As fronteiras que Cuatro Pesos de Propina e Francisco, El Hombre rompem vão muito além do giro conjunto das duas bandas que passa por nove cidades brasileiras, três uruguaias e quatro argentinas. Em plena noite de domingo, Porto Alegre encheu mais uma vez uma das suas casas de shows mais tradicionais com muito calor, bumbo e uma garra que só existe em quem vem do lado sul do mundo.
Tudo começou com a mistura ritualística entre ska, reggae, rock, cumbia e jazz da Cuatro Pesos, que entrou em transe junto com a plateia numa bagunça hipnótica que fazia total sentido. No show da clássica banda uruguaia, o público é tão importante quanto os sopros, a bateria ou as guitarras. O vocalista e guitarrista Gaston Puéntes pula, sua, grita e entoa com orgulho as canções do grupo acompanhado de Rodrigo Calzada no baixo, Andres Tato Bolognini na bateria, Gastón Pepe na voz e na percussão, Rodrigo Baleato no sax e no clarinete, Miguel Leal no trompete, Joaquín Baranzano no teclado e Joaquín Carriquiry na guitarra. Com oito pessoas no palco, não sobra um centímetro que não seja ocupado pela energia incontrolável do grupo.
Na noite de ontem, os uruguaios aproveitaram alguns momentos do show para dividir o palco com os hermanos da Francisco, El Hombre: Sebastián e Mateo Piracés-Ugarte e de Juliana Strassacapa aumentaram ainda mais o grito que dói em coro em “Mi Revolución” – que virou “Minha Revolução” no recém lançado EP conjunto Rompe Frontera. Ao vivo, a faixa ganha em intensidade e reforça ainda mais seu poder de curar as feridas do tempo mencionadas na letra. Na confluência de duas bandas que reforçam a importância da cultura latina, a revolução é feita com peito estufado, grito solto e reunindo o maior número de pessoas.
E foi exatamente isso que aconteceu quando a meio brasileira, meio mexicana Francisco, El Hombre subiu ao palco para apresentar as faixas do disco Soltasbruxa(2016). Com um caos muito bem colocado, o quinteto leva qualquer um que presencie suas apresentações ao delírio, transformando as quase mil pessoas que foram até o Opinião em uma coisa só. Quando os pés já não aguentavam mais pular, a catarse de “Triste, Louca Ou Má” trouxe um momento emocionante de reflexão e protagonismo feminino. Juliana Strassacapa aproveitou o respiro que a música (mais calma do que a grande maioria do repertório) traz para enaltecer a união feminina e projetos como o We Are Not With The Band, que cataloga as mulheres da música com entrevistas e fotos: “Essa aqui é para todas as mulheres que são a banda, e não estão com a banda”, disse.
O show deveria terminar com “Calor da Rua”, faixa já clássica que ganhou uma versão repaginada pela Cuatro Pesos de Propina com uma verdadeira injeção sopros e guitarras. Mas o público quis mais, e “Tá Com Dólar, Tá Com Deus” (feita em parceria com a Apanhador Só) chegou transformando tudo aquilo num verdadeiro carnaval. Como já é tradição nos shows da Francisco, El Hombre, o público tomou conta do palco, derrubando pedestais e tornando quase impossível distinguir quem era quem. Ali, essa era apenas mais uma fronteira a ser cruzada.
A noite era uma iniciativa do Morrostock, que já anunciou Mutantes como atração principal da próxima edição do festival, que ocorre em dezembro em Santa Maria (RS). O Morrostock criou um grupo no Facebook reunindo as pessoas que compraram o primeiro lote dos ingressos para uma curadoria coletiva – e a Francisco, El Hombre já é uma opção bem provável para o lineup. A turnê Rompe Frontera ainda passa por Caxias do Sul no dia 3 de agosto e por Goiânia no dia 4, partindo para o Uruguai no dia 10. Lá, as duas bandas tocam em Montevideo, Florida e Maldonado antes de seguir viagem para a Argentina para shows nas cidades de Buenos Aires, Cordoba, Rosário e Panamá.