5 fatos sobre o documentário “Dorival Caymmi – Um Homem de Afetos”

30/04/2024

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Lucas Vieira

Por: Lucas Vieira

Fotos: Divulgação

30/04/2024

Se vivo, Dorival Caymmi (1914-2008) completaria 110 anos nesta terça-feira, 30/4. Em data próxima à celebração, o documentário “Dorival Caymmi – Um Homem de Afetos”, dirigido por Daniela Broitman, estreou em circuito nacional nos cinemas na última quinta-feira, 25/4. Exibido pela primeira vez no festival É Tudo Verdade, em 2019, a obra traz um olhar à essência do artista, mostrando sua personalidade, as relações pessoais, a conexão com a Bahia, a espiritualidade e a musicalidade.

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A opção da diretora por criar um filme focado na personalidade de Dorival Caymmi e não em realizar um documentário sobre sua carreira foi executada com maestria, e é um dos pontos fortes da obra. Embora também apresente diversos momentos históricos da vida do cantor, a escolha aproxima o espectador de sua figura humana, mostrando a pessoa, o pai, o amigo e o esposo, além do artista celebrado.

Um vídeo inédito, gravado no ano de 1998 com tom informal, mostra Caymmi na casa dos amigos Lígia e Marcelo Machado, e é o ponto de partida que permeia todo o documentário. Depoimentos dos filhos Nana, Dori e Danilo, da ex-nora Ana Terra, do neto Gabriel e do produtor Guto Burgos revelam detalhes do convívio familiar e profissional com Dorival. 

Gilberto Gil e Caetano Veloso falam sobre sua relação com a obra do cantor, que teve forte influência em seus trabalhos. O depoimento de Cristiane de Oliveira, cozinheira que trabalhou na casa da família, é um dos brilhos do filme, apresentando detalhes do cotidiano e até do leito de morte do artista.

Os depoimentos em momento nenhum soam acríticos, querendo solidificar uma imagem mitológica da figura humana de Caymmi. Questões como os problemas com álcool e infidelidade conjugal são abordados na obra com transparência. Além das entrevistas e gravações históricas do artista, o filme apresenta imagens de apoio de pescadores, do mar, dos coqueiros e outros cenários baianos que, junto às animações de pinturas assinadas por Dorival, ajudam a compor seu universo estético.

Com realização da Videoforum Filmes, coprodução da Spcine e Canal Brasil, e distribuição da Descoloniza Filmes, “Dorival Caymmi – Um Homem de Afetos” é um retrato sensível do músico eternizado por voz inconfundível de registro grave, abordagem bastante particular do violão e composições que narram o cotidiano e os costumes da Bahia e atravessaram gerações, sendo reverenciadas mais de 15 anos após o seu falecimento.

Confira cinco curiosidades da vida e obra do artista que estão presentes no documentário:

“Guardião da Memória de Xangô”

Entre os fatos narrados sobre a religiosidade de Caymmi no filme, sua ligação com o Ilê Axé Opô Afonjá é destacada. Fundada em Salvador no ano de 1910, a casa tem como tradição conceder os títulos de Obá de Xangô aos sacerdotes (Ogãs) e personalidades que, não necessariamente, pertençam à religião. Os Obás são os braços direitos da Iyalorixá, e surgiram com objetivo de representar o terreiro junto à sociedade, em um momento histórico em que os cultos de matriz africana precisavam pedir autorização à polícia para serem realizados, além de sofrerem diversas violências.

São doze os títulos de Obá de Xangô, que já foram concedidos a personalidades como os escritores Jorge Amado e Antônio Olinto, o pintor Carybé e o professor Muniz Sodré. Dorival Caymmi foi nomeado Obá Onikoi e, no documentário, referiu-se a si mesmo como “Guardião da Memória de Xangô”. Após seu falecimento, a honra foi concedida ao também cantor e compositor Gilberto Gil.

