Fotos: Carlos Freitas
Os veteranos do indie rock Dinosaur Jr. se apresentaram neste sábado no quarto dia do festival Rubber Tracks Live, que a Converse realiza no Cine Joia, em São Paulo. A noite também contou com apresentações da banda canadense Fucked Up e as nacionais Single Parents e Churrasco Elétrico.
A organização do evento deixou a desejar em vários fatores: a entrada nos shows era gratuita, conquistada por fãs que se cadastraram na página do festival na internet. Os ganhadores dos ingressos eram notificados por e-mail. Nas mensagens, contudo, havia um porém: “a entrada depende da capacidade do Cine Joia”. Ao chegar nas imediações da casa, já era perceptível que o sistema não deu muito certo; uma fila enorme de pessoas que não conseguiram entrar se alongava cada vez mais na frente do local. Talvez um sistema de retirada prévia de ingressos funcionasse melhor.
Dentro do Joia, ironicamente, era possível andar com tranquilidade, o espaço não apresentava sinais de muita lotação. O que poderia ser um ponto positivo para a organização acaba não parecendo tão legal quando se pensa na galera que ficou do lado de fora. Não é muito bacana “convidar” tantas pessoas para sua festa se grande parte vai ficar para fora.
Outros pontos também foram problemáticos. O sistema de som não suportava os timbres mais pesados das atrações da noite. Já na apresentação do Single Parents, era possível perceber que as bandas foram prejudicadas pelo áudio embolado que saía das caixas; a iluminação dos shows também foi um tanto quanto bizarra: os canhões de luz constantemente eram disparados contra a plateia com uma intensidade muito forte, atrapalhando a visualização dos shows (e provavelmente causando alguns problemas futuros de visão). Durante o show do Dino Jr., parte da equipe filmava a apresentação do meio da pista, atrapalhando os espectadores ao redor (observação: a tal câmera que passeou entre as pessoas ficou literalmente na minha frente por um bom tempo; pude olhar o monitor do equipamento e posso dizer que as imagens nem estavam muito boas). A soma desses problemas atrapalhou um pouco o aproveitamento da noite. O público de qualquer evento sempre merece o melhor tratamento possível, mesmo que não tenha pagado por estar ali (vale dizer que metrô, ônibus, táxi ou mesmo gasolina não são de graça; logo, qualquer presente “investiu” na noite de uma forma outra).
Agora podemos falar de coisas boas? A curadoria da noite foi certeira. Nenhuma banda destoou demais da sonoridade das outras e os horários dos shows foram bem planejados, sem nenhuma espera muito grande entre uma apresentação e outra.
O Churrasco Elétrico e a Single Parents fizeram shows competentes, preparando a plateia para as atrações mais aguardadas da noite: Fucked Up e Dinosaur Jr.
O grupo canadense de hardcore com nome complicado para publicação em países de língua inglesa subiu no palco do Joia para levar o caos em sua forma mais bela.
O vocalista Damian Abraham (também conhecido como Pink Eyes ou Father Damian) disse no começo da apresentação: “tocar em São Paulo é uma das maiores honras que o Fucked Up já teve. O hardcore brasileiro é incrível e único”. Esse clima de reverência e proximidade com o público (costumeiro entre bandas do gênero) se manteve durante todo o show. Damian cantou várias músicas no meio da pista, literalmente abraçado aos fãs. O carisma do cantor ganhou a casa e gerou momentos curiosos (ele chegou a andar até o bar do Joia para cutucar e abraçar um casal que não parecia muito atento ao espetáculo).
No palco, os outros integrantes da banda são mais tímidos, mas compensam com uma execução instrumental poderosa de hits como “Queen of Hearts”, “David Comes to Life”, “The Other Shoe” e também músicas mais antigas, com destaques para “Police”, “Son of Father” e “Black Albino Bones”. O Fucked Up é absurdamente pesado sem abrir mão de ter uma riqueza musical e lírica em suas canções.
Para fechar a noite, o público esperava ansiosamente pela lendária banda norte-americana Dinosaur Jr. O trio formado por J Mascis, Low Barlow e Murph é conhecido pelas tretas colossais entre seus integrantes e não segue uma linha simpática no palco. O primeiro (de poucos) “obrigado” da noite demorou quatro músicas para ser pronunciado.
Aqui, vale uma reflexão: em uma noite com problemas de organização, pensar que a atração principal não está nem um pouco preocupada em ganhar a simpatia do público pode parecer receita para um desastre. Esse provavelmente seria o caso, se o Dino Jr. não fosse tão competente. Os caras tocam (muito) alto, pesado e impressionam pelo virtuosismo na performance de seu set.
Se J não fala com o público, ele deixa que seus rugidos de guitarra passem a mensagem, levando a plateia ao delírio. Entre um gole de vinho e outro, o frontman parece um hippie motociclista saído do elenco de “Sem Destino”. A abertura do show, com “Bulbs of Passion”, derrubou uma explosão shoegaze metaleira sobre os presentes. Não por acaso, o Dino Jr. é considerado uma das bandas mais influentes de sua geração. De Nirvana a Weezer, ou mesmo grupos mais jovens como Fucked Up e o Manchester Orchestra: vários são os nomes inspirados pelos doidões irritadiços de Massachusetts. O repertório foi recheado de faixas favoritas dos fãs, como “Freak Scene”, “Forget the Swan”, “Feel the Pain” e o cover de “Just Like Heaven”, do Cure.
Composições mais recentes (a incrível “Watch the Corners”, por exemplo) completaram a apresentação sem deixar nunca o ritmo cair. Durante o bis, Damian Abraham voltou ao palco para fazer os vocais de “Chunks”, cover da banda de hardcore Last Rights.
Com uma apresentação sólida do início ao fim, o Dino Jr. entregou aos fãs exatamente o show que desejavam, enquanto o Fucked Up conquistou a parte da plateia que não conhecia a banda ao se entregar completamente com uma performance eufórica de suas músicas. Apesar do alto nível dos headliners, é possível dizer: se a música não fosse tão boa, o festival ficaria marcado apenas como uma decepção de organização.