Felipe S. nasceu em Recife (PE). É cantor, compositor, produtor musical e vocalista de uma das bandas mais bem sucedidas da nova música popular brasileira, a pernambucana Mombojó. Em 2015, lançou o single “Concreto” – parceria com Rodrigo Sanches – inspirado na barulheira e no quebra-quebra de uma obra que acontecia ao lado da casa em que morava, na cidade de São Paulo. Daqui a poucos dias, Felipe S. lança seu primeiro disco solo, Cabeça de Felipe, pelo selo Joia Moderna, idealizado pelo DJ Zé Pedro que já lançou discos de outros nomes em ascensão na “nova MPB” como Mãeana, Alice Caymmi, Iara Rennó e Arthur Nogueira.
Cabeça de Felipe traz dez faixas – nove inéditas e a regravação da música “Vão”, de Públius e Juliano Holanda. Todas gravadas no apartamento do próprio Felipe e produzidas por ele. O nome do álbum tem origem na obra do artista plástico pernambucano Maurício Silva, pai de Felipe. “Eu sempre tive vontade de usar um trabalho do meu pai como capa de algum projeto meu e aí nesse processo de pensar o nome para o disco eu lembrei que em algum desses quadros tinha a minha mão impressa, de quando eu era bem pequeno. Fui atrás do quadro e quando olhei fez todo sentido. O nome do quadro virou o nome do disco e a obra virou a capa”, diz Felipe.
Em primeira mão, vamos ouvir aqui na NOIZE a sexta faixa do disco, e única regravação, “Vão”. “Eu conheci essa música através da gravação do Mestre Ferrugem (que faleceu ano passado). Na versão original a música é um samba muito contagiante. “Vão” é uma música que eu já tinha tocado em shows do Trio Eterno e já tinha muita vontade de gravar. No disco ela tem a participação especial de Alessandra Leão dando uma abrilhantada nos refrões”, explica. Ouça:
Conversei com Felipe para tentar entender, um pouco, o que se passa em sua cabeça. Falamos sobre processo criativo, inspiração, ativismo político e planos para 2017 e divido este papo com vocês.
Felipe, em 2015 você lançou a canção “Concreto” e na ocasião você disse pra alguns veículos que a canção não anunciaria um disco solo. Eis que no início de 2017, nasce Cabeça de Felipe. Como foi o processo de criação deste trabalho?
Comecei a fazer esse disco depois que me mudei e montei um estúdio no quartos dos fundos. Ter um espaço de produção dentro de casa aumentou muito minha produtividade. Daí eu decidi fazer o Cabeça de Felipe em julho, seis meses depois de me mudar, e foi um disco realizado muito rápido. A maioria das coisas gravei em casa. As duas primeiras músicas do disco eu tinha gravado há muito tempo, um voz e violão. Homero Basílio gravou umas percussões. E ouvindo com calma comecei a sentir que as músicas não precisariam de muitos instrumentos e fui construindo o disco todo nessa lógica de fazer o mínimo necessário. Depois do disco finalizado, enquanto buscava um nome para o disco, minha esposa sugeriu usar essa obra do meu pai como capa e pra mim foi libertador porque eu não precisaria mais ter que explicar nada porque tudo o que fiz surgiu de ideias que vieram da minha cabeça. Simples assim. Antes nunca tinha tido vontade de ter uma carreira solo mas agora me bateu que estou num ponto de equilíbrio entre já ter uma banda há mais de dez anos e de ainda me sentir jovem.
O que inspira o artista/compositor Felipe S.? E como é seu processo de composição? Letra antes e melodia depois? o contrário?
As músicas que faço geralmente nascem da tentativa de descrever alguma sensação sobre coisas que me chamam atenção. Eu começo geralmente por uma harmonia, depois melodia e depois letra. A primeira música do Cabeça de Felipe (“Nova Bandeira”) eu comecei a fazer em 2013, durante as manifestações. Eu vi um skinhead segurando uma bandeira do Brasil e querendo bater nas pessoas que pensavam diferente dele. Isso me marcou muito. Assim também como o disco A Mulher do Fim do Mundo, de Elza soares. Assim como o desastre de Mariana. Assim como “Incerteza Viva”, título da última Bienal de São Paulo. Todas essas coisas me fizerem escrever sobre essa fase caótica que estamos vivendo. E fui descrevendo como um sonho.
