No dia 3 de novembro de 2019, o Parque de Exposições, em Salvador, tornou-se palco de um encontro histórico. Naquele dia, mais de 30 mil pessoas testemunharam o lendário Gilberto Gil se juntar ao revolucionário BaianaSystem para uma apresentação inédita. O show especial, no qual os artistas misturam seus repertórios, foi o lançamento do projeto “Encontros Tropicais”, idealizado pela Devassa, e trouxe ainda as apresentações de Luedji Luna, Ministereo Público e DJ Patrick Tor4.
A união de Gil com Baiana foi registrada no álbum Gil Baiana Ao Vivo em Salvador, lançado em vinil com exclusividade no NOIZE Record Club. O show motivou ainda o documentário Encontros Tropicais, produzido pela NOIZE e lançado com exclusividade no Globoplay. Dirigido por Lucas Tergolina e Rafael Rocha, que dividem o roteiro com o documentarista Ariel Fagundes, esse é o primeiro material do projeto musical “Tropical Transforma”, que contará com as plataformas Globo para promoção e distribuição de conteúdo. O lançamento revela trechos do show, os bastidores dos seus ensaios e mergulha ainda nas conexões que existem entre as culturas da Bahia e da Jamaica.
O documentário possui 38 minutos de duração e está disponível gratuitamente, basta criar seu login gratuito na plataforma. Assista aqui e veja trailer abaixo:
Para o diretor Rafael Rocha, “esse documentário é um documento histórico, um retrato musical da união de dois importantes alicerces da cultura baiana e brasileira”:
– Tão importante nos dias de hoje, contar a nossa história e o legado da nossa cultura é uma responsabilidade necessária. Através de um mergulho na criatividade brasileira, buscamos entender como ela se retroalimenta ao longo dos anos e se comporta num encontro de diferentes gerações. Uma homenagem cinematográfica à cultura e ao povo brasileiro – afirma.
“A essência da música brasileira foi apresentada por grandes artistas de diferentes gerações, acho que o documentário buscou mostrar isso”, completa o diretor Lucas Tergolina. Na visão do gerente de marketing da Devassa, Gabriel D’Angelo Braz, “o documentário glorifica a essência tropical brasileira, a criatividade que faz da nossa música algo único”.
Durante o processo de entrevistas para o documentário, Gilberto Gil fez questão de expor sua admiração ao BaianaSystem e comentou as referências que lhe vêm à mente quando ouve a banda: “O som deles é um som potente, muito associado a essa incorporação mais musculosa dos sons eletrônicos e dos beats sintetizados”, disse.
– Tudo isso com a guitarra baiana do Beto [Barreto], que é o trio elétrico, é o Carnaval, e com o rap, que é um gênero mais atual. Eu fico me lembrando do The Last Poets, que começou com essa coisa toda, e do Joe Gibbs com seus dubs lá na Jamaica. Eles são a junção de tudo isso. E com esse pertencimento à música da Bahia, ao modo da Bahia, a essa impregnação que a cultura negra dá ao modo baiano de ser. É tudo isso. Eles são música contemporânea brasileira, baiana, e sem dúvida alguma com um pathos, um tempero internacional muito forte.
Já Russo Passapusso explicou que a formação do repertório desse show foi baseada nos principais pontos de conexão que existem entre a obra de Gil e do Baiana. “Pra mim se divide em três matrizes: tem o ijexá, tem o reggae – que são praias que a gente ama e tem intrinsecamente dentro da gente – e tem a mensagem, a necessidade de colocar algo para as pessoas”.
Durante um final de semana inteiro, Gilberto Gil e BaianaSystem ensaiaram em Salvador, no estúdio do Candyall Guetho Square, de Carlinhos Brown. Foi ali que clássicos de Gil como “Extra”, “Sarará Miolo” e “Emoriô” ganharam o embalo dos beats do Baiana, assim como “Água”, de O Futuro Não Demora (2019), foi abençoada com os vocais de Gil.
Pesquisador dedicado há muito tempo e profundo conhecedor da obra de Gil, Beto Barreto explica que foi muito fluido o processo de aprender suas canções e recriar suas bases. “A gente teve, inicialmente, que tirar as músicas como eram pra tentar ficar o mais fiel ao original. Depois, fomos achar a forma que a gente ia fazer. Mas foi muito natural, as próprias coisas que o Russo inseriu”.
– No final das contas, a gente tá fazendo música com ele podendo pegar alguns recortes de letras que a gente fez. Tem uma coisa muito bonita que tá acontecendo: Beto fez uma melodia de uma canção, “Ubaranamaralina” [faixa do disco de estreia da banda, BaianaSystem (2009)], que é uma referência a “Eu Sou o Carnaval”, de Moraes Moreira e [Antonio] Risério, e naquela época eu fiz uma letra que fazia menção à letra original, e já fiz pensando em Moraes, no processo do Carnaval, transformando a coisa meio em Augustus Pablo, em reggae… E agora eu cito essa letra dentro de “Nos Barracos da Cidade” – comentou Russo durante os ensaios pro show.
Ele e Beto lembraram também que já estavam tocando quando Gil chegou ao estúdio no primeiro dia de ensaios juntos e, segundo eles, desde que Gil botou os pés na sala, já começou a aula. “Foi engraçado. Ele chegou na música mais difícil, no meu entendimento, que era ‘Sarará Miolo’, e quando ele chegou a gente estava passando e ele entrou e já começou a falar da música”, disse Beto. “Gil ensina o tempo todo, ele já chegou ensinando. A seriedade que ele tem com a música, é de aprender. Todo mundo ficou besta olhando e tentando captar como atingir essa leveza. É surreal. E a influência que ele tem na nossa vida é além música, com certeza. Gil é um parâmetro”, resumiu Russo.
Essa cena de Gil entrando no estúdio está registrada no documentário Encontros Tropicais, que revela ainda a filmagem completa de “Nos Barracos da Cidade”, clássico do Dia Dorim Noite Neon (1985).
Assista agora para sentir na pele como foi essa união de mestres.