A ideia foi do maestro Tiago Flores, e o objetivo era aproximar o público da música erudita. Então, em 1997, a Orquestra de Câmara da Ulbra subia ao palco com Nei Lisboa, dando início aos Concertos Populares com Orquestra, que realiza 4 shows a preços populares todos os anos em Porto Alegre.
Tendo como único critério a boa música, a orquestra já tocou com artistas dos mais variados estilos: regionalista, urbano, latino-americano, música popular brasileira, rock… E, na noite do último domingo, 17, foi a vez de Lenine se juntar aos músicos, no show que rolou no Auditório Araújo Vianna.
“A Gandaia das Ondas” foi escolhida pra abrir o belo espetáculo, que contou com mais 13 músicas. “De Onde Vem a Canção”, “Paciência”, “O Último Pôr do Sol”, “Jack Soul Brasileiro”, “Do It” e “Envergo Mas Não Quebro” estavam no repertório. “Leão do Norte” apareceu já no bis, e Lenine aproveitou pra homenagear Eduardo Campos, seu conterrâneo do Recife (PE) e candidato à presidência morto na última semana.
O bis contou ainda com um momento intimista, em que Lenine interpretou “Hoje Eu Quero Sair Só” no formato voz e violão.
O público aprovou, e Lenine também. No palco, ele demonstrou a vontade de repetir a parceria. “Sacanagem ser uma vez só”, disse. “Músicas são como filhos, e eu estou vendo meus menino com roupa de domingo.”
Fotos: Ariel Fagundes
UM DEDO DE PROSA
Faltava cerca de uma hora pro show começar, quando Lenine nos recebeu no backstage. Fazia pouco que haviam terminado a passagem de som, e o artista estava empolgado, como você pode perceber na entrevista que segue.
De que maneira rolou a preparação pra este show, já que você vive no Rio e a orquestra, no Sul?
Essa espécie de animal, que é o músico, já vem preparado. Ainda mais pra gente aqui, que é tudo casca-grossa, todo mundo já tocou de tudo. A orquestra tem um corpo significativo, com grandes músicos. Tem essa coisa também da experimentação, que eu já venho fazendo há muito tempo, com diferentes formações, diferentes relevos, diferentes orquestras. É sempre muito bacana, mas eu acho que a grande preparação é primeiro acreditar numa música que não precisa de adjetivo – isso até deve ser uma busca – , e segundo é a entrega cega, passional, sabe?
Uma coisa que você consegue fazer muito bem…
Eu não sei fazer de outro jeito. Eu sou péssimo ator. Por isso tenho essa coisa de, por alguns períodos, não conseguir chegar próximo de algumas canções que produzi, pra redescobri-las depois de outras maneiras. Porque a música também é volátil e é volúvel. Então, tem horas em que você a descobre de outra maneira. E é isso que eu tenho feito, na verdade, ao longo da vida. Tem algumas canções que, de uma forma ou de outra, se tornam perenes, porque o público quer ouvi-las. Você quer deixá-las descansar um pouco, mas nego não deixa. Aí, você tem que estar sempre pré-disposto a construir e desconstruir o tempo todo.
Neste show especificamente, a que detalhes o público pode prestar atenção?
Ah, não sei, mas tem a possibilidade de relevo sonoro que uma formação como esta nos permite exercitar. Pra audiência, talvez não, mas pra gente que vai tocar… Esse exercício do coletivo, com a possibilidade sonora… Porque o foco da Ulbra também são as cordas. As canções ganham uma dimensão, uma profundidade, ficam outras canções. Por isso que estou dizendo que, de algumas, eu até me pergunto se eu tinha a paternidade, porque elas adquirem a maioridade, como um filho mesmo. Aí, vai sozinho.
E a turnê “Chão”?
Eu ainda vejo que tem muito chão pra percorrer. Devo voltar, inclusive, a Porto Alegre, em outubro, pois gente vai fazer algumas cidades que tiveram importância na trajetória do projeto todo. Daí, sim, encerrar a turnê no fim do ano. Até o fim do ano, a gente está de uma maneira meio Pelé, se despedindo do projeto “Chão”.
E o que vem depois?
Não tenho a mínima ideia, mas tem sido assim. Não saber pra onde ir é o melhor da bússola. Pelo menos fazendo o trabalho que eu faço.
Se aventura mais?
É, porque eu quero subir o sarrafo, eu sempre quero. Acho que é do ser humano, pô, mas eu já estou pensando, vendo como poderia ser um formato bacana, porque não é só fazer um disco, é mais do que isso. Eu, quando penso um projeto, penso uma capa, um nome, eu vou criando um castelo de pequenos sonhos, pequenos fragmentos, de coisas que eu acho que têm importância pra, naquela hora, eu dizer, tocar e cantar.
Este foi apenas o primeiro show do ano dentro do projeto Concertos Populares com Orquestra. Há mais 3 agendados, e todos vão ocorrer no Salão de Atos da Ufrgs:
28/9: Orquestra de Câmara da Ulbra e convidados tocam Beatles
11/10: Orquestra de Câmara da Ulbra apresenta Concerto Regionalista, com César Oliveira, Rogério Melo, Daniel Torres e Guri de Uruguaiana
22/11: Orquestra de Câmara da Ulbra e Cachorro Grande