O que mudou, pessoal e artisticamente, no jovem músico que sonhava em conquistar os palcos do Brasil e dava seus primeiros passos profissionalmente para o, hoje, artista reconhecido e vocalista de uma das bandas mais importantes da nova geração?
Principalmente o sentimento de que tudo mudou e que não adianta se apegar às regras do passado para tentar viver de música. Achei legal esse momento para começar uma carreira solo. Estou há mais de 10 anos mantendo projetos que se consolidaram mesmo com todas as dificuldades de ser músico. Isso me deu confiança para acreditar que agora eu posso fazer sozinho de uma forma simples e bem resolvida. E o principal fator é ter uma rede de amigos produtivos. Ao longo do tempo a melhor coisa que consegui foi conhecer muitos bons músicos e agora ter uma espaço onde eu posso produzir a hora que eu quiser.
Cabeça de Felipe traz dez faixas. Quanto tempo essas canções demoraram pra ficar prontas? Elas nasceram próximas uma da outra ou cada uma nasceu num momento específico por um motivo especial?
Cabeça de Felipe começou a ser gravado em julho de 2016 e foi masterizado em setembro de 2016 foi um disco bem rápido. Eu comecei juntando um bocado de gravação que eu já tinha e nisso rapidamente eu já tinha 10 músicas, sendo que metade já estava gravada. Depois tive que me concentrar e ficar muito tempo em casa gravando e editando, para no final levar a música para alguns amigos participarem. Foram poucas participações e coisas bem específicas. A música que encerra o disco, “Tigre Palhaço”, eu já imaginava como encerramento do álbum. Eu só tinha uma versão voz e violão, mas na minha cabeça eu já imaginava que queria um coral de vozes graves, percussões e sintetizadores. Numa tentativa de transformar a música numa trilha de um ritual. Essa letra eu recebi da atriz Juliana Didone. E pra mim foi como um grande presente, até porque encontrei poucas vezes com ela, mas rapidamente chegamos no assunto que ela gostava de compor e pedi pra ela me mandar algo. Foi bem por acaso, mas eu adoro o resultado dessa música. Atualmente é a minha preferida.
Num momento em que a política passou a fazer parte (definitivamente, parece!) da vida de todos nós – política virou pauta em qualquer botequim – sua arte também torna-se mais política/ativista? Como?
Eu realmente noto isso como um espírito do tempo. De uma hora pra outra falamos mais de política, mas vejo isso com ótimos olhos até porque sou de uma geração muito acomodada. Minha produção também se tornou mais política, principalmente depois do Ocupa Estelita, em Recife. Aquilo mexeu com todos da banda. É uma sensação de que precisamos fazer quórum por mudança. E estar mais informado sobre o que acontece no país é sempre bom pra todo mundo. Tento sempre deixar isso da forma mais espontânea possível. Geralmente escrevo sobre os pensamentos que martelam minha cabeça e hoje em dia está difícil fugir da política.
Quais as bandeiras (liberdades individuais) o Felipe S. levanta na vida?
Pergunta difícil, hein? Eu me sinto nessa vida como um observador. Não sou bom de dar justificava escrita sobre ideais. Sou movido a compor e tocar. E olhar a vida gera o combustível para produzir, mas vou muito na intuição. De todo modo, sempre reflito comigo mesmo sobre não precisar de muito pra ser feliz e não sofrer com expectativas. Talvez essa seja uma bandeira interna minha.
Quais são seus planos para 2017?
Meu foco em 2017 é fazer muitos shows. Passei o segundo semestre de 2016 totalmente pensando nisso. É o que eu mais gosto de fazer e a coisa que mais me rende sustento, então agora que já terminei um novo disco vou me empenhar em tocar sem me preocupar em lotar grandes lugares. Eu quero estar perto das pessoas. Sentí-las, abraçar, aproximar meu trabalho das pessoas que têm interesse em conhecê-lo.