Na tarde do dia 11 de abril, a NOIZE foi até o bairro Bom Fim, em Porto Alegre, onde fica a casa de Arthur Teixeira, vocalista da banda Volantes. João Augusto, o Jojô, guitarrista, também estava lá. Dentro de pouco mais de 24 horas, os dois estariam no Pepsi On Stage, onde a Volantes abriria o show do Placebo. Bem humorados, entre discussões sobre cervejas estrangeiras e festas portoalegrenses, os dois músicos conversaram (com a revista e entre si) sobre o início da banda, as influências, o show com o Placebo, a internet e uma frase do Bon Jovi que abriu a mente de todos.
O que você vai ler é a primeira das três partes em que a entrevista foi dividida. Navegue pelas três partes clicando nos links abaixo. Boa leitura!
Texto: Gustavo Foster
Fotos: Ana Laura Malmaceda
NOIZE: As campanhas de vocês, principalmente na internet, têm dado certo. Desde o Maquinaria à abertura do show do Pato Fu (no MySpace Secret Shows, na qual foram escolhidos através de votação). Vocês consideram o público da Volantes concreto?
Jojô: Tu que tá afirmando que tá dando certo, né.
Arthur: Eu acho que… Que que tu acha, Jojô?
J. Não sei, às vezes parece que é mais um momento do público
A: Eu acho que a gente tem pouca gente, mas pouca gente que acredita muito na historia. São pessoas que se pilham em mobilizar. Porque, na verdade, se aparece uma votação dos Volantes hoje, não vai ter 500, 1000 pessoas divulgando, de imediato. Não vai ter 20 pessoas. Mas quem se mobilizar vai chamar mais gente. Tanto que hoje, se a gente fizer um show em Porto Alegre, vai penar pra botar 100 pessoas, 200.. Não sei, a gente não faz show desde outubro.
J: Desde o lançamento do álbum.
A: Mas, enfim. A gente ainda tem que penar muito pra divulgar show, a gente não tem um público, não é só anunciar no cartaz: “Volantes”. Então eu acho que ainda não tem um público formado, mas há pessoas que se pilham em mobilizar pela banda.
J: E eu acho que as pessoas a gente só descobre quem são nesses momentos. Não consigo identificar essas pessoas, só nesses momentos de ajudar a banda.
A: Se tu considerar que a gente começou do zero mesmo – eu considero como ponto zero o lançamento do disco, como “antes e depois de Cristo”, acho que ali mudou tudo, a gente pôde passar a cobrar das pessoas. Não vou chegar para um amigo meu e falar “vai no show “. Ele vai falar “por quê?”, e eu vou responder: “não sei”. Ele não tinha música decente para escutar, e agra ele tem. Então, a partir dali, a coisa crecseu bastante. Cada caso é um caso: Maquinária foi um tipo de coisa, o que vem depois é outro. Então é meio que uma evolução. Nesse lance do Placebo, a gente lançou um Twitpic e deu 2000 views. São coisas que a gente tá mensurando o tamanho ainda, a gente tá numa lomba muito íngrime, muito ascendente. Mas a gente tá lá embaixo, ainda. A cada semana, a pilha é uma. Todo dia, quando eu acordo, a primeira coisa que eu faço é abrir meu email, e eu nunca sei que bomba que vai ter. E é uma bomba boa. “Vai abrir pro Placebo”, “tá indicado ao Maquinária”. Eu nunca penso que seja uma bomba boa, daí eu abro e vem um negócio foda. Daí eu vou abrir o twitter e já tem 300 comentarios sobre o Volantes, e eu tava dormindo, sabe? A gente tá nessa fase ainda. Vai ter uma hora que vai estabilizar um pouco. E vai ser bom.
E como rolou com o Placebo?
A: Cara, Placebo foi da Opus (Opus Produções, produtora do show do Placebo em Porto Alegre). Eles mandaram um e-mail: “vocês tão livres dia 13?”. A gente tava em SP quando chegou esse e-mail.
J: É, a gente tava no Estúdio Trama.
A: Daí chegou uma DM no meu Twitter. E eu acho que isso já mostra que a gente não tá precisando ir atrás de certas coisas. A Opus fez lá uma reunião: “precisamos de alguém pra abrir pro Placebo em Porto Alegre”. Daí pensaram: “banda X dos mod, banda X dos não sei que… Cara, tem o Volantes”. A gente tá começando a entrar na pauta das pessoas, e isso é interessante. A gente não tá precisando incomodar tanto.
