Entrevista | “A música tem que continuar”, diz Leci Brandão

02/08/2022

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Gabriela Amorim

Por: Gabriela Amorim

Fotos: Roger Cipó/Divulgação

02/08/2022

Voz de uma geração de sambistas, Leci Brandão, 77, continua sendo uma referência presente no campo musical. A carioca, que está em seu terceiro mandado como Deputada Estadual, em São Paulo, teve de aprender a unir sua agenda de shows com a vida na política: “Sempre tive muito cuidado em respeitar a minha vida, seja ela artística, seja ela política. Eu gosto de andar de forma correta para que as pessoas não critiquem”, diz Brandão em entrevista cedida por telefone para a NOIZE.

Com agenda de shows confirmada para o sábado (06), em Betim (MG), e no domingo (07), no Festival CoMA, em Brasília, ao lado do grupo Samba Urgente, a cantora e compositora, com 50 anos de bagagem musical, foi a primeira mulher a ser aceita na ala de compositores da Mangueira, em 1972, e três anos depois estreou com o disco Antes que eu volte a ser nada (1975).

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Leci Brandão (Foto: Roger Cipó/Divulgação)

Instigada por questões como igualdade racial, defesa da mulher e promoção da cultura popular, Brandão é dona de uma visão critica exorbitante. Sem saber tocar nenhum instrumento harmônico, garantindo-se apenas na percussão, a cantora, que já dividiu palco com Cartola, Dona Ivone Lara, Gisa Nogueira e Teresa Cristina, se descreve como uma compositora intuitiva: “Eu reafirmo que não toco nenhum instrumento de harmonia, principalmente. Quando tenho parceiros, que normalmente são músicos, eles sempre têm algum instrumento por perto, ficando muito mais fácil pra gente construir uma melodia. Porém, sinto que Deus é tão bom comigo que, quando a composição vem, ela já vem junto com letra e a música e está tudo lindo. Acho de verdade que é um transe que eu tenho, que eu sinto, para poder compor”.

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Relacionando-se com a religiosidade de matriz africana, a carioca dona de sucessos como “Zé do Caroço” e “Só Quero te Namorar“, comenta o por quê de sempre terminar seus discos, desde 1985, com uma faixa de saudação para os Orixás. “A minha mãe [Lecy de Assumpção Brandão], já falecida, foi quem me levou pra essa questão da Umbanda, sempre gostei de acompanhar, e é engraçado que eu gostava de ficar perto dos Ogãns, nos atabaques, sempre fui apaixonada por essa coisa da percussão. Mas depois, no bairro de São Gonçalo, minha mãe conheceu o caboclo Rei das Ervas, uma entidade que eu também tive a felicidade de conhecer. Nesta época, eu estava sem gravadora, num desalento danado, e quando o conheci, me surpreendi, porque ele disse que muita coisa ia mudar”. No mesmo ano, a cantora conheceu a Angola, no sul da África, e no ano seguinte assinou com a gravadora Copacabana e lançou seu LP Leci Brandão (1985): “A partir de então, eu passei a colocar na última faixa de cada LP uma saudação para os Orixás, depois levei o disco para São Gonçalo e mostrei para o Rei das Ervas esta homenagem. Foi ele mesmo quem me orientou para que, a partir de então, eu passasse a gravar uma saudação para os Orixás”.

Leci Brandão (Foto: Roger Cipó/Divulgação)

Confiando que a cultura promove mudanças, a mangueirense sempre vê a oportunidade nascer na música jovem e acredita que os novos nomes do samba tem que fazer a música continuar: “Eu sou madrinha de tanta gente e tantos grupos, acham inclusive que eu passo uma sorte. Recebo com muito carinho e fico feliz à beça. Eu já tenho anos de carreira e tem muita gente jovem que me tem como referência, muita gente jovem me convida para participações e me sinto feliz, porque tem que haver continuidade. Todo mundo tem seu momento de sucesso, todo mundo passa por esse processo, mas a vida continua, e como a arte é uma coisa muito aberta, a gente tem que torcer para que hajam novos alunos e que todo mundo possa fazer sucesso, a música tem que continuar.”

Se enxergando em ano eleitoral, onde o Brasil vê crescer o seu número de eleitorado em 6,21%, comparado a 2018, segundo a Agência Senado, Brandão profere palavras positivas e afirma que o despertar para um propósito só será eficiente se acontecer no coletivo – assim como uma roda de samba. “Sou uma pessoa que tem muita esperança de que vamos ter dias melhores no no Brasil, eu acredito muito nisso, estou praticamente fixada nesta ideia de transformação para melhor no nosso país. As pessoas acham que podem tudo, elas não têm essa curiosidade de dividir, participar e construir junto. Todo mundo acha que tem que fazer tudo sozinho e não é bem assim, nós vivemos em um momento que se não nos unirmos, nós não vamos chegar a lugar algum.”

Se ainda não ouviu, aproveite para conferir o podcast Mano a Mano, em que Mano Brown conversa com Leci:

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02/08/2022

Gabriela Amorim

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