilitaram que Bruno Capinan também entrasse no disco. “Bruno é minha irmã! Por sorte, ele estava não só no Brasil (ele mora no Canadá) como em Salvador nos dias das gravações de ‘Paô’ e somou junto. Quando retornamos a São Paulo, coincidentemente ele foi também e resolvemos chamá-lo pra participar de ‘Babylon’ [segundo single do disco, lançado em um clipe]”, conta Alfamor.
Honrando os afetos cariocas, vieram as participações de Ana Lomelino (Mãeana) e Camila Costa. “Minhas antigas parceiras de Xanaxou e minhas irmãs pela eternidade, somaram lindamente nas vozes de ‘Sábado Sangue’ [faixa que também já ganhou um clipe], nos recordando daqueles momentos de 2016 no RJ. Ainda, em ‘Sideral Sinistro’, Ana veio pra encaixar sua voz cósmica nesse tema de autoconhecimento astral (do qual sempre compartilhamos muito) e Arthur Braganti veio com seus teclados/synths sinistros abrilhantar o som”.
– Ainda contei com as maravilhosas Sthe Araújo e Victoria Santos nas percussões e Luisa Lembruger na arte sonora de “Alfa”, mulheres de muita força e inspiração; João Leão e Zé Nigro, nos teclados, deram um toque muito especial nas canções; e o poeta Arruda, que, no presente de sua poesia, musiquei “Alfa”. Por fim, convidei as Perotá Chingó, que conheci por nossas viagens pelo mundo, cruzando em diversos países, para participar de “Morada” exatamente por essa nossa conexão de artistas desprendidas pelos caminhos, tendo de sempre relembrar-nos que somos nosso próprio lar. Para minha alegria, elas também toparam rapidamente e, desde Buenos Aires, me enviaram suas vozes.
Como uma colcha costurada pelas tramas das relações, ONÇA chega ao mundo apresentando a musicalidade plural de Alfamor. Ao longo de suas faixas, o que se encontra é uma dança orgânica de referências, que vão do reggae ao funk, do neo-soul à cumbia, da psicodelia ao ijexá. Com letras íntimas que falam de suas vivências enquanto artista, nômade, mulher, Alfamor mostra-se por inteiro amparada pelos afetos. “Eu só posso agradecer por todas essas bençãos que são meu amigues! Só esse processo, pra mim, já valeu tudo. A Onça finalmente sairá da toca feliz”, diz.