O fluxo das marés do inconsciente coletivo trouxe às margens da cultura pop um revival da psicodelia que vem inundando o cenário musical nos últimos anos. 1943 (2015), o disco de estreia do Bike, chegou navegando por essa onda colorida e está indo longe.
O renomado produtor Danger Mouse (que está fazendo o novo disco do Red Hot Chili Peppers) ouviu o 1943 e convidou a banda paulista para lançar uma das suas faixas no primeiro lançamento do selo que ele criou no ano passado, o 30th Century Records. Assim, “Enigma do Dente Falso” saiu na coletânea 30th Century Records, Vol. 1 (2015) ao lado de bandas como The Arcs e Autolux. A partir daí, surgiu um contrato com o Bike que prevê o lançamento do 1943 no exterior, além de um vinil compacto com uma nova faixa deles e, talvez, também o segundo da banda.
Amanhã, o Bike toca pela primeira vez em Porto Alegre, ao lado da Supervão, e nós aproveitamos a ocasião para conversar com vocalista e principal compositor do grupo, Julito Cavalcante, sobre a popularidade atual da psicodelia, a parceria com o selo do Danger Mouse e os rumos do seu segundo disco da banda. Pra fechar, tem até uma playlist do Julito mostrando as influências do novo álbum.
Leia e viaje.
Parece que a cultura psicodélica não era tão popular desde os anos 60, 70. O que você acha disso?
Acho que esses revivals todos são meio normais, né? A cada ano que passa, alguma coisa é relembrada. Tipo, uns anos atrás tava rolando mais um lance dos anos 80. Mas eu acho que essa volta da psicodelia surgiu mesmo da música, talvez a partir do primeiro disco do Tame Impala, talvez um pouco antes até, e depois começou a ser aplicado em tudo. Em vídeos, em fotos, no visual da galera. Começou a voltar tudo que rolou na década de 60. Mas eu não sei exatamente porque houve essa aceitação tão grande.
Na verdade, esse público nunca deixou de existir, né?
É, nunca deixou. Desde a década de 60, sempre teve uma galera que curte ouvir Pink Floyd e tal, mas agora isso voltou a ser algo mais forte. Eu, por exemplo, sempre tive essa referência musical pelo meu pai, até hoje eu tenho toda coleção de discos dele e tem muita coisa do Pink Floyd, Grateful Dead, etc, então, pra mim, foi fácil assimilar essas bandas novas da psicodelia porque essa sonoridade sempre esteve presente desde a minha infância. Aí me senti à vontade fazendo música dessa maneira.
Dá pra dizer que psicodelia virou uma moda?
É, é que a influência vem muito de fora e lá tá rolando isso mesmo. Musicalmente falando, mas também no visual. Agora você muito mais artistas cabeludos, de um jeito que eu acho que não tinha desde a época em que o grunge era a moda. E roupas coloridas… Há um tempo atrás, era outro rolê.
Será que a psicodelia é o novo indie?
Eu acho. Sinceramente, eu acho. É o que tá rolando. Eu lembro de uma session em uma rádio em que o Alex Turner, do Arctic Monkeys, toca uma música do Tame Impala. Eu acho que ali, naquele exato momento, ele estava passando o bastão do Arctic Monkeys pro Tame Impala. Do que seria a nova grande banda indie. Sempre mudam essas representações. Ali, saímos um pouco desse indie mais roqueiro indo pra psicodelia mais viajada. E isso tem chegado cada vez mais longe, a Rihanna gravou o Tame Impala, atingiu o pop. A psicodelia tá pop. Atingiu muita gente.
E o Bike está imerso nesse contexto e acompanhando isso. Como vocês se sentem vendo tudo que está acontecendo com a banda?
Cara, pra gente tá sendo tudo bom! Vai fazer um ano do nosso primeiro show agora em maio. A gente acabou lançando o disco em um momento em que a psicodelia tá em cena e tá todo mundo prestando atenção. Como a gente tem referências mais antigas, esse lance todo com o LSD, acho que a nossa aceitação rolou muito porque a gente tá inserido mesmo na parada ao mesmo tempo em que isso tá rolando forte. Talvez se tivéssemos lançado esse mesmo disco alguns anos atrás não tivesse causado o mesmo impacto. Assim como se fôssemos lançar ele daqui a uns alguns… O que rolou é que a gente lançou o disco nesse momento e isso nos ajudou muito. Todo mundo prestou atenção. A galera tá procurando novos nomes que representem isso e nosso disco saiu na hora certa.
