Jota.pê comenta as histórias que estão por trás de “Se o Meu Peito Fosse o Mundo”

03/09/2024

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Ariel Fagundes

Por: Ariel Fagundes

Fotos: Divulgação/ Taís Valença

03/09/2024

João Paulo Gomes da Silva conta que até se esforçou para não seguir a carreira de músico, mas não teve jeito. Nascido em Osasco (SP), em uma família repleta de cantores e instrumentistas, Jota.pê tentou fazer duas faculdades e trabalhar em diversos empregos antes de decidir que a música seria mais do que um meio de se expressar, seria sua profissão.

Tocando violão desde os nove anos de idade, o instrumento lhe acompanha em sua carreira solo, quase como uma extensão do corpo. Abraçando rente a peça de madeira curvilínea, Jota.pê se sente em casa. Hoje, aos 31, ele já teve tempo de desenvolver sensíveis linguagens autorais com as cordas, tanto as do violão quanto as vocais. 

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Após o lançamento impactante da dupla Avuá, formada por Jota e Bruna Black, abriram-se os caminhos que conduziram ao disco Se o Meu Peito Fosse o Mundo (2024). O segundo álbum solo chega nove anos após o primeiro, Crônicas De Um Sonhador (2015), mas Jota.pê explica, na conversa que segue, que o segundo trabalho é como se fosse uma reestreia.   

Seu pai é músico, né? Foi através dele que a música entrou na tua vida?

Sim, meu pai teve banda, trabalhou com esse lance. Mas eu diria que foi através da minha família. Quando comecei a ter idade pra entender as coisas, meu pai não cantava mais profissionalmente, mas na minha família tem muita gente que ou trabalha com música ou canta e toca. Meu avô tocava chorinho, meu tio é maestro, minha avó cantava na igreja, meu tio avô teve banda de rock, enfim. Toda vez que tinha alguma festa de família, especialmente na parte paterna, tinha muita música. A música sempre esteve muito à minha volta.

E quando você começou a querer tocar, foi o violão a sua primeira escolha?

O violão foi o meu primeiro instrumento. Com uns nove anos de idade, eu ganhei um violão da minha mãe e comecei a tocar. Tentei fazer aula por uma semana, duas, mas não rolou porque na aula eles queriam ficar ensinando muita teoria. E eu com 9 anos de idade, estava ansioso e com pressa. Parei de fazer a aula e comecei a tocar sozinho em casa, a tocar na escola…  Comecei a encher o saco de todo mundo da minha sala pra aprender a tocar alguma coisa pra gente ter banda. Começou desse jeito.

E o que você tocava na época?

Eu já gostava muito de MPB, mas quando você começa a tocar violão, você descobre que não dá pra tocar Djavan. Não tem como. E aí eu descobri o Charlie Brown Jr., o CPM, o hardcore da época. Charlie Brown eu gostava pra caramba, aquele Acústico MTV deles mudou minha vida, mais pra frente o Acústico MTV da Cássia Eller também. No começo era isso, tive várias bandas de rock na adolescência, tocava System [of a Down], Green Day. Outra banda que mexeu muito comigo foi o Incubus.

Quando a composição entrou no jogo?

Comecei a compor com uns 13, 14 anos de idade. Eu lembro de ver algum filme ou novela, sei lá, em que um cara compôs uma música pra mina que ele gostava. E aí eu falei: “Ah, eu tô apaixonado e eu sei tocar violão, vou tentar fazer alguma coisa”. Comecei a fazer músicas pras pessoas que eu gostava ali na adolescência. Músicas horríveis no começo, mas foi muito divertido. E veio daí, no começo era brincadeira. Eu não pensava de fato que eu estava me tornando um compositor. Eu só fazia músicas porque eu descobri que isso era possível. E era muito divertido. Experimentei muita coisa, foi muito especial esse momento de início de composição.

Você tem uma linguagem própria com o violão, seu som parece sempre buscar algo muito autoral a partir do instrumento. Como você foi criando o seu estilo?

Meu pai é um cara muito crítico, e quando eu comecei a tocar, ele falava: “Você é muito violonista e pouco intérprete”. E eu fiquei tentando entender por quê. Comecei a estudar artistas e a entender porque ele falava tanto da interpretação, fui ver a Bethânia, a Gal, todo mundo, comecei a entender as diferenças desses artistas. E pra além da interpretação vocal, comecei a buscar isso também no violão. Aí me encantei mais ainda por Djavan, Lenine e Gil, porque eles têm violões muito específicos. 

