Exclusivo | Sarração e representatividade no clipe de “Um Segundo”, de Bruno Capinan

17/01/2017

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Ariel Fagundes

Por: Ariel Fagundes

Fotos: Reprodução

17/01/2017

Por mais que more em Toronto, no Canadá, desde 2008, Bruno Capinan é – e sempre será – um filho da Bahia. Essa raiz baiana devota, acima de tudo, do êxtase se destaca no terceiro álbum do músico, Divina Graça (2016), que saiu há poucos meses no Brasil pela gravadora Joia Moderna e, no Japão, pelo selo P-Vine Records.

Produzido por Domenico Lancelotti e coproduzido por Bem Gil, o álbum se abre ao ouvinte como um jogo de búzios e timbres onde a única lei absoluta é a do amor – seja ele sutil e metafísico ou denso e carnal. E seja ele com quem quer que seja.

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Lançamos agora com exclusividade o clipe arrasador de “Um Segundo” (veja abaixo), a segunda faixa de Divina Graça, que, como o próprio Capinan explica, foi composta após “um encontro que culminou em uma paixão de carnaval”. Uma hecatombe de hormônios está latente na música que apresenta uma reflexão sobre a natureza fugaz dos relacionamentos modernos. “Anseio por algo longe da superficialidade dos tempos atuais, das relações, dos encontros”, afirma Bruno ao comentar essa que diz ser “a faixa mais radical do disco em termos de arranjo”. Radical talvez seja também um bom termo para descrever a edição da festa carioca Batekoo onde foi gravado o vídeo de “Um Segundo”.

– Liguei pros meninos da festa, Daniel Oliveira, Caique Cerqueira e Guilherme Blum, que também fazem parte da capa e da concepção artística do disco, e subi Santa Teresa cheio de panos, roupas, com um sapato plataforma bafônico, haha, e me joguei na festa. O clipe tinha que passar a urgência da canção e ao mesmo tempo servir como documentário da resistência negra e LGBTQ no Brasil – explica Capinan que, além de ter criado o roteiro e ter feito a edição do clipe ao lado de Mike Fillipov, dividiu a sua direção com Rafaê Silva, que fez também a fotografia da filmagem.

Apenas não espere ver aqui mais uma historinha de amor margarina entre típicos casais brancos heterossexuais. “O vídeo afirma a presença do gay na música popular brasileira e do LGBTQ preto em vários seguimentos da sociedade”, explica Bruno. Um festival de sarradas e beijos vai encher de cor a sua tela, assista abaixo e confira nossa conversa completa com o músico.

Como surgiu a composição de “Um Segundo”? Como você situa essa faixa em relação ao resto do disco?
“Um Segundo” foi escrita na Bahia depois de um encontro que culminou em uma paixão de carnaval, uma história verídica. Mas, vai além do relato desse encontro, é uma canção cheia de signos, senhas, deixas. O “por um segundo talvez desisti” com o “talvez resisti” da letra é uma síntese da importância de ainda se fazer música, de querer comunicar algo, da urgência com a qual a canção chegou até mim; eu anseio por algo longe da superficialidade dos tempos atuais, das relações, dos encontros. É a faixa mais radical do disco em termos de arranjo.

“Um Segundo” soa como uma música que pega os elementos básicos do samba, os isola, e então os une novamente com uma nova composição estética. Como é o desafio de desconstruir algo tão tradicional quanto o samba?
Sim, exatamente isso o que aconteceu! Eu escrevi um samba, tinha as divisões rítmicas e o canto calcado no lamento do samba, mas o Domenico Lancellotti (produtor do disco) quis desconstruir essa estética. Por ele ser um músico criado no berço do samba carioca, houve uma confiança ainda maior de ir seguindo o instinto da canção, e os muros eventualmente foram sendo derrubados. Eu escuto um Portishead botando um disco do João Gilberto e percebendo que o baiano já fazia triphop na década de 60.

Sobre o clipe de “Um Segundo”, como ele foi feito?
O clipe nasceu do desafio de gravar num ambiente de liberdade soberana. Eu liguei pro Rafaê Silva e avisei que estaria chegando ao Rio na noite em que a festa Batekoo estaria acontecendo em Santa Teresa, num lugar chamado Casa Coletiva, e perguntei se ele topava dirigir o clipe comigo. Já tinha o roteiro pronto fazia um bom tempo. Liguei pros meninos da festa Batekoo: Daniel Oliveira, Caique Cerqueira e Guilherme Blum, que também fazem parte da capa e da concepção artística do disco, e subi Santa Teresa cheio de panos, roupas, com um sapato plataforma bafônico, haha, e me joguei na festa. O clipe tinha que passar a urgência da canção e ao mesmo tempo servir como documentário da resistência negra e LGBTQ no Brasil.

(Foto: Daryan Dornelles)

Pode-se dizer que é um vídeo que busca apoiar a diversidade sexual em nosso país? Como você enxerga a situação desse debate atualmente?
Sim, claro! Mas muito mais do que apoiar a diversidade sexual, o vídeo afirma a presença do gay na música popular brasileira e do LGBTQ preto em vários seguimentos da sociedade. Estamos aqui pra ficar, e para contribuir na diversificação desse país e de um mundo que, mais do que nunca, depende dessa diversificação. Vivemos tempos de retrocesso, com Trump, Temer, Duterte (o presidente filipino), com uma onda de conservadorismo, ódio, uma reação adversa às tentativas dos avanços sociais alcançados. O filósofo Albert Camus observa em alguns dos seus ensaios que os avanços sociais alcançados por vias de protestos e de resistência coletiva acabam levando ao fortalecimento do Estado, o tornando cada vez mais totalitário; como se o Estado dependesse do controle social, da afirmação do normativo e das ideologias mais conservadoras para se erguer soberano, e eu vejo isso acontecendo no Brasil. O meu papel como pessoa pública e mente criativa é justamente o de oposição a essa onda conservadora, não através de um discurso político fragmentado, mas debatendo o que ainda existe na marginalidade quando diz respeito aos interesses políticos.

O clipe é extremamente sensual e mostra, nesse contexto, pessoas com cores, formatos de corpos e opções sexuais que, muitas vezes, são excluídas da produção audiovisual, cultural e midiática do nosso país. Como você se sente no papel de trazer tudo isso à tona?
São exatamente as pessoas com as quais eu convivo, os meus amigos, a minha família. O meu ambiente coletivo tanto no Brasil quanto no Canadá, onde moro, é diversificado. Mas, parando pra pensar na importância do meu trabalho, como representatividade, eu fico feliz se de alguma maneira estiver colaborando para a diversificação da produção audiovisual, cultural e midiática. O Brasil do vídeo e do meu disco é o Brasil que eu quero que o mundo conheça.

Veja como é a versão japonesa de Divina Graça:

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17/01/2017

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Ariel Fagundes

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