Há mais de três décadas, Samuel Rosa é uma presença importante na música brasileira. À frente do Skank, o cantor, compositor e guitarrista mineiro imortalizou dezenas de sucessos, tornando-se aquele tipo de artista tão querido que chega ao ponto de parecer que todos nós já o conhecemos um pouco, de tanto que o vimos nos palcos e ouvimos a sua voz inconfundível. Porém, o fim do Skank, que encerrou suas atividades em 2023, mostrou que, na verdade, quem nós conhecíamos era o frontman daquela banda – e Samuel Rosa chegou a um momento de sua vida em que esta posição não lhe bastava mais.
Após uma sequência de shows finais, ele e a banda se despediram, celebrando com carinho um bonito legado. Fechando o ciclo, abriu-se espaço para o início de outro: uma carreira solo. Foi um ato de coragem, através do qual uma zona de conforto, conquistada com muito suor, foi abandonada em prol do desconhecido. Agora, Samuel está por conta própria, lançando o seu primeiro disco solo, Rosa, que acaba de chegar às plataformas de streaming.
Ao lado de Doca Rolim (violão e guitarra), Alexandre Mourão (contrabaixo), Pedro Kremer (teclados) e Marcelo Dai (bateria e percussão), Rosa deu vazão a uma nova safra de canções, compostas no quarto de sua filha recém nascida. A nova paternidade coroou esta fase de recomeços, e o resultado musical do processo dialoga com aspectos de sua trajetória prévia, mas não a repete – músicas como “Aquela Hora” ou “Tudo Agora” exemplificam bem esta diferença em relação ao som do seu antigo grupo. Ainda assim, estão no disco o reggae, o pop, o folk, a MPB, o rock n’ clássico, a bossa, o indie rock, pois naturalmente há nele aquilo de que Samuel gosta. Ou seja, não é uma ruptura com o que passou, pelo contrário. É a busca da síntese, do refinamento que nasce apenas da mais sincera autoralidade. Em Rosa, ouvimos Samuel Rosa como ele é.
“Não dá pra ser agora quem eu não consigo e quem eu não sou, né?”, diz o artista na conversa que segue abaixo praticamente na íntegra. Aqui, falamos sobre o Skank, os riscos de se acomodar, o trânsito entre o mainstream e o cenário alternativo, o som de Rosa, e algumas outras revelações mais.
Ouça Rosa abaixo:
Foram 32 anos de banda, como você avalia a trajetória do Skank e o que motivou o fim da banda?
Isso foi muito abordado no período em que a gente fez aquela turnê de despedida. Foram 100 shows num ano sobre esse fim de ciclo, com a anuência de todos, pra que eu agora começasse um projeto novo, tocando sozinho, com uma outra banda, compondo músicas novas, coisa que o Skank não vinha fazendo muito. O Skank estava muito em projetos até culminar na turnê de despedida. Eu que acabei propondo isso. Às vezes eu divido minha vida em quatro, e eu acho que já vivi três quartos, falta um. E eu falei: “Quero passar esse último quarto sozinho, sendo dono de mim mesmo”. Eu quero ter as rédeas do jogo na mão, responder por meus erros e acertos. Acho que isso é legítimo. É ter um compromisso comigo mesmo mais velho. Se conseguir chegar aos 80 – pelo menos, é meu plano -, eu vou estar de bem comigo se eu fizer o que eu estou fazendo agora, e não chegar aos 80 ainda fazendo parte do Skank, que é uma banda que eu comecei com 25 anos de idade. Eu não vejo sentido nisso.
O Skank foi uma exceção à regra, de ter durado três décadas com a mesma formação, em plena atividade, sem nenhum período de ostracismo. Méritos pra banda. Mas todo processo tem um ápice criativo. Tem uma hora que a banda tem um auge. Não tem problema manter, né? Você pode continuar sua carreira, claro, não há nada errado nisso. Mas esse ápice criativo se dá ali nos cinco primeiros anos de toda banda. Aí você fala: “As bandas desaprendem a compor”. Não, continuam compondo e tal, mas a liga… Não depende só da banda. Quando a gente fala de popularidade, tem que levar em consideração a banda e o público, que vai envelhecendo e passa a ser um público que gasta menos tempo com música.