Vendo eles, comecei a pensar: “Beleza, eu sou um violonista também, como eu poderia achar o meu jeito de tocar?”. Fui percebendo que o que mais me encantava nos artistas era o jeito único deles. Eu realmente passei muito tempo tentando achar o meu jeito de fazer. Quando eu tirava uma música, tentava trazer a minha interpretação, o meu jeito, tanto no violão quanto na voz. Era realmente um lance que eu praticava até achar a minha onda. 

E como veio um caminho de profissionalização? 

Eu tive muitos outros empregos antes, porque quando eu comecei a citar em casa que eu queria trabalhar com isso, muita gente começou a me dizer que eu não ia ganhar dinheiro, que eu ia passar fome, que músico é pobre. Então tentei muito não ser músico. Fiz um Ensino Médio técnico de TI, cheguei a trabalhar na IBM com programação e tal. Odiava essa parada, mas por algum motivo eu era um pouco bom. Cheguei a fazer duas faculdades pela metade, dois anos de Design Digital e dois anos de Publicidade. 

Eu fiz muita coisa, fui demitido de alguns trabalhos por causa da minha falta de atenção. Lembro que eu estava trabalhando numa gráfica, e aí eu estava compondo enquanto eu diagramava um livro. E obviamente deu errado, eu imprimi 400 livros de ponta cabeça. E aí com uns 20, 21 anos, eu me joguei de fato na música. Eu pensei: “Precisa dar certo, porque eu não tenho outra opção”. E tô aqui agora. 

Começou tocando em bar?

Comecei tocando em barzinho, aí rapidamente percebi que também não ia rolar. Teve um barzinho em Osasco que o cara chegou com uma cifra de sertanejo: “Cara, é isso que você tem que tocar, é isso que a galera gosta”. E aí eu comecei a procurar canais do YouTube que gravassem artistas independentes e lugares pra tocar. O primeiro lugar que eu consegui tocar em São Paulo foi no Julinho Clube, rua Mourato Coelho. Passei uns 10 meses tocando só no Julinho, foi assim que começou a rolar esse lance de viver de música.

Isso foi em que ano?

Eu lancei o meu primeiro disco em 2015, eu acho que esse rolê do Julinho foi logo na sequência, tipo 2016, 2017.

E como nasceu o seu primeiro disco, Crônicas De Um Sonhador (2015)?

Foi muito doido o processo, porque eu não tinha ideia de como se gravava um disco. Tive ajuda do Ronaldo Rossato, o Nardão, o dono do estúdio que eu ensaiava com a minha banda. Tinha terminado a banda, estava meio chateado, e aí o Nardão falou: “Cara, não desiste, vamos trocar uma ideia”. E aí no dia que eu fui, o Fernando Anitelli, do Teatro Mágico, estava no estúdio. E eu era muito fã, ainda sou, mas na época era o auge do Teatro Mágico. 

Encontrar o Fernando ali foi muito bacana, eu acabei confessando a ele que estava pensando em desistir, e foi muito louco, porque o Fernando contou toda a história do Teatro Mágico, todo o processo, desde tocar violão na rua com o case aberto. E aquilo me incentivou a gravar o disco. Aí o Nardão falou: “Cara, grava aqui, eu te apresento uns músicos, a gente arranja a banda, vamos fazer”. O disco que eu achei que ia fazer em duas semanas demorou mais de um ano, mas foi muito bacana. Eu aprendi muita coisa. 

E qual foi a repercussão que o disco teve na época? 

Acho que a maior repercussão foi em mim mesmo, porque naquela época eu achava que era impossível ganhar dinheiro com música. A gente procurou casa de show, nenhuma quis fazer o meu lançamento, aí teve um cara que eu conheci que trabalhava ou era sócio da ACM, uma coisa assim, e falou: “Na ACM tem um teatro, consigo deixar você tocar lá”. Beleza. Um dia antes do show, esse cara me liga: “Tem um problema aqui, resolveram reformar o teatro”. Um dia antes. 