Como vocês falaram, antes vocês não tinham argumento, sem gravação nenhuma. Tu acha que ainda é importante a gravação física?
A: Não, acho que o físico não tem tanta importância pra que a coisa aconteça. Como a gente é uma banda honesta, não é uma banda pré-fabricada, o que nos destaca é a qualidade da música. Se tu tiver uma música afudê, ela vai viralizar, ela vai ser passada de um pra outro. E foi isso que eu sempre falei pro Jojô, a gente sempre se agarrou nisso, em acreditar que a gente ia ter uma música e que as pessoas iam passar pra outras e elas iam gostar. A gente nunca se preocupou muito em “ah, temos que fazer um CD e mandar pra uma gravadora”, pra alguém bancar. Acho que as pessoas vão fazer isso. Acho que a gente teve alguns cases recentes que fizeram isso, que se reinventaram no boca a boca.
Tipo?
A: Tipo o Los Hermanos. Que é uma banda que criou um público no segundo disco (“Bloco do Eu Sozinho”, de 2001). O público do primeiro disco não existe mais. E eles saíram com um disco com 20 mil cópias vendidas, e…
J: …fazendo show pra 500 pessoas. Era uma banda que tocava pra multidões, todos esses grandes festivais, no Brasil todo. Grandes festivais, tipo Salvador. Chiclete com Banana! E aí, depois se reinventou, reinventou o publico.
A: É, eles falaram “nós não vamos fazer show pra vocês, pra vocês não dá”. E eles tiveram que sair com a caixinha de CD debaixo do braço. Os 20 mil que venderam foram porque as Lojas Multisom (loja de discos famosa no Rio Grande do Sul) acharam que ia ser outra Anna Julia. E não era, se fuderam. Mas depois vendeu, igual. E foram vender na estrada. Construíram um público na estrada. Com isso, ficou claro que é possível uma banda no Brasil construir um publico sem a mídia colocando ela em rádio, só via viralização na internet.
Vocês trabalham pra banda, fazendo um trabalho de Relações Públicas, inclusive. Até que ponto isso ajuda ou atrapalha a banda?
A: Atrapalha muito. No sentido de geração de conteúdo.
J: (risos) É verdade.
A: Tipo, eu não escrevo uma música boa desde maio do ano passado.
J (interrompendo): Essas últimas que saíram são de maio do ano passado?
A: São de maio do ano passado.
J: Ah bom, porque eu até comentei com o Bernardo (baixista da Volantes): tu tá na tua melhor fase. Disparado.
A: Chegou ao ponto que tá meio mecânico, eu tenho que parar de fazer música. As músicas vêm. Agora eu preciso fazer isso dar certo. Depois, no segundo disco, eu escrevo mais músicas. Teve uma hora que eu fiquei obrigado a fazer isso. Botei o teclado de lado, larguei a agência, agora a banda é minha conta e eu tenho essas canções aqui e elas são OK. Agora, vamos fazer ela estourar.
E a publicidade (Arthur fez faculdade de Publicidade) foi importante pra tu saber fazer esse trabalho?
A: Muito importante. Até porque me deu embasamento, noção de marketing, de mercado, de como funciona o mercado. Isso me fez ter argumentanção. Eu tenho o Jojô, que é um cara muito “da rua”, como eu falo. “Da rua”, hoje, é a internet. É um cara que conhece todo mundo. Conhece todo mundo e sabe o que tá acontecendo. E eu sou um cara mais da academia.
J: (risos)
A: Todo o tempo que ele passou conversando com a galera, conhecendo, eu passei lendo essas porras desses livros de publicidade. Por exemplo, a gente é uma das primeiras bandas do Brasil a ter Twitter. Não sei se não é a primeira. Eu estudava novas mídias, daí eu vi: “ah, saiu uma ferramenta lá no Texas”, daí fui lá e peguei. Eu vou marcando o login pros Volantes, todos. Só que daí não tinha pra quem a gente twittar, ninguém tinha twitter. Era eu seguindo a banda e a banda me seguindo (risos). Então tem essas coisas que se completam. E é legal, porque a gente conversa, eu coloco meus argumentos de academia e ele coloca os deles da prática e fecha muito. Eu acho que isso é uma coisa que movimentou muito a gente. E até quando a gente faz reunião com gravadora, eu sempre gosto que estejam os dois. Porque eu tenho uma segurança com o Jojô. Eu sei que o que ele falar eu assino embaixo.