Tanto que o 1943 vai ser lançado agora pelo selo 30th Century Records, do Danger Mouse. Como é que ele chegou até vocês?
Nosso disco saiu em julho e em setembro eu recebi um email do selo falando que eles tinham ouvido o disco e gostado muito e que gostariam de usar a música “Enigma do Dente Falso” em uma coletânea do selo. Em nenhum momento falaram que era o selo do Danger Mouse. Aí eu vi no email o nome, botei no Google, e achei uma matéria falando que o Danger Mouse tinha acabado de criar esse selo. Foi isso! Só aí eu fui responder pro cara e começamos a parte legal da parada. Depois eles ligaram pra gente e falaram que tinham interesse no disco inteiro, fizeram várias perguntas, se a banda já tinha uma gravadora aqui, etc. Nós temos uma parceria com a Honey Bomb Records, mas o disco foi todo independente, não temos nada amarrado. O cara nos disse no telefone que o Danger Mouse achou nosso disco muito completo, que tinha uma ligação do começo ao fim e que isso chamou muito a atenção dele. Aí rolou esse contrato com os caras. Agora, a gente assinou o disco inteiro, mas não sabemos exatamente quando vai sair. E eles também têm a preferência pro próximo disco. Eles não são obrigados a lançar, mas, assim que tivermos gravado, temos que mandar pra eles pra saber se vão querer lançar. Tá rolando, saiu a coletânea, agora vamos gravar uma faixa nova que eles vão lançar um vinil de 7″ com nossa faixa da coletânea e, no lado B, essa nova. Por enquanto é isso, eles também têm a ideia de a gente viajar pra fazer uma turnê lá, mas tá tudo caminhando devagar, não sabemos nem quando vai ser lançado nem quando vamos pra lá. Mas só de saber que um produtor renomado gostou do disco e tá disposto a trabalhar ele lá fora, pra gente já foi grandioso.
Sim, imagino que vocês não esperavam nada disso.
A gente nem esperava! O selo é novo, o primeiro lançamento do selo foi essa coletânea. São dez bandas, oito dos Estados Unidos, uma da Escócia e a gente. É um selo dentro da Columbia, dentro da Sony, então é uma parada grande. Essa coletânea saiu em vinil e CD e foi distribuída em lojas do mundo inteiro.
Mas o 1943 vai sair antes ou depois desse vinil de 7″?
Pelo que a gente tá conversando, eu acho que eles vão lançar o 7″ antes do disco. Eles ainda tão vendo quando vai sair o disco completo.
Falando em novas gravações, vocês já estão fazendo o segundo disco?
Cara, estamos com muitas músicas. Porque no primeiro disco as composições são todas minhas, não era uma banda em si. Quando caímos na estrada é que virou uma banda. E agora tá todo mundo trazendo música, já temos umas 14 ou 15 e vamos separar umas dez pro disco. A ideia é gravar agora em junho. Em julho, vamos lançar uma session completa tocando o disco inteiro ao vivo, comentando as faixas, pra encerrar o 1943. Aí vamos aproveitar esse lado B do 7″ pra lançar como o primeiro single do novo disco aqui. Mas não sabemos quando vamos conseguir lançar o disco exatamente porque tem o lance do selo gringo ter a preferência. Então não sabemos se vai ser nesse ano ou no ano que vem.
E que caminhos diferentes vocês estão pensando em percorrer nesse disco novo?
No primeiro, as letras vem todas de experiências com cogumelos, LSD, alguma coisa doida. Sou do interior, então eu ia muito pra serra, pra praia, acampar e ter essas experiências. No segundo, serão letras que estão vindo agora. Comecei a escrever nesse ano e a ideia agora é de viagem, não só pro centro da mente, mas também um lance mais de viagem no tempo, e pelo cosmos… Algumas loucuras que eu venho escrevendo, como se fosse um personagem viajando no tempo e por planetas e vendo coisas. Tem bastante coisa escrita já, tô tentando organizar com as músicas agora. É tipo isso, continua sendo viagem, loucura, mas agora é uma coisa mais atmosférica.
Quer saber para onde vai o novo disco do Bike? Ouça abaixo a playslit criada pelo próprio Julito Cavalcante: