Hoje é dia de apresentar um cara chamado Rust Costa. Mas talvez você já tenha visto o professor de inglês apaixonado por música da Escandinávia ao lado do Wander Wildner, com quem iniciou recentemente a sua vida de tecladista nos palcos.
A intimidade com os instrumentos faz parte da história do músico gaúcho desde de a infância, mas só agora resolveu mostrar o seu projeto autoral, com o nome de RVST. Foram muitas horas de composições caseiras para chegar em Fail Together, que reúne 5 faixas de melancolias encantadoras, perfeitas para quem gosta de Smiths, Belle and Sebastian e Magnetic Fields. Aperte o play e aproveite para ler a entrevista que fizemos com ele.
Você começou a tocar teclado com 3 anos. De onde você veio essa aptidão musical tão precoce e como se desenvolveu ao longo dos anos?
Eu não entendo nada de psicologia, mas dizem que certos episódios da infância ficam pra sempre. Salvo meu avô, que tocava acordion, violão e violino e que morreu logo que nasci, não tenho músicos sérios na família. De herança ficou um violão, que eu, ainda bebê, acabei quebrando. Minha mãe, em pleno luto, ficou devastada com o incidente e acho que ali criei um vínculo talvez até exagerado com os instrumentos. Virou obsessão. Acho que a dor e a lástima da minha mãe pela perda de um violão despertaram mto cedo em mim a noção de que a música é a coisa mais importante do mundo. Hoje em dia, pra onde quer que eu me mude, ando com o violino velho (esse eu não quebrei) a tira-colo (mesmo sem tocá-lo). Ainda aos 4 anos, tenho a memória de ter aprendido a tocar bateria com meu irmão, que tinha o instrumento e recebia sua banda em casa. Aos 5, ganhei um teclado, e acho que por finalmente ter sido MEU, adotei-o como meu instrumento principal. E nunca mais parei. Histórias da minha infância e minha relação precoce com a música é o que mais tenho. Eu era dessas crianças que passava horas numa loja de instrumentos (e ainda passo). Então nunca houve nenhuma imposição, sempre foi muito natural e altamente incentivado.
Você é professor de inglês, começou a aprender o idioma através das músicas?
Sim, comecei traduzindo com dicionário palavra por palavra dos meus encartes do KISS, aos 11 anos, na paleolítica era pré-internet. Quando tinha uns 14 tentei escrever em inglês. Era tosco demais, mas hoje, como teacher, reconheço nisso minha identificação e pré-disposição com o idioma.
Professores naturalmente já têm mais facilidade de comunicação. Como a vida de professor e de músico convergem pra você?
Sou professor de segunda à quinta, e músico de quinta a domingo, tempo que separo para shows, ensaios e produção. Dei a sorte de cair em uma escola que incentiva minha incursão na música e permite eu me organizar dentro de uma grade assim, super flexível.
Você usa a música como recurso em suas aulas? Caso sim, nos conte um pouco como funciona.
Uso. A Master English, que é onde trabalho, tem um público alvo bastante diferenciado e muito divertido: alunos com mais de 50 anos. Essas pessoas possuem uma memória musical riquíssima, viveram os anos 60 e 70 (Beatles, Dylan, etc) e assim, nos ocupamos de trabalhar os hits da época em aula. Seguido levo o violão para a sala, e transformo a classe numa mini-gig (outros profs o fazem, a política da escola é bem musical). Pedagogicamente, tem um efeito de engajamento muito efetivo!
Suas composições são atuais, ou você já vem compondo há bastante tempo? Faz tudo sozinho ou em colaboração com a banda?
As canções que estão no EP fazem parte de uma um set que começou a ser escrito em 2011. Meu foco nunca foi outro senão na composição (sem pensar em banda, divulgação ou na coisa como um trabalho). Era uma coisa muito gratificante ver o resultado final de uma demo cheia de camadas instrumentais. Com o número de canções crescendo, comecei a achar que essa minha inclinação musical poderia se tornar algo mais sério. Me acostumei a gravar tudo sozinho, todos os instrumentos e vocal, então as músicas do EP são inteiramente de minha autoria (motivo pelo qual optei por usar meu nome, ainda que graficamente alterado). Agora, com banda formada, ainda trago as demos das canções praticamente finalizadas, mas recebo e trabalho com idéias dos colegas. Eles n chegam a alterar o esqueleto dos arranjos, mas acrescentam muito na expansão das composições.
Você já tocava profissionalmente em outras bandas, certo?
“Profissionalmente” é uma palavra um pouco forte. Na verdade, em dezembro do ano passado, soube que o Wander Wildner precisava de um tecladista para fazer sub para o Arthur de Faria. Mandei um e-mail pra ele e rolou. Fiz uns 20 shows com ele esse ano, RS, SC e PR (nota-se que ele faz muitos shows solo, ou ainda com o Arthur). Podia ter ido pra SP quando ele tocou no SESC Pompéia em julho, mas perdi o vôo. História da minha vida. Sou um pouco desastrado com horários, mas depois dessa até dei uma melhorada (risos). Antes do Wander, cheguei a fazer uns cachês aleatórios como baterista, mas viajar e receber pra tocar não passava de um objetivo que eu não sabia exatamente como alcançar.
O que te fez pensar que era hora de fazer o EP Fail Together e mostrar o seu trabalho?
No que mostrei as canções para algumas pessoas, acabou surgindo um apoio coletivo, meus amigos começaram a se interessar e querer ver mais. Surgiu a chance de gravar no possível melhor estúdio de Poa (o Soma) e eu não pude perder. Independente do feedback que eu obtivesse, fui guiado pela mesma vontade que motivava a terminar as minhas demos no quarto: ver minhas músicas prontas (só que agora em boa qualidade). Só que a produção ficou muito além do esperado, e quando me dei conta as músicas soavam mais profissionais do que eu (risos). Quando eu vi o trabalho masterizado, obtive um feedback muito motivador e disse “ok, agora não tem mais volta, preciso levar isso pro palco o quanto antes”.
Quais as suas expectativas como banda, artista?
Sou um cara muito pé-no-chão. Minha maior expectativa no momento é apenas gravar e lançar um segundo EP (que já está escrito e ensaiado). Quero apenas me tornar um artista como alguns daqueles de que gosto (os menores, em termos numéricos), de incomum localização geográfica (para o “mercado”), e que as pessoas me encontram na internet, ouvem e dizem “massa esse som hein?”. Enfim, ser encarado com a mesma naturalidade com que venho trabalhando, e não como um gaúcho exótico que canta em inglês. A verdade é que não sou de criar expectativas, pois sei que ela é irmã mais velha da frustração. Estou com uma banda incrível, de peito aberto para o que der e vier, sem nada a perder e muita vontade de tocar.