J: É, e vice-versa, também.
(Arthur gesticula como se estivesse jogando confetes)
Em entrevistas, vocês citam Caetano Veloso, Joy Division, Radiohead como grandes influências. Essas influências aparecem em que elementos da banda?
J: Tem mais gente, na verdade. Tem o Fábio Junior, aqui (mostra disco do Fábio Junior).
A: Cara, nós todos somos ratos de música. Todos consomem muita música. Tipo, rola de eu baixar, por dia, uns 5 discos que eu não tenho. E eu consumo muito música pop. Eu costumo por tudo como uma grande coisa. Eu gosto de toda a música pop e acho que tudo me influencia. Funciona mais ou menos assim: me dá uma inspiração, uma coisa me inspira. Eu vejo uma fotografia, ouço uma música, e abre um portal, tipo aquele que tinha no He Man, que abria e ele ia pro castelo de Greyskull. Daí eu sei: tá, agora é a hora. Aí eu fecho a porta, desligo o telefone e fico 4 horas no teclado ou na guitarra, baixando essa música. É assim que funciona. Por exemplo, quando eu pego um disco, eu falo “cara, eu não posso ouvir esse disco agora, porque eu sei que eu vou ouvir ele e vai me dar esse negócio”. E é assim: põe, eu ouço 20 segundos da música e tenho que dar stop. Daí eu vou lá e escrevo uma música que não tem nada a ver com aquela. Ela só me leva pra um tipo de sentimento. Então eu não posso dizer o que cada coisa influencia, onde o Caetano influencia, onde o Roberto influencia, onde o Justice influencia. Tem a questão estética, que a gente gosta, que é a qeuestao do pós-punk, do indie dance, aquela coisa. Mas se eu te disser as coisas que me influenciam pra cantar, tu vai rir. Eu vou te falar de mulheres que eu gosto, vou te falar de texturas que eu gosto. Então eu acho que não tem um ligação muito direta, na questão de composição, de como escrever uma música. Aquela música que tem o (cantarola o teclado de “Um Pouco Disso”), sabe essa? Eu peguei aquele disco Radio-Activity (quinto álbum do Kraftwerk, de 1975), que eu ganhei de presente da minha namorada na época e cheguei com ele em casa, botei no prato, pra ouvir. Deu 15 segundos, eu tirei, fui pra garagem, peguei a guitarra e comecei (cantarola “Um Pouco Disso”, de novo). E fiquei duas horas tocando esse riff, enlouquecido, e comecei a escrever a letra ali, e saiu a música. Porque eu ouvi 15 segundos de um disco. Porque daí eu já pensei “ah, depois vem isso”. Que nem teve uma musica que eu comprei um disco, olhei ele antes de abrir e pensei “cara, acho que aqui dentro tem isso”. Daí escrevi e não tinha nada a ver com o que tinha no disco. Então é meio assim, o lance te deixa num estado diferente, pra mim é um estado diferente na hora de compor. E quando não é assim, quando é forçado, laboratorial, tipo “tô afim de escrever uma música assim”, geralmente não sai boa.
Mas já rolou?
A: Ah, sim. O cara tenta, né. Pra escrever 10 musicas boas, tu escreve 100. Ruins. Mas hoje eu tô conseguindo. Como eu uso muito o tempo para a parte executiva, como eu chamo, no laptop, eu já sei quando não vai vir musica boa. Eu sei quando vem forte. Daí eu só escrevo as boas, agora. Elas tão aqui, mas eu não vou deixar elas saírem. Vou lá e boto outra música, sei lá. Então hoje eu só escrevo as boas. Antes, eu escrevia as ruins, também. Eu tô conseguindo controlar esse processo, cortar antes que ele venha. É bizarro.