As bandas veteranas levam a desvantagem neste quesito com as bandas mais jovens, porque as mais jovens têm um público um pouco mais militante. Ao passo que as bandas veteranas, se elas ultrapassam um certo limite, elas passam a ter uma espécie de fidelidade pra toda a vida, a qual as bandas emergentes ainda não têm, e cada vez menos. Eu não sei exatamente se essas bandas de hoje poderão ter esse privilégio que eu tenho de estar há 30 anos tocando aquelas músicas que eu fiz, algumas lá nos anos 90, que se juntam às outras que eu fiz mais recentemente.
Hoje a coisa está em um ritmo mais frenético, né? E que não necessariamente beneficia os artistas. Atende mais a apelos do mercado fonográfico, e não é uma coisa impessoal, são as pessoas que comandam o mercado. As pessoas que estão nas agregadoras, nas gravadoras majors, nas plataformas de streaming, elas têm que mostrar números. E elas têm um emprego com uma segurança tênue, o que faz com que elas tenham que rapidamente mostrar números. E não interessa o que elas tenham que fazer por isso, não interessa o tanto que o artista tenha que lançar single a toda semana, porque pode ser que no ano que vem elas já tenham perdido o emprego. Só isso pra justificar esse ritmo frenético de lançar single toda semana. Como assim?… A pessoa nem escutou a sua música direito na outra semana você já lança. Eu já estou achando estranho lançar o “Segue o Jogo” e daí a um mês lançar o disco cheio. Na época do Skank era um pouco diferente.
Mas enfim, eu só queria ser meu agora nessa reta final, onde eu já estou vendo o fim da estrada. Eu vou ser meu, cara. Eu vou responder por mim mesmo. Banda é um negócio lindo, bacana, mas ela tem, como tudo na vida, uma força criativa. O núcleo criativo tem um ápice, que depois se perde, porque é natural, e a banda vira uma espécie de instituição, que defende as suas canções, que muitas vezes nem são da banda. No nosso caso era, eram minhas composições, mas a gente estava ali defendendo. O Sting até brincou: “A música é a coisa mais importante, a banda é mero veículo”. Porque você pode cantar uma música minha, eu posso cantar, o cara da esquina pode cantar. Então, pensei nisso, falei: “Ah, eu posso continuar cantando minhas músicas”. Eu posso fazer novas músicas, e eu posso, num ambiente diferente, me sentir mais estimulado a compor de novo, a pensar em outras coisas, em um outro jeito.
O primeiro single do disco, “Segue o Jogo”, fala de uma separação, mas com leveza, com tranquilidade. É possível relacioná-lo com o seu processo de agora? A referência futebolística me fez lembrar do Skank.
É, muita gente viu o título e falou: “Opa, começou com música de futebol”. Então, eu falo de um rompimento, de um fim, e a leveza que você falou eu acho que tem mesmo. Eu me dei conta que eu estou falando sobre a ótica de alguém que já está um pouco cicatrizado, que não está no auge do rompimento. Quis falar de rompimentos que a gente vive toda hora, da sua relação com o seu trabalho, com o seu amigo, com os parceiros, num sentido mais coletivo. E tratar do fim como ele deve ser tratado, ou seja, algo que é cotidiano, é corriqueiro. As mortes são corriqueiras, são cotidianas.
Se tem uma coisa que dá para dizer depois de quase seis décadas de vida é que a vida vai abrindo portas para nós e vai nos obrigando a morrer pra umas coisas e nascer para outras. Não tem como escapar disso, a não ser que fique dentro de casa protegido. E você vai estar morrendo também se você não viver, né? Ficar parado também é morte. Ficar sobre um aparente amparo é muito perigoso. Porque o amparo acaba te proibindo de viver um monte de coisa.
Passei por rompimentos na minha vida, o Skank é um deles, mas não é o único. Eu não fiz [“Segue o Jogo”] para o Skank, mas fiz para: “o que a gente sente quando está acabando?”. Culpa. Medo. Uma ponta de entusiasmo. Porque morre, mas nasce. Eu até coloquei em uma outra letra: “Pra cada fim, um começo”, ou “deu pra vir até aqui”, que é um consolo pra quem se sente culpado. “Desculpa, mas só consegui vir até aqui, eu não consigo continuar”. É mais ou menos o que eu queria dizer ali de uma forma meio brincalhona, meio Marcos Valle. É meio uma bossa pop, né?
Disco que são batizados com o nome do artista me remetem a um caráter de apresentação, e você é esta figura tão conhecida do Brasil há três décadas. Você sente que esse disco é uma representação?
