O não show de Daniel Johnston

02/05/2013

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Revista NOIZE

Por: Revista NOIZE

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02/05/2013

Na noite de sexta-feira, de terno e gravata, doze músicos acompanhavam o cantor, que, com o charme de um Frank Sinatra B depois do Botox, fazia caras e bocas de tenor para um auditório entusiasmado que aplaudia. Mas claro, não estou falando de Daniel Johnston.

Esse era o show que passava mudo na TV de plasma de algum boteco da Augusta enquanto eu esperava pelo lanche que pedi depois de assistir ao show de Daniel.

*

Daniel não é de espetáculos. Ele sobe no palco com dificuldade, barba por fazer, calça de moletom e camiseta branca. Daniel desafina, vacila e se agarra trêmulo ao microfone com a força de quem se agarra aos frágeis fios da sanidade, depois de conviver anos com a bipolaridade e a esquizofrenia, retratadas no ótimo documentário The Devil and Daniel Johnston, de 2006.

Após um primeiro show cancelado no mês passado, Daniel voltou a São Paulo para sua primeira apresentação no país. Aos 52 anos, subiu ao palco acompanhado por cinco músicos brasileiros e um assistente, que o ajudava a virar as páginas do livro onde estavam as letras das músicas.

No set, que durou cerca de uma hora, Daniel tentou atender aos pedidos do público e ainda cantou clássicos como “Casper the Friendly Ghost”, “Don’t Let the Sun Go Down on Your Grievances”, “Speeding Motorcycle”, “Life in Vain” e a linda “True Love Will Find You in the End”.

Entre uma canção e outra, Daniel brincava com sua própria doença perguntando a si mesmo “Am I still here?” “What country is this?”. O público ria e, por muitas vezes, alguém não se continha, quebrando o silêncio com um “I love you, Daniel”.

Daniel vai na contramão dos shows pirotécnicos dos nossos dias. Nada de danças, fogos, truques audiovisuais, surpresas no setlist ou diálogos engraçadinhos. Mesmo sem força nas mãos, e claramente incomodada a cada vez que desafina, Daniel fez chorar um público empático e apaixonado, que aplaude não apenas a música, mas a persistência do homem que sobe no palco sem qualquer máscara. Daniel resiste no palco.

No final, chamado de volta pelo público, ele conta com a compreensão de todos dizendo “bom, vocês sabem, tenho que terminar”- referindo-se às dificuldades causadas pela doença, e despede-se, à capela, da cidade com a desoladora Devil Town.

Sem final feliz, Daniel termina o show do mesmo modo que vive sua arte: não importa se a voz está fraca ou se a guitarra desafina, é preciso apenas que a música o salve dele mesmo, e que toque o coração dos outros, se possível.

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02/05/2013

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