A gente foi na hora ver o que tinha acontecido, e as cadeiras do teatro estavam pra fora, era tudo cimento, tinta… Eu sentei no chão, falei: “Já era, acabou. O lançamento é amanhã, vou cancelar”. E meus pais: “Não vamos cancelar, não”. E aí a gente acabou fazendo o show na quadra da ACM. Nas fotos, tem uma cesta de basquete atrás de mim. Beleza, fizemos, um monte de amigo foi, familiares, mais de 200 pessoas. A gente levantou mais de R$ 5 mil com ingresso. Não fiquei com nada — porque pagando tudo, foi tudo embora —, mas até ali eu achava impossível levantar uma grana dessas com um show. 

Eu não fazia ideia de que outros passos eu tinha que tomar, achava que o objetivo de um artista era lançar um disco. Depois que lancei, eu não sabia o que fazer. Aquele momento foi muito importante, porque saquei que dava pra ganhar dinheiro, eu só precisava descobrir como. Então acho que a maior repercussão foi mais em mim mesmo. Não teve mídia, não teve nada. Obviamente eu não sabia que tinha que fazer isso. Mas em mim fez muita diferença, foi a primeira injeção de combustível pra eu continuar fazendo o que eu tô fazendo até hoje.

Pouco depois disso, você participou do The Voice, na TV Globo. Como foi?

Foi muito bacana, e eu era meio contra participar até receber o convite. Meus pais sempre naquelas: “Manda vídeo, de repente rola”. Daí mandei, e eles mandaram e-mail me chamando. Fui fazer o teste, morrendo de nervoso. Sentei, toquei uma música do 5 a Seco, “Pra Você Dar o Nome”, e o diretor do programa falou: “Ah, beleza, agora levanta e canta outra que eu quero ver você cantando sem tocar”. Eu não tinha preparado nada, aí olhei pro pianista que ia me acompanhar e pensei: “Vou pegar alguma coisa de barzinho que eu sei cantar até de ponta-cabeça”. E aí cantei “Samurai”, do Djavan, e deu certo. 

Na época eu não ganhava dinheiro com música, era muito mal remunerado, então pensei, “Poxa, na pior das hipóteses, vou conhecer um monte de outras pessoas que vão poder me ensinar muitas coisas”. E foi maravilhoso, porque ganhar não era uma questão, eu fui pra me divertir e conhecer gente. O que de fato fez sentido, tenho amigos lá até hoje. Estava conversando com o Lulu Santos semana passada, é um cara que até hoje conversa comigo. Então foi uma experiência muito bonita. 

No mínimo, você já estaria falando com outro público através da TV.

Exatamente. Porque tem isso, estar na televisão, especialmente na Globo, tem um lance de validação. Tem aquele parente que nunca foi num show e que depois disso vai, sabe? 

Eu conheci o seu trabalho primeiro através do Avuá, sua dupla com a Bruna Black. Como foi que a sua música passou a ter uma repercussão maior?

Foi uma junção de coisas aos poucos. Antes da pandemia, em 2020, fiz um show na Aparelha Luzia, aqui em São Paulo, e foi muito bacana porque tinham 200 pessoas negras ali, cantando as minhas músicas. Foi a primeira vez que tinha tanta gente que não eram meus amigos. Na sequência iniciou a pandemia. 

E aí em casa, procurando maneiras de não enlouquecer, comecei a gravar muitos vídeos das minhas músicas e colocar no Instagram. Comecei a fazer várias lives, e o público começou a crescer muito mesmo. No meio disso, eu tinha acabado de começar o Avuá, e uma coisa foi alimentando a outra. E aí, eu saí de, sei lá, 60 mil seguidores pra 200 mil no fim da pandemia. A gente também teve a oportunidade de ser convidado como Avuá pra muitas coisas bacanas, tudo meio que aconteceu ao mesmo tempo. 

Quando acabou a pandemia, foi quando percebi o que tinha acontecido. Porque eu marquei o primeiro show, e os ingressos esgotaram em 10 minutos. Aí marcamos uma segunda sessão, esgotou de novo no mesmo tempo. Fomos fazer o show do Avuá, aí a gente percebeu o que estava acontecendo. E foi aí que as coisas de fato começaram a andar. 

Como vocês equilibram as trajetórias solo e o Avuá?

Depois que a gente gravou o disco do Avuá, o Percorrer Em Nós (2022), a gente resolveu começar a pensar em carreiras solos. Porque a gente sempre se entendeu como engrenagens do mesmo trampo. Todo o sucesso que a Bruna alcançar faz o Avuá crescer, e vice-versa. Acho isso muito bonito, porque de fato a gente é amigo e quer o sucesso um do outro. 

