Apeles se inspira na vida noturna para compor as 10 músicas de “Estasis”

23/09/2024

Powered by WP Bannerize

Isabela Yu

Por: Isabela Yu

Fotos: Divulgação/ André Dip

23/09/2024

Em seu terceiro disco como Apeles, Estasis, o músico Eduardo Praça reuniu colaboradores de diferentes lugares do mundo. Lançado no final de julho, o trabalho possui co-produção de Thiago Klein, co-direção musical de Hélio Flanders, e participações dos brasileiros Lucas Gonçalves, Sonia Bernardo, YMA e Gustavo Bertoni. Somam-se a eles o duo coreano HAEPAARY, a francesa CHEWY SHE, o cantor Colombre, a argentina Fransia e a grega Lena Platonos

A princípio, o artista, integrante das bandas Quarto Negro e Ludovic, imaginou o conceito do registro como narrativas que se reúnem no Estasis, um lugar noturno, que engloba as sensações de solidão e êxtase presentes nas canções. “O álbum tem todos os tipos de instrumentação, traz música eletrônica, muitos sintetizadores, muitas coisas diferentes”, explica sobre o registro. O registro encerra a trilogia formada por Rio do Tempo (2017) e Crux (2019). 

*

Leia um faixa a faixa do disco: 

“Year of the Estasis”: Quando o álbum começou a tomar forma, percebi que gostaria que ele não fosse apenas um registro sonoro, mas um lugar a ser frequentado, então logo comecei a construir o que é uma pessoa andando em direção ao show, passando pelo banheiro e enfim em frente a banda. Trabalhei com paisagem sonora para cinema por muitos anos e é um recurso criativo dos mais empolgantes – mexer com sensações do corpo, perceber as mudanças acústicas, etc. Para o diálogo, escolhi o incrível duo sul-coreano HAEPAARY, que justamente mexe com poesia acidental coreana, para falar sobre a última noitada delas.

“Fragment”: Foi a primeira música a ser produzida, porém a última a ser finalizada. Para mim é a faixa mais importante do disco, porque é onde situa o personagem central do álbum, no clube de disco ESTASIS. Amo como a cantora francesa CHEWY SHE compôs a letra, tudo é soturno, sensual, desesperado e brinca com a dualidade vazia/intensa da noite. A minha faixa favorita do álbum.

“In God’s Hand”: Canção de fuga, velocidade, estrada e música alta. A cantora Bernardo, brilhantemente definiu “nails deep into the seat” como o mote da música – o transportar apreensivo, seja em um táxi ou uma viagem, quando você está no banco de trás e as mãos acidentalmente esbarram na sua dupla. Nos shows é uma das mais empolgantes, soa ainda mais poderosa com as guitarras ao vivo.

“Ossos em Chamas”: Das dez faixas do álbum, três são canções natas e essa é uma delas. A ideia era que a banda residente de Estasis tivesse um crooner como seu habitué, como acontecia em muitas das casas noturnas nos anos 70, mas que a letra fosse o oposto disso, ela fala sobre um corpo em chamas internas gritando por socorro. Escrevi essa letra quando fiz uma viagem e esqueci um remédio que tinha que tomar rotineiramente, a abstinência dele causou um calor no corpo, imaginei esse crooner preso no próprio calor. Harmonicamente acho que é uma faixa diferente do que já havia escrito e as guitarras de Lucas Gonçalves são um espetáculo à parte!

“Magical/Rational”: Não imaginava incluir um rapper nas minhas músicas, mas durante o processo de produção do álbum passei alguns meses imerso em spoken word, coisas como Kae Tempest, John Cooper Clark, então logo fui atrás de um representante britânico que pudesse representar essa vontade. Ter o Awate com sua poesia afiada é um privilégio enorme, talvez seja a primeira música mais politizada do meu trabalho solo. É sem dúvida um caminho que ainda não havia desbravado.

“Puro (Leviticus 13:1)”: Outra canção clássica, que se aproxima mais dos meus trabalhos anteriores. A citação bíblica vem de um trecho que falava sobre vitiligo, como uma pessoa com a doença, não era considerada “pura”. No começo da pandemia eu tive vitiligo e a recomendação médica era que eu ficasse dois minutos ao sol por dia, o que foi diretamente para a letra do refrão. A chave de ouro vem com o genial Colombre, cantor italiano que adicionou uma linda estrofe que fala subliminarmente sobre Maria Antonieta, que também sofreu de vitiligo.

“Lábios Mentem à Distância”: Por muitos anos, fiquei obcecado e machucado, quando mentiram pra mim pelo telefone, demorei muitos anos pra exorcizar isso e talvez agora tenha sido o momento. Também sou fascinado pelo livro/monólogo de Jean Cocteau “A Voz Humana”, do qual se trata de apenas um lado de uma pessoa ao telefone, é brutalmente genial. Convidei dois dos meus cantores favoritos brasileiros, YMA e Gustavo Bertoni, para dividir a intensidade e visceralidade da faixa.

“Todos os Santos Permitidos”: Essa faixa mostra a genialidade por trás do meu companheiro de Quarto Negro e co-produtor do álbum, Thiago Klein. Ela foi feita em uma hora no intervalo das produções do álbum, estávamos no interior de São Paulo produzindo as faixas e fui descansar. Quando voltei, ele havia feito a track toda com samples e improvisações. Quando comecei a esboçar a letra, pensei que seria incrível que funcionasse como uma espécie de provérbio de arrependimentos ou libertações, então convidei a incrível artista argentina Fransia para escrever e cantar. Me orgulho muito do resultado, foi tudo muito espontâneo e uma das mais leves e divertidas músicas de se produzir no álbum.

“Blefe, Prova, Posse”: Esta é a faixa mais ousada do álbum, considero que são três canções em uma. A primeira parte é com Jair Naves, meu companheiro de Ludovic. Sua fala é das mais intensas e poéticas possíveis, direto e visceral. Logo após, entra a cantora e lenda dos sintetizadores grega Lena Platonos, que tenho um orgulho gigante de estar no meu álbum – essa é a parte mais imaginária, sobre a saudade e nostalgia. E por fim, a parte do meu querido amigo e co-diretor artístico do álbum, Hélio Flanders. Ele escreve as frases mais lindas da música brasileira, a sua imaginação me provoca sorrisos instantâneos. Nesse trecho, escrevemos juntos sobre a ruína de um apostador de cavalos em analogia à própria ruína do personagem na noite. Tudo isso em um groove de sintetizadores envolvente e nostálgico, uma das minhas prediletas.

“Pax, Patz, Paz”: Outra das canções do disco, essa a favorita do amigo Hélio Flanders e também com participação do virtuoso Lucas Gonçalves, que além de tocar diversos instrumentos no disco, também divide as vozes comigo. É a despedida da boêmia, a última valsa, pois o personagem do álbum já cansado do vazio da noite, então prefere descansar e voltar a sua pacata realidade. O último verso é uma localização geográfica em São Paulo, na esquina da rua Bahia com a rua Goiás no bairro de Higienópolis, onde ficava o meu pub favorito, Little Cronin. Ele foi como um sonho vago, começou e acabou rapidamente, mas deixou memórias, assim como Estasis, embora fictício, vai ficar por muito tempo habitando o meu subconsciente.

LEIA MAIS

Tags:

23/09/2024

Isabela Yu

Isabela Yu