Então, apesar de ter sido um integrante atuante na minha banda, não era eu sozinho. Agora eu não estou sozinho completamente, mas estou mais sozinho do que eu estava. Então, é sim, um pouco. O Rosa é consequência de ser um disco um pouco autobiográfico, tem muita coisa minha ali misturada, histórias que eu estou passando… Ele perpassa por muita coisa minha íntima, e eu achei que talvez fosse conveniente que essa autorreferência extrapolasse também para o nome. Achei que era nada pretensioso porque o disco é meu mesmo, é o meu território. Eu gosto do Rosa porque tem minhas iniciais, é o nome com o qual eu fiquei conhecido, é a facção da minha família que é mais musical. Falei: “Ah, vou deixar Rosa mesmo”.
E aí eu conversei com o Stephan [Doitschinoff], um artista aqui de São Paulo que fez a capa, e ele disse: “É, tem o Álbum Branco [dos Beatles], tem o Álbum Preto, que é do Metallica, e vai ter o seu Rosa”. [Risos] Brincadeiras à parte, né? Acho legal também de falar: “Ah, o Rosa, aquele álbum Rosa“. Acho que vai ser legal. E agora eu tô pensando já no Rosa Sessions, que é fazer um projeto tocando ao vivo com essa banda que é maravilhosa.
E como foi o processo de gravação do disco?
Eu gravei de um jeito todo diferente do Skank: a gente ensaiou todas as músicas antes. Eu fiz 20, a gente escolheu dez, e ficamos ensaiando no estúdio pra entrar já todo mundo já sabendo. Não que no estúdio não tenha aparecido coisas novas, porque depois teve percussão em algumas músicas, teve metais no “Me Dê Você”, que eu fiz com Carlos Rennó, teve as cordas do Owen Pallett, que é um cara que trabalhou com o Arcade Fire, com The Last Shadow Puppets. Eu falava com o meu engenheiro, essa música aqui é meio Last Shadow Puppets tropical, e sem eu saber o Renato [Cipriano] foi lá e ligou pro Owen. Ele falou: “Ah, consegui falar com o cara, dá pra fazer as músicas que a gente quiser e tal”, e mandou lá pra ele. Foi assim.
E você falou sobre a capa, né? A capa tem vários elementos ali, uma coisa meio misteriosa.
Uma coisa meio brasileira, meio asteca ou inca, e meio mineira também. Eu conversei muito com o Stephan sobre o norte de Minas, que é um lugar que eu gosto muito, eu acho meio místico. De vez em quando eu vou pra lá comer uns cogumelos. [Risos]. Eu acho incrível, as pedras, a água, acho tudo muito bacana. E o Stephan trouxe uma coisa meio mineira de colocar a bola como se fosse uma moeda de ouro ou que poderia ser o sol. Foi incrível aquilo. Foi uma sintonia, uma sincronicidade enorme, porque eu não falei que eu tinha feito disco composto disco na manhã. É uma coisa bem iluminada, bem solar, feito no verão, virado pro nascente.
E ele tacou um sol ali, que pode também ser uma moeda de ouro. Ele acertou nesse aspecto, mas eu queria também que ele imprimisse se a identidade dele. Aquilo é muito dele, a assinatura dele. Ao passo que ele em algum momento faz a alusão a Minas Gerais com o negócio da árvore, eu falei da candeia aí ele pôs aquela árvore, e pôs sob signos, meio codificados, os títulos das músicas. Então tem “Palma na Mão”, tem “Rio Dentro do Mar”, tem umas coisas que você vai achando ali na capa.
Rosa foi um disco que você compôs no quarto da sua filha, né? Como esse processo da paternidade como inspirou esse momento de nascimento de uma outra parte de ti tanto profissional quanto pessoal?
É tem coisas que a gente só sente, né? Você não sabe dizer onde foi que eu me contaminei com esse arroubo de alegria, de esperança, de renovação, que é um filho na vida da gente. Dá novo sentido, é um recomeço. Eu já tenho dois mais velhos, então é um recomeço. Não sei te dizer certo ou de forma concreta e objetiva, mas eu senti isso. Eu me senti contaminado por esse momento de recomeço, e de certa forma tudo se conecta, né? Um recomeço de carreira, um recomeço de paternidade, um recomeço de vida. Eu agora estou morando em São Paulo, a vida inteira, eu morei em Belo Horizonte. As coisas têm se transformado. Aliás, as coisas sempre se transformam, a gente é que tenta segurar.
