Partiu da produção do Porão do Rock, um dos maiores festivais de rock do Brasil (rock mesmo, não MPB coxinha com hip hop dancindie e calabresa acebolada), o convite para que eu fosse até lá cobrir a edição deste ano, que vai ter Suicidal Tendencies, Soulfly, Mark Lanegan, The Mono Men, Lobão, Krisium e mais uma pá gente massa . Sim, cobrir o festival, na minha identidade secreta de jornalista, o Clark-Kent-Depois-da-Churrascaria.
O PDR (Porão Do Rock, pra quem não assiste o soletrando do Luciano Huck e não tem a manha de fazer de tudo que é composto uma sigla) faz parte da minha vida pessoal: foi lá, em 2000, que a Bidê ou Balde (BoB, pros irmãos sigleiros) realizou o seu show para maior público até hoje, 8 0mil pessoas que tomaram conta do estacionamento do antigo estádio Mané Garrincha e mal perceberam que eu estava completamente sem voz e sendo praticamente dublado pelo nosso ex-baterista Pedrão Hahn. Inesquecível, meio embaraçoso e do caralho ao mesmo tempo!
Para começar minha falastronice por escrito, escolhi algo meio que didático: falar da cidade que me acolherá e onde rola o festival há 15 anos, a Brasília que o país inteiro já sabe muito bem que pariu Legião Urbana, Plebe Rude e outras tantas. Mesmo país que, através do documentário que está por sair, “Geração Baré-Cola”, conhecerá a história que surgiram em seguida àquelas, dos Raimundos, Little Quail & The Mad Birds, Maskavo Roots e MUITO mais bandas, que antecederam à nova galera, que passa por Móveis Coloniais de Acaju e chega aos Sexy Fi, Rios Voadores, Galinha Preta e Na Lata, que também estarão presentes nessa edição do Porão.
Mas pra isso eu chamei um especialista, o Alf, ex-Rumbora e Supergalo, que tocou também com os contemporâneos Raimundos e Câmbio Negro, andou pela Europa sem ter virado travesti e voltou para lançar seu primeiro lance solo, que está vindo à tona aos poucos, com a pompa (ou balaca) de disco conceitual – e vai tocar tudo isso por lá. Fundador do Porão do Rock, protagonista da “Geração Baré-Cola”, brasiliense (que nasceu no Ceará, como uns outros tantos, acho eu) ativo na cena, sujeito boa praça e escolado no Guia do Malaco de Estrada, o entrevistei sobre algumas dúvidas sobre a cidade, o festival, as bandas de lá e coisas da vida:
Qual a região de Brasília onde posso encontrar os melhores travestis?
Véi, não curto essa parada, não, mas na W3 norte à noite tem umas “moças” solitárias que parecem ser muito dimensionadas para o gênero feminino. Procura lá.
Releases mentem. E o teu diz que o disco solo que estás gestando (e lançando por singles) será algo de conceitual, com a união das frases título formando um poema em si. É verdade? Que malandragem bonita! Conta pra gente isso aí.?
Ah, é uma mentira linda e verdade pura! O disco se passa no curso de um dia, com todas suas viagens, sonhos, superações e luxúrias. As músicas estão sendo lançadas como um quebra-cabeça. Começa com “O sol saiu”, emenda com “Guarde um Lugar” (música que lançarei na semana que vem) segue com “Pra onda boa me levar” cai “Na cadência do oceano” (inédita) e por aí vai, até finalizar com “No escuro” (inédita).
O teu release diz também que o teu som foi masterizado pelo Tim Young, que trampou com Nick Cave, Massive Attack e outros. O release não mentiria algo tão pontual assim, né?! Como rolou essa parceria? Foi quando tu estivesse na Europa por um tempo que fizesse o contato? O que fizesse por lá? Tocasse com alguém? É verdade que existem lindos travestis na Europa e que nem todos são brasileiros?!?
O Tim Young é uma lenda viva da masterização. O cara botou a mão em vários clássicos dos últimos 30 anos. De Metallica a The Smiths, de Madonna à Einstürzende Neubauten, uma lista infindável. Eu o achei pela internet. Depois de fazer tudo em casa num esquema totalmente “faça você mesmo” e mixar com o Frango Kaos do Galinha Preta, eu quis botar a cereja no bolo. Dei uma busca no Google e descobri que ele faz parte de um grupo fodasso de masterizadores em Londres e entrei em contato. Virou parceiro. Hoje mandei a terceira música. Na minha ida à Europa, fiz um pouco de tudo relacionado à música. Em Londres, toquei em pub, fui DJ, técnico de som e gravei com músicos brasileiros e ingleses. Em Praga, gravei e toquei ao vivo com o DJ Rockstar, um produtor de hip-hop que dentre outras coisas é VJ da MTV de lá. Putz, véi, travesti de novo? Tu é Bidê ou Balde?
Três gerações do rock de Brasília estarão no Porão do Rock desse ano: o Capital Inicial (que fará sua primeira apresentação no festival, por incrível que pareça) e o Paralamas (que são amancebados com a Geração Coca-Cola de Brasília, apesar do João Barone). Tu, Alf, representando a galera que veio dos anos 90, Geração Baré-Cola, e essa geração pós-baré-cola, Sexy Fi, Rios Voadores, Na Lata… O momento é muito massa: os filmes sobre Legião bombando nos cinemas de todo os Brasil, o Geração Baré-Cola trazendo luz a essa turma dos 90 que foi tão rica em lactobacilos vivos e as bandas novas conseguindo espaço nacionalmente (Na Lata entre os mais pedidos da MTV, Sexy Fi hypado nas gringa…). Tu acha que esse ano o Porão vai ser especial para o rock de Brasília, ou ele tem essa importância todo santo ano e eu sou um gordo burro que gastou tempo pensando e escrevendo uma pergunta tão longa??