É muito nítido que existem coisas que ela e eu só somos capazes de fazer sozinhos e existem coisas que a gente só é capaz de fazer juntos. Eu gosto muito de quanto os crescimentos individuais trazem coisas novas pro Avuá. Eu aprendi e evolui muita coisa, e ela é uma cantora incrível, uma compositora muito sensível. Então é muito bacana. A gente realmente faz questão de manter as coisas funcionando juntas. A Bruna está preparando o disco solo dela, os shows estão rolando todos ao mesmo tempo e está tudo certo. 

E quando começou o projeto do Se o Meu Peito Fosse o Mundo

Antes de ter uma estrutura, um contato com a Som Livre e tudo, comecei a pensar nas composições, sobre o que eu queria falar. A primeira coisa que eu cheguei foi no nome. Se o Meu Peito Fosse o Mundo veio de uma outra música, “Garoa”, que diz: “Faz de conta que o teu peito agora é o mundo e nele lá no fundo, qual é a tua questão”. Eu falei: “Beleza, se o meu peito fosse o mundo, o que eu teria pra dizer? Sobre quais coisas eu quero falar nesse álbum?”. Eu sou um cara muito do texto. Gosto muito de passar a mensagem, e comecei a me questionar sobre que mensagem seria essa. Aí comecei a ler, a ver documentário, a conversar com artistas, a montar playlist de referência. 

Foi aí que eu mergulhei na obra da Mayara Andrade e do Tom Misch, descobri várias coisas, tipo Jacob Collier, por exemplo, que eu estudei muito, mas saquei que não tinha muito a ver com o que eu queria fazer, mesmo amando o trabalho dele. Descobri coisas que eu amava e que não tinha a ver com o trampo, descobri coisas que eu não gostava tanto, mas que tinha aquele timbre de caixa que eu queria pro meu disco. Foi um processo de estudo.

O disco abre com um mapeamento afrodiaspórico, citando Cabo Verde, Cuba e Salvador, o que já traz uma mensagem muito forte logo de cara. Mas ao mesmo tempo, a música tem um tom leve, alegre. Comenta esse equilíbrio que o disco tem? 

Isso é uma coisa que eu realmente tento, ser o mais verdadeiro e honesto possível com o som e com a mensagem que eu quero colocar no mundo. Eu sempre busquei isso no meu trabalho: como é que eu posso ser eu mesmo? Que tipo de experiência eu posso buscar pra colocar no meu som que coloque meu DNA no trabalho? Esse disco é o disco da minha vida, porque eu pude ter tempo pra estudar, fazer com carinho. Eu tô muito feliz com ele. Tive a sorte de ter o Felipe Vassão, o Marcos Preto e o Rodrigo Lemos ajudando a colocar esse disco no mundo. 

“Tá Aê” é muito especial, realmente tinha que ser a primeira faixa justamente por isso que você comentou, de citar esse lugar de movimento, de balanço, de esperança, que é uma coisa que eu sempre quis muito colocar no meu disco. Mesmo falando de coisas densas, eu sempre quero jogar um pouco de esperança no final. Porque eu não consigo me mexer sem acreditar que as coisas vão ser melhores daqui a pouco. 

O álbum traz a Xênia França e os Gilsons como esses convidados, grandes expoentes dessa geração de artistas negros contemporâneas. Como você vê essa geração e como você se sente fazendo parte disso?

Quando comecei a tocar, sempre sonhei em ser parte disso. Eu olho pra cena e digo que a música brasileira nunca esteve tão bem. Tem tanta coisa maravilhosa sendo feita: Josyara, Liniker, Luedji, Xênia, Anna Tréa, Ana Frango Elétrico, Theodoro Nagô, Nina Oliveira, Bruna Black, enfim… Eu me sinto muito inspirado por ser parte disso. Hoje os artistas da minha geração me influenciam muito mais a fazer música do que os grandes gênios que me fizeram começar. E isso de maneira alguma é uma crítica, é mais pelo lance de movimentação, de cheiro de novidade, que essa galera me causa. 