E sobre a sonoridade, Samuel. Como é que você queria que o disco soasse?
Eu não fui com uma coisa pré-concebida, né? Várias coisas eu sabia que eu não queria, quando começou a pintar um reggae que remeteu demais a Skank e Cidade Negra, meio anos 90, eu falei: “Opa, vamos parar, vamos pra outro canto”. Então esse cuidado em alguns momentos eu tive, em outros eu deixei fluir, foi um disco muito fluido. E assim, tem dois momentos em que você define o que uma música vai ser: quando você compõe e quando a banda passar a tocar essa música. Porque ela pode dar uma outra vertente pra música, diferente da que você fez. Às vezes é melhor. Às vezes é pior. E eu fui produtor do álbum, os meninos produziram comigo, mas eu sabia muito bem onde eu não queria ir. E queria chegar em várias coisas sem a pretensão de fazer um disco de rompimento, “ah, é uma Samuel diferente totalmente”, não, é meramente me exercer.
30 anos assim, eu já acho que eu já explorei uma infinidade de pontas, então o que eu tinha pra mim é meramente me exercer, compondo, escrevendo, arranjando. Eu quero exercitar isso. Eu quero intensificar isso, e eu tenho convicção que as diferenças apareceram e vão aparecer com o passar do tempo. Talvez eu vá me distanciando um pouco do que eu fui no Skank, seja pelas minhas próprias mudanças pessoais, pelos meus valores. Porque um disco é sempre muito ditado segundo uma cartilha de valor musical que você tem ali naquele momento. Ou pelas próprias influências da banda, que imprimiu ali sua assinatura. O Marcelo toca de um jeito totalmente diferente do Haroldo, assim como o Pedro Kremer, que era da Cachorro Grande, também é um tecladista diferente do Henrique. Cada um foi imprimindo sua assinatura.
E essas nuances, claro, eu não vou cobrar isso de um leigo, mas das pessoas do meio musical, de vocês da crítica e tal, eu espero que vocês… Tudo bem, parece o Samuel e tal, mas realmente dá pra ver que tem uma diferença na roupagem, na hora de envelopar cada música, e é isso. Eu quero que as diferenças apareçam assim, gradativamente, nas sutilezas, e não de uma [vez], não é isso que eu persegui. “Ah, tem que ser totalmente diferente de tudo que eu fiz, não vale repetir”, não. Eu acho que ao longo da minha história na música há suficiente diversidade no formato de compor. Claro, dentro do meu limite de possibilidades. Não dá pra ser agora quem eu não consigo e quem eu não sou, né?
Como é que esse desafio de conseguir é arejar o teu trabalho e manter também a coerência?
Eu queria compor, queria fazer música nova. Ouvir opiniões diferentes, né? Eu vou te falar uma coisa. Uma banda, enfim, é uma experiência incrível o que eu vivi com Skank. Eu acho que eu dei muita sorte de encontrar quem eu encontrei pra tocar, mas uma banda ela vicia, ela tem um modus operandis que é perpetuado e é danoso. Ele passa a ser um jeito da banda funcionar e um jeito da banda olhar o mundo, e numa hora você percebe de repente que você está filiado àquela maneira, àquela ótica, que é coletiva, entendeu? E isso é perigoso, porque você não acaba não abrindo.
Então eu não sei te dizer, cara. Eu não tenho essa resposta na ponta da língua, não se dizer de forma conclusiva, mas eu sei dizer que é uma tentativa minha. Se eu vou ter sucesso, eu não sei. Mas é uma tentativa de sair um pouco desse perigo iminente que é você ficar trabalhando do mesmo jeito com as mesmas pessoas muito tempo. Porque tudo é cíclico. Você não consegue, não tem como uma banda manter seu poder criativo, seu entusiasmo… o Skank até manteve, eu acho que 30 anos é um recorde. Tem os Stones aí, né? Mas… (risos)
Você é um cara que veio de um cenário de música alternativa, fora do Eixo Rio-São Paulo, numa época que era totalmente diferente, mas vocês alcançaram o mainstream muito cedo. Na Wikipédia, o Skank é descrito como uma banda de “rock alternativo”, mas era um alternativo massivo. Como você faz essa leitura?
