No último final de semana, em dias de sol e calor, no Memorial da América Latina, em São Paulo, ocorreu o Coala Festival 2023. Os três dias da nona edição do evento chegaram pra confirmar mais uma vez a sua vocação enquanto um espaço de celebração e valorização da música brasileira.
Além da curadoria instigante, que mistura diversas gerações e vertentes da música que se faz no Brasil (do rap ao carimbó, do pagode ao rock), o Coala mostra reiteradamente, ano após ano, que é possível produzir um festival em que o público não passe perrengue. Banheiros limpos e, na maior parte do tempo, sem filas, organização na entrada e na saída, ótimos bares e restaurantes.
O line-up do evento contou com diversas parcerias inéditas entre artistas que, com certeza, ficarão marcadas na história da música brasileira. Na sexta-feira, o público deixou transparecer certa incredulidade quando, de surpresa, Péricles parou sua apresentação e, rasgando elogios no microfone, chamou Tim Bernardes para cantar e tocar guitarra em duas músicas.
Mesmo as parcerias previamente anunciadas não deixaram de surpreender: na semana em que completou 80 anos, o genial Marcos Valle estava acompanhado de ninguém mais, ninguém menos que Joyce Moreno e Céu. Os três cantaram juntos o clássico “Samba de Verão”, emocionando o público do festival. No mesmo dia, domingo, última data do evento, a aniversariante Marina Lima subiu ao palco e ouviu a multidão na plateia cantar em coro “Parabéns Pra Você”. Depois, chamou a carioca Fernanda Abreu, com quem revezou o microfone e cantou em dupla o hino “Fullgás”.
Vale destacar o show do mestre Jards Macalé, que convidou Ana Frango Elétrico para uma participação histórica, cheia de energia, gritos, dança e emoção. Ana cantou o clássico “Mal Secreto” enquanto o público ia à loucura.
A novíssima geração da música brasileira também marcou presença no Coala Festival. A baiana Jadsa cantou, acompanhada de sua banda com backing vocals e sopros, as canções de seu álbum Olho de Vidro (2021) e ainda homenageou Arrigo Barnabé interpretando “Diversões Eletrônicas”. Já o alagoano Bruno Berle fez, no palco principal do festival, seu primeiro show com banda completa, contando com Batata Boy nos beats e Tori na guitarra. Bruno também chamou ao palco a talentosa Bebé Salvego, que cantou uma composição de seu álbum de estreia, Bebé (2021).
Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo, que acabou de lançar seu segundo disco, Música de Esquecimento, também levou o seu rock’n’roll debochado ao Coala. Letrux, que contaria com a companhia de Angela Ro Ro, precisou apresentar-se sozinha, devido a problemas de saúde daquela. A carioca, entretanto, superou o imprevisto e entregou um dos melhores shows do festival, repleto de performatividade, incluindo até truques de mágica, com músicas de seu novo álbum (Letrux como Mulher Girafa, edição atual do NRC) e do já clássico Letrux em Noite de Climão (2017).
Para quem não estava a fim de curtir um ou outro show, mas ainda estava na pilha, o espaço clubber do festival contava com sets de DJs da Tijolo Records ao longo dos três dias de evento. No palco principal, KL Jay, o lendário DJ do Racionais MC’s, também botou o público para dançar.
O rapper cearense Don L realizou um show com Thiago França no sax, Fernando Catatau na guitarra, e Terra Preta e Alt Niss nos vocais, cantando rimas dos seus álbuns RPA Vol. 3 (2017), RPA Vol. 2 (2021) e Caro Vapor/ Vida e Veneno de Don L (2013). Já o mineiro FBC cantou o repertório de seu novo álbum, O Amor, O Perdão e A Tecnologia Irão nos Levar para Outro Planeta (2023), levantando o astral da plateia.
Representando o Norte do Brasil, a gigante Fafá de Belém mostrou toda a potência de sua voz cantando clássicos como “Vermelho”. Também vindas do Pará, as Suraras do Tapajós (integrante da Associação de Mulheres Indígenas) deram uma linda amostra ao público da riqueza e diversidade da música dos povos originários brasileiros.
Durante os três dias de evento, os últimos shows da noite foram os únicos que se estenderam ao longo das horas. A junção OlodumBaiana (Olodum + Baianasystem) fez com que a multidão abrisse, por quase duas horas, a já tradicional roda, que costuma acontecer nas apresentações do BaianaSystem, deixando-se levar como em uma grande maré humana, com muita dança, suor, energia e empurra empurra. Já no sábado, o público do Coala teve a oportunidade de ver o primeiro show dos Novos Baianos em comemoração aos 50 anos do imortal Acabou Chorare (1972), ainda que o setilist tenha completado canções de vários álbuns, como “Dê Um Rolê” (clássico de 1971, imortalizada também por Gal Costa) e “…Na Cadência do Samba” (de Vamos Pro Mundo, de 1974). Baby do Brasil, Pepeu Gomes e Paulinho Boca de Cantor deixaram o público em êxtase e ainda fizeram uma justa homenagem a Moraes Moreira e Luiz Galvão, falecidos recentemente.
Para encerrar o evento com chave de ouro, Jorge Ben Jor e sua banda levaram o Coala Festival à loucura. O rei do samba-rock cantou boa parte dos hinos imortais de toda a sua carreira, com a simpatia que lhe é característica e energia inigualável. O jovem público cantava em coro praticamente todas as canções, algumas com mais de meio século de idade, do repertório do alquimista. No final, Jorge Ben nos deliciou ao sentar-se na bateria e mostrar todo o seu groove, em um momento completamente inesperado para todos que assistiam ao show.
Em suma: o Coala Festival ficará marcado nos corações de todas as pessoas que passaram pelo Memorial da América Latina nos dias 15, 16 e 17 de setembro de 2023. Agora, o que nos resta é esperar ansiosamente pela edição do ano que vem!
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