E aí chegamos em Xênia e José Gil, feats que aconteceram de maneira muito natural. A Xênia foi uma amizade muito intensa que surgiu. No período de duas semanas a gente foi para umas seis festas e se encontrou, aí ela chegou pra mim: “Jota, a gente está se vendo muito, a gente devia ser amigo”. E aí a gente começou a trocar ideia. E com o José foi com ele falando no Instagram que queria compor comigo. Acho muito bacana que tenha sido dessa forma tão natural e verdadeira.

Existe uma diversidade muito grande de sons dentro dessa cena. Será que no futuro a gente vai ver isso como um movimento?

Cara, eu anseio muito por isso. Porque de fato tem muita coisa maravilhosa sendo feita. Tuyo, Bruno Berle, tem um monte de coisa maravilhosa sendo feita ao mesmo tempo. Até graças à internet, às redes sociais, a interação entre essas pessoas é muito mais fácil. Meu primeiro contato com a Liniker foi por causa do Instagram. Com o José Gil, a Mayra Andrade, foi a mesma coisa. É muito bacana e especial poder ver essas ligações todas. 

Eu, sendo protagonista da minha própria história, acho que realmente existe uma cena acontecendo. Essas pessoas estão se encontrando, fazendo coisas juntas, se movimentando, e acho que muitas outras coisas e outros artistas serão inspirados por todos esses que a gente falou aqui. Tenho certeza que vai acontecer. Existe uma cena muito diversa e plural. Vejo muitos artistas fazendo coisas muito diferentes e ao mesmo tempo sendo parte da mesma coisa. Acho isso muito bonito. 

Seu disco também tem sonoridades diversas, como você se sente navegando entre musicalidades tão diferentes?

Eu fui um cara que ouvi muitas coisas diferentes e amo todas elas. Pensando no disco, Vassão, Marcos e Lemos insistiram muito que nesse álbum — que não é o primeiro, mas ao mesmo tempo é, porque é o primeiro disco em que de fato eu tô entendendo melhor o que eu tô fazendo — a gente precisava pegar esse DNA e colocar no disco. O discurso também entra nesse lugar, seja de texto como de instrumentação. Então eu busquei ser cômico em “Quem É Juão?”, porque de fato eu sou de vez em quando, ser um pouco mais dramático em “O Que Será Nós Dois”, porque a gente não é feliz o tempo inteiro, colocar “Ouro Marrom”, porque sou um homem negro e preciso refletir o meu tempo.

Eu busquei isso nas sonoridades também, até por isso chamei esses produtores. O Marcos foi o primeiro cara que, quando ouviu o repertório, que não tinha “Ouro Marrom”, falou: “Cara, tem que ter uma música mais lenta. Porque tudo é groovado, tem que ter uma lenta, só pra galera saber que você canta legal, pra você sentir a melodia na boca e tal”. “Ouro Marrom” nasceu muito dessa provocação dele. Na mistura de ritmos, foi muito importante ter o Vassão e o Lemos. O Vassão é um cara que eu descobri pelas coisas do Emicida que ele produziu e fiquei muito fã. O Lemos já tinha feito coisas comigo no Avuá, então já entendia como era a minha linguagem. Esses três produtores e os músicos, que foram essenciais, fizeram essa pluralidade toda de possibilidades rítmicas.

E o seu canto também é bem versátil, você coloca a voz de várias maneiras conforme cada música. 

É muito doido, em um primeiro momento eu só deixo sair, com o tempo, eu vou maturando. Na hora de colocar no disco, teve um estudo de entender o que cada música precisava mais. Esse disco é muito autobiográfico, é muito sobre mim o disco todo. Então, acho que foi mais fácil de entender o sentimento e colocar isso em interpretação. Porque eu quero que as pessoas acreditem no que eu estou cantando.

Você falou sobre esse disco ser como se fosse o primeiro, é um disco de uma reapresentação, você concorda com isso?

Concordo plenamente. Eu refinei muita coisa, e esse segundo álbum é realmente quase uma continuação do primeiro. Tem muita coisa que eu me perguntava se eu iria viver e hoje eu estou vivendo. Então eu quis muito concretizar essa história neste disco, e já estou ansioso pelas próximas coisas que nascerão.

Esta matéria foi publicada originalmente na edição 149 da revista NOIZE, lançada com o vinil de “Se O Meu Peito Fosse o Mundo”, de Jota.pê, em 2024.

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Ariel Fagundes

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