Eu acho que a gente cumpriu essa cartilha, esse roteiro tradicional, de uma banda que começa com a ideia de garotos ali entre o colégio e a faculdade, com 20 e poucos anos, que estão a fim de escutar um som diferente, que ninguém escuta. A gente tinha um negócio do dancehall misturado com música brasileira, com guitarras… Os nossos ídolos eram os caras da 2 Tone [Records], aquelas bandas lá, Specials, Madness, The Selecter, e também tinha esse um pouco de Big Audio Dynamite, banda do Don Letts, que é um inglês jamaicano, com o Mick Jones, que era do The Clash, e eles faziam uma coisa meio new wave, mas com uma levada meio reggae, só que com muito sampler e guitarra distorcida por causa do Mick Jones. Eram as nossas bandas. E no lado pop, tinha o Police, UB40, e aquele jamaicão raiz de quem não queria mais tocar roots reggae, não era mais Rastafari, com os cabelos cortados baixinho, e era muita coisa eletrônica,…. Então a gente foi procurando os guetos, quem gostava disso no Brasil era uma meia dúzia.
É aquela história do cara que vai vender sapato num lugar remoto do mundo, né? O chefe da empresa manda um cara lá pra fazer aquele estudo antropológico do lugar pra ver quais seriam as condições para colocar a fábrica de sapato naquele lugar remoto, pobre , e ele liga pro chefe e fala: “Olha, eu tenho uma notícia boa e notícia ruim, qual você quer primeiro?”. “Pode mandar a ruim primeiro”. “Ninguém aqui usa sapato”. “Pô, e a boa?”. “Ninguém aqui usa sapato”. (Risos) Quando a gente começou, a gente falou: “Ninguém está fazendo dancehall no Brasil”. Tinha uma banda, que era o Vaca de Pelúcia. Então assim, “ninguém usa sapato”, pro bem e pro mal, né? Longe de mim achar que a gente estava fazendo uma coisa totalmente alternativa, não era. Na frente da gente vieram outras bandas, os Titãs, que já tinha umas coisas meio sampleadas, os Paralamas, que também nos balizaram. Mas ali como está aquele primeiro disco do Skank, ainda não existia no Brasil.
E foi e tal. Provavelmente, aí o cara [da Wikipédia] falou “rock alternativo” porque era alternativo nesse sentido, a gente era uma banda independente e que atuava como tal. A gente era gravadora, divulgador, tudo sozinho, fizemos um CD numa época em que ninguém tinha CD. Só que naquela época não tinha meio termo. Tipo, a banda do meu filho Juliano, os caras já estão no terceiro álbum, tem uma facilidade incrível pra gravar, eles não ficam tocando só em Belo Horizonte, eles vêm pra São Paulo, tocaram num festival em Fortaleza, já estiveram no interior, sei lá onde e tal. Na minha época, não era assim. Ou você aparecia no Faustão, tocava na rádio e saía de Belo Horizonte ou você estava fadado a ficar tocando num circuitinho ali em BH e interior de Minas.
E hoje, você se sente conectado ainda com um cenário fora do mainstream? Pergunto porque você gravou, por exemplo, com o Terno Rei, mas também gravou com o Vitor Kley.
Então, essas coisas eu não vou muito por prateleira, não. São coisas que me tocam. O Vitor Kley, quando eu vi aquela música do Sol ser primeiro lugar geral no Brasil, num momento em que a música pop no Brasil anda tão mal das pernas… Não é tudo, não quero generalizar, mas era assim, no meio de funk e sertanejo aparece um Vitor Kley com uma canção com uma lógica harmônica de Oasis, praticamente. Eu falei: “Pô, que do caralho, que legal esse menino”. Comecei a achar bacana aquilo que ele tinha feito, ele era um heroi. Porque o feito dele era heroico. Good vibes ali, né, meio surf music, meio folk e tal. Eu achei um barato, e ele me convidou pra gravar, e eu gravei e a música também tocou, “A Tal Canção pra Lua”.
O Terno Rei partiu de um convite mesmo deles lá do Balaclava, que é o Fernando Dotta, que é um cara que eu adoro. Acho que eu sempre transitei aí, mas o meu critério vai de acordo com o gosto musical mesmo. É aquilo que eu acho interessante. Pra eu estar nesses projetos eu também não estive em vários outros que fui convidado e que eu achava que não tem a ver comigo, que não é pra mim agora.