Com mais de 50 anos de carreira, a banda pernambucana Ave Sangria lança hoje (7.8) o primeiro clipe da história do grupo. “Vendavais“é a faixa título do segundo disco dos ícones da psicodelia nordestina, lançado em 2019.
O responsável pelo registro em vídeo da canção é o diretor Pablo Polo, filho do vocalista Marco Polo, um dos fundadores da banda. O músico começou a compor músicas com o guitarrista Almir de Oliveira em 1968 – o início do Ave Sangria. “Mesmo quando a banda não estava tão atuante na década de 80, o pessoal frequentava muito a nossa casa”, lembra Pablo sobre os amigos do pai.
Na hora de pensar o roteiro para o clipe, o diretor levou em consideração a relação da banda com os fãs, muitos deles nem eram nascidos quando o grupo foi taxado de subversivo pela ditadura. O revival do grupo na última década só seria possível com o apoio de muita mobilização online, que culminou em uma série de apresentações em 2014 e um disco novo no ano passado.
O primeiro trabalho, Ave Sangria (1974), ficou pouco mais de um mês nas lojas até os militares tirarem de circulação. O motivo da proibição: a canção “Seu Waldir”, onde o vocalista canta sobre amar outro homem. Além das dificuldades da época, os músicos que acompanhavam a dupla – Paulo Rafael, Ivinho, Israel Semente Proibida e Agrício Noya – foram escalados para formar a banda de Alceu Valença.
Novo momento
Para a gravação do disco Vendavais, os fundadores Marco Polo, Almir e Paulo Rafael escalaram os músicos Juliano Holanda , Gilu Amaral e Júnior do Jarro para registrar onze músicas escritas entre os anos de 1969 a 1972. Apenas a faixa “Em Órbita”, de Paulo Rafael, surgiu na época do retorno.
“Desde que gravamos o disco pensamos em fazer o clipe. Primeiro, pensamos em ‘Dia a Dia’, mas depois concluímos que ‘Vendavais’ era mais abrangente e resumia o conceito do álbum”, explica Marco Polo sobre a novidade. Para 2020, a intenção dos músicos era tocar as novas canções em palcos espalhados pelo país, plano que precisou ser adiado para depois da epidemia. Há ainda a vontade de gravar um novo clipe para uma música do primeiro álbum e também já estão rascunhando ideias para um próximo trabalho.
3 perguntas com o diretor Pablo Polo sobre o primeiro clipe da história da Ave Sangria:
Qual é a maior mensagem da música?
Para mim, é a reação. Os vendavais de cada um(a) como uma energia de mudança contra possíveis opressões. Como diz no trecho: “Saia da paisagem / Dê um nó nessa viagem/ Abra os olhos pra ver, pra ver, pra ver, pra ver/ A vida não precisa ser tão desiludida/ Mas também iludida não precisa ser”.
Como aconteceu a seleção dos seis performers?
No processo de criação do clipe, quis trazer pessoas que não fossem músicos para, de certa forma, representarem os fãs da banda. Durante todos esses anos, foi essa a relação dos apreciadores da Ave Sangria, as pessoas que mantiveram viva a lembrança da banda, seja nos vinis, nos violões e em CDs piratas.
Para passar uma mensagem poética no clipe, busquei performers que já conheço de um tempo. Comecei conversando com Anne Costa, que me sugeriu alguns nomes. Nesse processo, falei sobre a mensagem, sobre enfrentar um momento de opressão. Toda a parte expressiva, corpo, dança e movimentos, foram vivenciadas por cada um deles. Total liberdade. Enquanto dançavam, eu interagia com a câmera, ou seja, dançamos juntos.
Quais elementos da canção foram levados em conta na hora de pensar a ideia do vídeo?
Trabalho como diretor e roteirista de audiovisual há tempo. Apesar de só ter feito um videoclipe antes desse, já fiz curtas metragens, documentários e programas para televisão. Quando surgiu o convite, fiquei quebrando a cabeça para criar um clipe que também fosse narrativo. Então me debrucei sobre a música e pensei sobre o que ela evocava em mim.
Essa mensagem de ação ante a opressão foi um dos principais. Depois me veio a relação entre a banda e quem curte, pensei então ter outras pessoas representando os fãs. Assim, o momento no início é estático, mas com a chegada das outras pessoas, com essa comunhão, a banda também ganha movimento.
E como representar isso? Os vendavais me levaram a ideia de movimento, então pensei em performers que fossem da dança. A ação-movimento versus opressão precisava de algo para oprimir. Como no caso dos performers, conversamos sobre objetos e discutimos como interagir – se libertar de cordas, fios, tecidos, plásticos…
Chegando ao amadurecimento do processo, a gente tinha apenas um dia pra filmar. Por uma proximidade com o grupo de Teatro Magiluth, conheci o Casarão, lugar onde eles se estabeleceram no início do ano. Vi a caixa cênica com todas aquelas texturas diferentes e veio a ideia do final.