J: Eu sinto que, essa parte de influências, todos os artistas que foram citados são artistas gigantes, e eu acho que a personalidade deles influencia na hora que tu vai pensar em ter uma banda e tu também ser peculiar. Uma coisa muito interessante nessa gravação do Rio, que o Rafa até comentou…
Que gravação do Rio?
A: A gente gravou um compacto, tipo esse assim (mostra o mesmo compacto do Fábio Junior), e a gente vai lançar daqui uns 2 ou 3 meses, não sabemos como ainda, mas vai ser lançado.
J: Com produção do Rafa.
A: Produção do Rafa Ramos, do Baba Cósmica.
J: E ele falou uma coisa muito real, sobre uma música lá, mas que serve pra qualquer tipo de arte: “ah, não importa o tamanho do artista, não é isso que importa, o que importa é tu ser grande”.
A: Ele falou isso?
J: Falou. Falou pra mim, na mesa.
A: Ah, é? Mas ser grande em que sentido?
J: De ser desde Queen ate TV on the Radio.
A: Tá, mas onde que o TV on the Radio é grande? Só quero entender.
J: No sentido artístico.
A: Ah tá! A obra ser atemporal. Ah tá, entendi.
J: Então, nós somos muito fãs de música. Fã de música. Não é fã de um estilo. É fã de música. Sei lá, tem Bach ali no meio. Tem Roxette ali no meio (e aponta para a coleção de vinis do Arthur). Então, eu acho que todos esses artistas demonstram o quanto a gente gosta de uma estética, mas a gente não é preso a uma estética. A gente é preso ao foco de fazer canções boas. É pra isso que a gente tem uma banda.
A: É.
J: E sem prepotência, não é uma questão prepotente. É um ponto, um foco nosso.
A: É, porque é uma coisa que convergiu, a gente gosta disso. Independe da estética, tem que ter uma canção boa. A gente gosta de folk, a gente gosta de Kraftwerk, a gente gosta do que for, mas tem que ter uma musiquinha (cantarola uma canção fácil) que tu goste de assobiar. Isso é uma coisa que a gente tem em comum. Eu sou muito pela música pop. E pop não no sentido pejorativo, pop nesse senttido bacaninha, de cantar, de te embalar junto. A gente tá fazendo muito o que a gente gosta. De repente as pessoas vão olhar “ah, vocês fazem um som mais grandão, mais pra massa, não sei o que”. Cara, me dá muto prazer fazer isso, porque eu gosto de ouvir isso. Tipo, meu guitarrista mór é o The Edge, do U2. Eu gosto de “With or Without You”. É isso que eu gosto. Tá, eu ouço também o TV on the Radio. Eu gosto pra caralho de Radiohead, é a banda que eu mais ouvi no mundo. Mas o que me bate mesmo é a música pop. É o “How Do You Do”, do Roxette, é o “Hey Ya”, do OutKast, é o “Smells Like Teen Spirit”, é o U2. O Radiohead tem “Fake Plastic Trees”, que é uma baita musica pop, são musicas que eu acho muito boas. Nem importa se elas são pop, se elas fizeram sucesso ou não, é um formato que a gente gosta de ouvir. Eu faço música como se eu quisesse ouvir elas. Eu ouço Sigur Rós pra caralho, é uma das bandas que eu mais ouço, mas não é o tipo de música que eu tenho vontade de fazer. Eu tenho certos momentos.
J: Eu li numa entrevista, nessas Guitar Player (revista especializada em guitarra). Que é uma coisa boa pro cara ler, fica na linha tênue entre o essencial e o desnecessário. Que nem teve uma entrevista com vários guitarristas, e eu tinha, sei lá, 15 anos, e foi uma coisa que me chamou atenção, uma frase do Bon Jovi. Ele falava que uma grande canção é grande até no violão. E eu acho que, por mais parafernália que a gente tenha, por mais que a gente goste dessa coisa de camadas e camadas e camadas e informações, a gente tem essa questão de a canção ser bonita. Ser bonita, não. De ela ser válida, e ela fazer sentido até mesmo no violão e voz.
E isso é uma dualidade da Volantes: ser uma das bandas mais “trabalhadas” do Brasil e, ao mesmo tempo, ter essa intenção da simplicidade.
A: É. A gente corre pros dois lados ao mesmo tempo. A gente busca uma coisa simples, mas tentando enfeitar ao máximo essa coisa. simples.