Cher lança primeira parte de autobiografia sincera e sem papas na língua


Por:

Renan Guerra

Fotos: Divulgação/Harper Collins, Mert & Marcus/Reprodução Instagram

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Cher é uma figura onipresente na cultura pop dos últimos 50 anos. Cantora de voz única, fez sucesso no final dos anos 1960 ao lado de Sonny Bono, seu marido à época. Também fez história nos anos 1970 com o talk show televisivo que levava seu próprio nome e mostrou versatilidade na carreira de atriz – levou um Oscar para casa, por Feitiço da Lua, em 1988.

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Nos anos 1990, ela bagunçou a música pop ao abusar do autotune em seu single “Believe”, do disco de mesmo nome. Mãe de um homem trans, Cher é um ícone LGBTQIA+ e sempre defendeu suas crenças políticas com a mesma força que domina seus dotes artísticos.

É uma história que não cabe em um livro só, tanto que sua autobiografia – que chegou esse ano ao Brasil, em edição da Harper Collins – é apenas a primeira parte de uma espécie de épico da cultura pop. Cher: a autobiografia (parte um) cobre da infância da cantora até o final dos anos 1970, em um recorte importante para que o livro ganhe em fluidez e para que as histórias possam ser exploradas de forma interessante, sem que o livro vire um calhamaço.

Escrito em primeira pessoa, o livro é como uma deliciosa conversa com Cher, que se mostra sincera e sem papas na língua – ela é a Cher, não é mesmo? E tudo soa extremamente interessante nas quase 400 páginas do livro, desde a infância quase absurda da artista até seus encontros e descobertas da fase adulta.

Após essa leitura, separamos aqui 4 aprendizados que Cher nos traz e aproveitamos para deixar uma dica que pode ajudar a guiar sua leitura:

Cher nos relembra os avanços feministas do século XX

A história de Cher nos relembra como os avanços nos direitos da mulher ainda são extremamente recentes. Uma minissaia da artista poderia ser um escândalo nacional e uma transparência poderia fazer história por sua ousadia.

Iniciando sua carreira ao lado de Sonny Bono, seu marido na época, Cher acabou enfrentando uma reação bastante negativa do público norte-americano quando decidiu se separar de Sonny. Ser uma mulher desquitada nos anos 70 era um afronte, ainda mais vindo de uma mulher que não tinha medo de viver livremente a sensualidade de seu corpo.

Esse é só um exemplo dos percalços que ela enfrentou nos anos 1970, mas ainda podemos elencar a sua dificuldade de ter o controle de sua carreira e de seus próprios rendimentos ou mesmo os questionamentos de suas qualidades enquanto mãe, uma vez que ela se dividia entre a maternidade e o trabalho.

Isso nos relembra como algumas mudanças sociais ainda são tão recentes (e até mesmo frágeis) e como algumas discussões em torno da liberdade feminina ainda seguem atuais. Avançamos em alguns tópicos na mesma medida em que o corpo e a liberdade das mulheres ainda segue sendo alvo de cerceamentos.

Ser artista é um trabalho

Grandes celebridades podem muitas vezes idealizar a experiência artística, ainda mais quando falamos de nomes do pop inseridos em um amplo aparato do showbusiness, porém Cher sempre relembra o quanto a criação artística e sua distribuição – no caso de um produto pop – são processos laborais, que envolvem esforço, dificuldades e alegrias.

Com isso, a artista não tem problema em expor relações complicadas com produtores, fala sem medo sobre experiências negativas em gravações ou turnês e expõe às vezes em que tentaram lhe passar a perna. A artista fala sem rodeios sobre que gosta mesmo de gastar e que, para manter seu estilo de vida, precisa trabalhar e ir atrás.

Família não é sina

A infância de Cher é cheia de mudanças e histórias absurdas. Sua mãe era aspirante a atriz em Hollywood, seu pai biológico desapareceu no mundo e, desde sempre, a pequena menina conviveu com uma série de padrastos – alguns bons, outros questionáveis. Toda narrativa da infância de Cher parece saída de algum filme de realismo italiano e isso marca sua formação inicial, porém em nenhum momento determina padrões que ela seguirá.

Em um ciclo de abandonos, violências e vícios, Cher consegue estabelecer um lar mais seguro para seus filhos. Óbvio que ela também repete padrões de sua mãe com seus filhos: os diferentes padrastos, as mudanças de casa e as cenas absurdas de infância, incluindo os pequenos em uma visita na mansão de Hugh Hefner, isto é, a mansão da Playboy – mas calma, as crianças foram apenas brincar na piscina em um dia livre de coelhinhas.

Nisso tudo, Cher nos lembra que podemos quebrar ciclos e que podemos amar nossa família na mesma medida em que podemos construir limites, isso tudo enquanto criamos novas narrativas para nossas vidas.

Dê espaço ao inesperado, nem tudo nessa vida é um match perfeito

Atualmente encontramos parceiros em aplicativos que checam as nossas compatibilidades, desde o gosto musical até nossas preferências alimentares. Parece uma equação ideal, com a soma dos mesmos padrões. Cher bagunça essa lógica, pois sua lista de namorados, maridos e flertes é bastante diversa: tem artista controlador, ícone do metal, nome importante do rock psicodélico, empresário da música ainda no armário, galã de cinema e outros tipos.

Num virar de página somos surpreendidos por um novo namoro, por um encontro fora de qualquer lógica e, de algum modo, esses encontros funcionam para que Cher se entregue, viva novas experiências e nos mostre que nem sempre o nosso próximo amor estará no óbvio.

É isso, talvez Cher nos ensine que vale apenas expandir nosso radar, abrindo-se para conhecer gente e descobrir a unicidade do outro no inesperado.

Não esqueça: nem tudo nessa vida é mérito

Pode até parece que Cher construiu todo esse legado apenas com talento, suor e ousadia, mas o fato é que durante a leitura de sua autobiografia, não podemos esquecer que a artista estava no lugar certo, na hora certa, com os contatos certos. Por mais instável que fosse a vida econômica de sua família, a artista viveu grande parte de sua infância e juventude nos arredores de Hollywood, tendo acesso e proximidade com diferentes estrelas – que eram inclusive a inspiração de seus sonhos.

Cher era adolescente em Los Angeles nos anos 1960, ela circulava em espaços importantes da cultura da época e, desde jovem, navegou ao lado de alguns dos mais importantes nomes de sua geração. Ela brincou com Liza Minelli no quintal de Judy Garland e ciceroneou os Rolling Stones em uma de suas primeiras visitas a L.A., sabe? Não podemos comparar nossas narrativas com o absurdo da vida de Cher. Ela é quem é por todo esse arcabouço que construiu sua história e para nós, meros mortais, nos resta devorar todas as páginas de seu livro divertindo-se com cada uma de suas passagens.

*Cher: A autobiografia (parte um)Harper Collins (400 p.)

Por:

Renan Guerra

Fotos: Divulgação/Harper Collins, Mert & Marcus/Reprodução Instagram

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