Os dois (risos). É muito doido ver que já existe uma geração de bandas em Brasília que não imagina a cidade sem o PDR. Eu digo isso porque na minha primeira banda eu tinha meus 11, 12 anos e o Porão está indo pra sua 16ª edição, ou seja, 15 anos! Muitas bandas passam o ano sonhando com essa possibilidade e é demais poder dar essa oportunidade. Todos os anos descobrimos e revelamos novas bandas em seletivas. Elas dão o sangue por essa vaga. É emocionante. Esse ano vai ser muito massa, realmente, pelo link entre todas essas gerações. É uma característica dos novos tempos. Acabou aquela coisa de conflito de gerações e virou uma coisa mais tribal. Mais do que isso, a turma está forte. Os últimos anos tem sido muito especiais no DF como um todo. Muita banda legal pipocando pra tudo que é lado e de vários gêneros. Da psicodelia dos Rios Voadores ao HC do Galinha Preta, do rock sessentista do Cassino Supernova ao Metal moderno do Optical Faze e dos Deceivers, Do folk/indie dos The Neves com o Don nos vocais, um cara que canta que é um absurdo, à misturança dos Móveis Coloniais de Acaju, do proto-punk do Dualid à surf music do Super Stereo Surf, do indie viajante do Sexy-Fi ao rock eletrônico do Na Lata, do EgoRaptors, uma dupla de menino e menina com uma baterista de 17 anos muito boa, numa onda White Stripes, mas feita com muita propriedade e melodias ótimas, ao groove rock do Projeto Macaco e muitas, muitas outras. Minha resposta foi longa o suficiente?
Se eu quiser montar uma banda na minha estada por Brasília, qual o bar ou lugar-chave que eu devo ir para encontrar as pessoas mais legais pra formarem comigo uma banda (além do PDR, claro)? Como surgem as bandas de Brasília? Abiogênese??
A primeira parada deve ser a Noite PDR (risos). Fazemos todas às quartas uma noite de rock só com bandas autorais no O’Rilley Pub onde vai muita gente legal. Sem sacanagem, além da nossa, existem várias outras noites de rock que rolam toda semana. Festas como a Play! e a Toranja, bares como o América em Taguatinga, o Bar da Toinha em Samambaia, Velvet no Plano, festas na UNB (Universidade de Brasília), enfim, muitos lugares. As bandas aqui saem pela torneira.
Onde eu devo ir pra comer alguma tranqueira rápida quando acordar com ressaca e já correndo pra ir assistir outro dia de festival??
O pastel com caldo de cana na Viçosa da rodoviária de Brasília (perto do festival, aliás) é “só sucesso”.
Quais são as atrações que tu tá com mais expectativa do Porão do Rock desse ano? Obrigatório citar Mark Lanegan e Mono Men.
Mark Lanegan, com certeza. Quero ver o show dele há muitos anos. O cara é foda. Tenho a obra dele inteira. Vou virar criança nesse show. Mono Men vai ser demais, a mistura deles de garage sessentista e grunge Punk é diversão certa e o Dave Cryder já é de casa, tocou no PDR com sua outra banda, os DT’s. O Soulfly também. Nunca vi ao vivo e sou fã do trampo do Max. Quero ver muitos shows. O Test é animal, tem Suicidal, muita banda de Brasilia legal, o Uh La La de Curitiba, Lobão, cara, muita coisa boa.
E, claro, como vai ser o repertório do teu show?
Conto minha história. Passo a limpo músicas que vivi nos últimos 15 anos. Sons novos, Supergalo, Rumbora. Já fiz alguns shows e tem sido uma celebração só. Vai ser foda.
As outras Brasílias do Porão
Além do Alf, outros destaques locais vão rolar no Porão do Rock 2013. O Capital Inicial, que promete um Dinho Ouro Preto com camisa e cavanhaque, vai tocar pela primeira vez em 16 edições de Porão, e vai ser atração arrasa quarteirão; o Rios Voadores, que chegou ali ao vencer o Festival Chilli Beans com seu Brasil rock suingado à La Novos Baianos de uma bichogrilagem muderna; o Na Lata, que faz um rock pesado e eletroniquês e garantiu fãs o suficiente para manterem seu clipe “Lugar Diferente” por um mês no Top 10 da MTV Brasil; o Galinha Preta, do produtor Frango Kaos (o cara com o melhor nome de músico do ano, pra mim); o Sexy Fi, que recém lançou o disco “Nunca Te Vi De Boa” por gravadora gringa e financiou o belo clipe “Pequeno Dicionário Das Ruas” através de crowdfunding.
E ainda tem Paralamas do Sucesso tocando Greatest Hits (o que os permitiria serem do Rio de Janeiro, de Brasília ou do Acre, se quisessem) e muitas outras atrações de psicogeografia suficiente para discotecar uma festa étnica inteira. ?Fiquem atentos, tentarei falar de tudo que vai rolar esse ano no Porão do Rock – inclusive das bebedeiras das pessoas que estiverem comigo e seus problemas pessoais com a justiça, o sistema nacional de saúde e o transporte público na cidade das super quadras. Não percam.