Uma história com Raimundos

11/06/2014

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Lidy Araujo

Por: Lidy Araujo

Fotos:

11/06/2014

Ou minha humilde opinião sobre uma treta que não terá fim mas já acabou

Lembro melhor da primeira vez em que ouvi/vi Raimundos do que da noite passada. Bons tempos de MTV, a janela do mundo… Era uma adolescente do interior em seu primeiro ano morando sozinha na capital. Fiquei tão empolgada com “Nêga Jurema”, que passei o fim de semana inteiro falando sobre a banda numa das viagens quinzenais à minha terra, a querida (e fria) Vacaria.

*

Teve quem ficasse chocado com “Selim” e não conseguisse acreditar que eu gostava daquela bagaceirice toda. Pouco tempo depois, estávamos todos ouvindo juntos o/

Raimundos, como não amar?

Fui ao primeiro show da banda em Porto Alegre. Passei dias decorando as músicas pra cantar junto. Não era fácil. Rodolfo não cantava, vomitava, e aquilo me fascinava. Vi os caras abrindo pros Ramones. Era 1994, e foi lindo! Primeira vez em que chorei num show (confesso que foi por causa dos Ramones, a banda do coração) mas os Raimundos fizeram parte desse momento.

Dali em diante, perdi as contas dos shows – dos Raimundos – a que assisti, até que um dia, lá em Vacaria (veja só, naquela época, grandes bandas tocavam no interior), estava dançando com as amigas na festinha pós-show, quando Digão parou na nossa roda. “Isso aí, meninas, vamos dançar”, disse ele. Imagina a nossa cara de espanto. Não era apenas o guitarrista dos Raimundos dançando com a gente, mas o guitarrista dos Raimundos dançando superempolgado um tal de pipapaparopo (fosse você, não clicava, mas a música é esta aí). Lá pelas tantas, como era de se esperar, ele nos convidou pro camarim. Fomos, e ainda carreguei meu irmão menor de idade (e fã dos caras, em uma de suas primeiras idas pra noite) junto.

Já pensou bobagem, né? Mas sinto em te decepcionar, pois não vou contar uma história picante. Não rolou beijo na boca, muito menos sexo. Bebemos, comemos e nos divertimos com os caras. Digão até ofereceu carona de volta pra Porto Alegre no bus da banda. Calcule (gíria bem do interior, que eu amo!) o choque em casa, caso tivéssemos aceitado. Seria uma cena boa, pelo menos. Às 5h da manhã: “Oi, mãe, acorda, vim dar tchau. Tô indo pra Porto com os Raimundos. Só vim pegar a mala.” Não teria mais herança a uma hora dessas. Ou teria, vai saber…

Lembro perfeitamente também da vez em que estava caminhando com uma amiga pela Vasco da Gama, no nosso amado Bom Fim, e passamos em frente à finada Companhia das Pizzas. Era dia ainda, fim de tarde, e os Raimundos estavam lá, sentados numa mesa na calçada, tomando uma cerveja. “Cara, são os Raimundos!” Andamos mais um pouco (pra disfarçar, porque né…) e demos meia-volta. Eles mexeram com a gente. Foi engraçado e, antes que as feministas me julguem, já aviso: não sou do tipo que se ofende com cantada. Foda-se, sabe? Ou tu dá bola, ou não dá bola. simples. Demos bola, mas não paramos, saímos rindo e temos essa história pra contar. Cheguei ao backstage um tempo depois, já como jornalista que escreve sobre música.

Que orgulho poder ter assistido a tantos shows dos Raimundos das antigas. Que orgulho ter estado com esses caras tantas vezes.

Até que tudo mudou, e lá estava estampada na capa da Capricho, minha professora da vida: “Jesus me salvou”. Era o Rodolfo, ainda com seus alargadores na orelha, contando sobre sua saída da banda. Não lembro bem, mas acredito que foi esse o momento da grande revelação. “E a banda, como é que fica?”, dizia a linha de apoio da manchete de capa (bons tempos de Capricho, aliás). Era isso que eu também queria saber: como é que fica?

Tristeza, mas fazer o quê? Cada um sabe o que é melhor pra si, e a obra já estava lá pra ser ouvida pelo resto da vida.