A importância de Stella Caymmi

Embora apareça em poucas imagens do documentário, Stella Caymmi, esposa do cantor, tem destaque na narrativa do documentário. Nascida em Pequeri (MG), Adelaide Torres adotou Stella Maris como nome artístico ao estrear nas rádios, sendo considerada uma das revelações do ano de 1938. No ano seguinte, gravou aquele que seria seu único registro em disco, a valsa “Saudades Profunda”, com Antenógenes Silva, acordeonista parceiro de Ernâni Campos.

A cantora abandonou a carreira para cuidar do marido e dos filhos, ao se casar com Caymmi em 1940. No filme, familiares e amigos ressaltam sua importância para o processo de composição do artista, em que se esforçava para deixá-lo isolado de eventuais perturbações enquanto escrevia suas músicas. Além disso, o documentário inclui histórias sobre como ela conseguia fazer João Gilberto entrar em um avião, a vez em que obrigou Vinícius de Moraes a subir em um palco e também mostra como era a relação de amor entre o casal, incluindo a forma como Stella lidava com a infidelidade do marido.

Dorival Caymmi, o pintor

Assim como retratou a cultura baiana em suas músicas, Caymmi ilustrou as belezas de sua terra natal em pinturas. A técnica principal utilizada pelo artista foi o uso de tinta óleo sobre telas. Em seus quadros, pintou mulheres, pescadores, barcos e outros símbolos da Bahia.

Em um dos trechos mais emblemáticos da obra, o cantor explica a ilustração do clássico disco homônimo de 1972. Um dos cartazes de divulgação de do filme utilizou a obra “Sereia”, ilustração da orixá Iemanjá, divindade muito cultuada na Bahia e é tema recorrente nas canções do artista.

Sucesso na União Soviética

Um momento inusitado da vida de Dorival Caymmi abordado no documentário é sua participação no filme “Capitães de Areia” (“The Sandpit Generals”, 1971). Filmada na Bahia em 1969, a obscura adaptação cinematográfica norte-americana do livro de Jorge Amado foi proibida no Brasil pela ditadura militar e contou também com a participação dos cantores Eliana Pittman e Guilherme Lamounier.

O filme teve um inesperado sucesso na União Soviética, onde, segundo reportagem da BBC, um estudo da pesquisadora Elena Beliakova revelou que estima-se ter sido assistido por cerca de 43 milhões de pessoas. Além de ter feito o papel de um jangadeiro, Caymmi teve participação na trilha sonora, e sua composição “Canção da Partida (Marcha dos Pescadores)”, música-tema da película, tornou-se muito popular na URSS, sendo regravada por diversos artistas. No documentário, uma gravação inédita mostra Dorival interpretando a canção na casa de Tom Jobim, ao lado do maestro e da Banda Nova.

A parceria com Carmen Miranda

O filme mostra o trecho de uma conversa entre Caetano Veloso e Dorival Caymmi, registrado em Roma, no ano de 1983, em que os cantores baianos conversam sobre a importância do autor de “Samba da Minha Terra” na formação estética de Carmen Miranda, artista que teve papel fundamental na divulgação da música brasileira internacionalmente. No vídeo, o cantor responde que teve sim influência nos famosos gestos da cantora: “Ela ia se vestir de baiana, eu digo: ‘Se você vai se vestir de baiana então você tem que fazer os trejeitos de baiana’”.

Ao mesmo tempo, a cantora foi essencial na história de Caymmi, uma vez que, graças a ela, o artista fez sua primeira gravação em disco, no 78 rotações que contém as faixas “O Que É Que A Baiana Tem?” e “A Preta do Acarajé”, lançado pela dupla em 1939. A  partir desse encontro, o cantor viu sua carreira deslanchar, como contou em entrevista a TV Cultura: “A Carmen Miranda passou a ser uma mudança radical na minha vida. Eu deixei de ser o doutor de direito e advogado na praça para ser artista. Com ela eu entrei com pé direito e passei a ser conhecido e citado na imprensa”.

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30/04/2024

Lucas Vieira

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