Um tempo depois, Rodolfo Abrantes voltava a Porto Alegre com o Rodox. Era festa de aniversário da Pop Rock no Cais do Porto, num tempo em que rádios faziam festas de aniversário lotadas a céu aberto (outra saudade…).

Além do Fernandão, o grande, careca e tatuado baterista, a banda trazia um Rodolfo diferente. Consegui perceber, a olhos nus, a mudança do cara. Antes, em todas as vezes em que estive perto dele, via um tipo estranho, sempre meio de canto, quieto, sério, diferente dos outros… Nesse dia, ele estava sorridente, solícito com as pessoas, combinando sessions de surf com meu amigo, visitante frequente da Santa Catarina que tinha virado endereço do cara da sem praia Brasília. Ele já estava sem os alargadores na orelha (ainda pensei em como daria fim aqueles buracos imensos; ajuda, Jesus!), mas as tattoos (e o tanque) continuavam lá. Fiquei feliz pelo cara. Que bom, tinha achado seu lugar no mundo e continuava fazendo rock, com uma banda massa, pesada… E que tinha o Fernandão (se não sabe quem é, clica aqui).

Por outro lado, ficava triste pelos Raimundos. Os tantos altos e baixos nos anos seguintes não eram justos com uns caras tão legais quanto Digão, Canisso e Fred. Até que houve um dia em que caí na real e percebi que eles eram uns sobreviventes. Digão, aquele querido que dançou pipapaparopo com a gente lá em Vacaria, conseguiu, com maestria, segurar o posto que não era dele inicialmente. Canisso foi e voltou, e tá lá até agora. Fred saiu, tá tocando com a Érika Martins, mas Marquim e Caio Cunha seguram a onda de estar na estrada mantendo viva a história de uma banda histórica. Hoje, quando vejo os Raimundos na ativa, lançando disco, fazendo tour, sinto uma espécie de orgulho.

Aí, a Trip traz mais uma entrevista do Rodolfo falando sobre o imenso arrependimento que sente por ter feito parte dessa coisa linda que são os Raimundos. Então, o Digão fica indignado e termina de jogar a merda no ventilador, contando que o cara se arrepende do seu passado, mas não se arrepende de receber os reais que entram na sua conta bancária todo mês por conta de seu passado (ora, desde quando evangélicos não se importam com dinheiro?).

Quem tem razão? Não sei, porque o bastidor de verdade, só conhece quem vive nele (não quem o visita esporadicamente), mas eu, aqui com meus botões, só consigo pensar em:

1. Como é triste ser dependente. Na minha humilde opinião, Rodolfo é o típico. Aquele que acredita ter encontrado o equilíbrio se libertando de um vício pra se entregar a outro. Lembro de uma doida varrida, lá de Vacaria, que se converteu e, segundo as últimas notícias que tive, andava pregando a bíblia pela rua (extremos). Lembro também do amigo louco por sexo que se converteu, passou a crer que a vida só era legal mesmo no celibato, mas só falava de sexo depois da conversão (mais extremos). Me desculpem os fiéis, mas são mundos bem parecidos, de extremos.

2. Como é bom ter saúde suficiente pra aproveitar os altos e superar os baixos. Na minha (de novo) humilde opinião, Digão e Canisso merecem louvores por terem aguentado o tranco e estarem aí, fazendou tour, gravando disco e sendo fiéis ao que acreditam. E que bom que a crença deles é no rock e nos Raimundos. A banda é a sua igreja, graças a Deus! Amém, Senhor!

Rodolfo fez parte e tem seus direitos. Digão, diante da cuspida no prato do ex-colega, também. Pra quem viveu essa coisa linda que são os Raimundos, o que resta? Lá vou eu de novo pra minha humilde opinião: o que resta é respeitar e apoiar os caras. Todos fazem parte (o imbecil do filho do Renato Russo não pensaria assim, mas isso é assunto pra outro post). E eu não posso me meter nas questões sentimentais e financeiras deles. Eles não se metem nas minhas, portanto, que direito eu teria? Fico aqui com minhas lembranças e, com o perdão que o posto de missionário de Rodolfo permita, fico com as músicas dos Raimundos.

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11/06/2014

Lidy Araujo é uma grande mulher. Porém, louca.
Lidy Araujo

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